de Anselmo Borges
Karl Rahner, talvez o maior teólogo católico do século XX — tenho a honra de ter sido seu aluno —, deixou escapar um dia, numa aula, uma daquelas observações que nunca mais se esquecem: na Igreja católica é obrigatório confessar os pecados graves e mortais, mas não estava a ver que algum bispo ou padre ou superior religioso, ministro ou professor católico se tenha confessado do pecado grave e, frequentemente, mortal, da ignorância culpada, da incompetência fatal, da inteligência irresponsavelmente menorizada.
Em geral, nas igrejas, faz-se muito pouco apelo à razão, à reflexão crítica, à pergunta. Como se a fé não tivesse de conviver com a inteligência, com a dúvida e com a pergunta. Os cristãos — mas isso acontece em todas as religiões — parece que ficam tolhidos na sua capacidade de perguntar. No entanto, Jesus morreu a rezar esta pergunta infinita que atravessa os séculos: “Meu Deus, meu Deus, porque me abandonaste?” e, perto de nós, Martin Heidegger, um dos filósofos mais influentes do século XX, escreveu que “a pergunta é a piedade do pensamento”.