GERAÇÃO SUSPENSA?
1. São diversificadas as atribuições aplicadas às novas gerações. Desde os anos 60 (Maio de 68), com o emergir da «juventude» como grupo social, uma multiplicidade de nomenclaturas, umas mais felizes que outras, procuram na actualidade de cada tempo compreender as mentalidades mais jovens. Habitualmente essas atribuições trazem consigo um sabor a injustiça, mas também um pouco de verdade. Injustiça porque a geração que se dá ao luxo de qualificar os vindouros é a geração que lhe está todos os dias a dar (ou não dar) a formação cultural, os desejados valores referenciais e educativos para uma vida repleta de dignidade e autêntica liberdade responsável. Um pouco de verdade, pois, muito acima da “vitimização” sempre mais cómoda (de que as causas de todos os males vêm de trás…), haverá que olhar “olhos nos olhos” das juventudes contemporâneas e gerar climas de absoluta co-responsabilidade sócio-educativa, cívica, dignificante e mesmo ecológica, no esforço de todos, comunidade, caminharmos no aperfeiçoamento daquilo que está aquém do ideal (hoje) ético global.
2. Quem não se lembra do debate levantado há anos quando, diante de manifestações estudantis ao rubro, Vicente Jorge Silva, do então jornal Público, lançou o polémico epíteto «Geração rasca»? Do mesmo modo não podemos ser indiferentes à recente qualificação «Geração em saldo» da revista Visão, referindo-se nomeadamente às dezenas milhares de jovens licenciados que vivem precariamente, no desemprego, ou, quando muito, a recibos verdes. A par de todas estas realidades dolorosas, assistimos a um certo “beco sem saída”, ou melhor, em que a saída é mesmo “sair”, até de Portugal, num novo êxodo de emigração para os mais próximos países europeus ou para países de língua portuguesa. Falta-nos mais sermos cá dentro a energia que temos lá fora! Ainda, hoje, é uma multidão incontável de casais novos (e muita da geração dos 30 anos) que vive “às custas” de seus pais ou fazem dos avós os verdadeiros pais (quando há trabalho) num desenraizamento crescente da essencial ligação paterna.
3. Tempos de profunda transformação, onde, a par do domínio excelente e inédito das tecnologias e de múltiplos conhecimentos, as novas gerações vão reaprendendo todos os dias a conviver com o drama e a ansiedade da incerteza quanto a quase-tudo: incerteza no trabalho, nos juros bancários, no aumento dos preços (de bens tão básicos como pão, leite, combustíveis, água), na própria vida afectiva e conjugal onde, infelizmente, os chamados “valores da família” foram quase retirados para a periferia. Vermos muita da gente das novas gerações a viver a incerteza e o desencanto desta fronteira faz com que o próprio futuro apareça como que “suspenso”… Talvez no meio de todas as incertezas e instabilidades o tempo actual precise mesmo do regresso à comunidade primordial dos afectos, a família. Esta pode ser garantia de serenidade, conforto e paz, mesmo nas turbulências da vida. Mas haverá vontade de enfrentar, problematizar e reflectir estas questões? Qual o lugar dos referenciais modelo, para termos onde “pousar”? Ou estamos mesmo a transferir tudo para uma subjectividade do “cada um é que sabe”, conduzindo a história, o pensamento e a acção, como se fôssemos «gerações indiferentes»? Será esta a qualificação do nosso presente daqui a meio século? A inquietude é sempre dos passos decisivos ao brotar da nova consciência de pertença.
Alexandre Cruz
1. São diversificadas as atribuições aplicadas às novas gerações. Desde os anos 60 (Maio de 68), com o emergir da «juventude» como grupo social, uma multiplicidade de nomenclaturas, umas mais felizes que outras, procuram na actualidade de cada tempo compreender as mentalidades mais jovens. Habitualmente essas atribuições trazem consigo um sabor a injustiça, mas também um pouco de verdade. Injustiça porque a geração que se dá ao luxo de qualificar os vindouros é a geração que lhe está todos os dias a dar (ou não dar) a formação cultural, os desejados valores referenciais e educativos para uma vida repleta de dignidade e autêntica liberdade responsável. Um pouco de verdade, pois, muito acima da “vitimização” sempre mais cómoda (de que as causas de todos os males vêm de trás…), haverá que olhar “olhos nos olhos” das juventudes contemporâneas e gerar climas de absoluta co-responsabilidade sócio-educativa, cívica, dignificante e mesmo ecológica, no esforço de todos, comunidade, caminharmos no aperfeiçoamento daquilo que está aquém do ideal (hoje) ético global.
2. Quem não se lembra do debate levantado há anos quando, diante de manifestações estudantis ao rubro, Vicente Jorge Silva, do então jornal Público, lançou o polémico epíteto «Geração rasca»? Do mesmo modo não podemos ser indiferentes à recente qualificação «Geração em saldo» da revista Visão, referindo-se nomeadamente às dezenas milhares de jovens licenciados que vivem precariamente, no desemprego, ou, quando muito, a recibos verdes. A par de todas estas realidades dolorosas, assistimos a um certo “beco sem saída”, ou melhor, em que a saída é mesmo “sair”, até de Portugal, num novo êxodo de emigração para os mais próximos países europeus ou para países de língua portuguesa. Falta-nos mais sermos cá dentro a energia que temos lá fora! Ainda, hoje, é uma multidão incontável de casais novos (e muita da geração dos 30 anos) que vive “às custas” de seus pais ou fazem dos avós os verdadeiros pais (quando há trabalho) num desenraizamento crescente da essencial ligação paterna.
3. Tempos de profunda transformação, onde, a par do domínio excelente e inédito das tecnologias e de múltiplos conhecimentos, as novas gerações vão reaprendendo todos os dias a conviver com o drama e a ansiedade da incerteza quanto a quase-tudo: incerteza no trabalho, nos juros bancários, no aumento dos preços (de bens tão básicos como pão, leite, combustíveis, água), na própria vida afectiva e conjugal onde, infelizmente, os chamados “valores da família” foram quase retirados para a periferia. Vermos muita da gente das novas gerações a viver a incerteza e o desencanto desta fronteira faz com que o próprio futuro apareça como que “suspenso”… Talvez no meio de todas as incertezas e instabilidades o tempo actual precise mesmo do regresso à comunidade primordial dos afectos, a família. Esta pode ser garantia de serenidade, conforto e paz, mesmo nas turbulências da vida. Mas haverá vontade de enfrentar, problematizar e reflectir estas questões? Qual o lugar dos referenciais modelo, para termos onde “pousar”? Ou estamos mesmo a transferir tudo para uma subjectividade do “cada um é que sabe”, conduzindo a história, o pensamento e a acção, como se fôssemos «gerações indiferentes»? Será esta a qualificação do nosso presente daqui a meio século? A inquietude é sempre dos passos decisivos ao brotar da nova consciência de pertença.
Alexandre Cruz