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quarta-feira, 3 de abril de 2019

Um poema de Vitorino Nemésio para variar...



SEMÂNTICA ELECTRÓNICA 

Ordeno ao ordenador que me ordene o ordenado 
Ordeno ao ordenhador que me ordenhe o ordenhado 
Ordinalmente 
Ordenadamente 
Ordeiramente. 
Mas o desordeiro 
Quebrou o ordenador 
E eu já não dou ordens 
Coordenadas 
Seja a quem for. 
Então resolvo tomar ordens 
Menores, maiores. 
E sou ordenado, 
Enfim — o ordenado 
Que tentei ordenhar ao ordenador quebrado. 
— Mas — diz-me a ordenança — 
Você não pode ordenhar uma máquina: 
Uma máquina é que pode ordenhar uma vaca. 
De mais a mais, você agora é padre, 
E fica mal a um padre ordenhar, mesmo uma ovelha. 
Velhaca, mesmo uma ovelha velha, 
Quanto mais uma vaca! 
Pois uma máquina é vicária (você é vigário?): 
Vaca (em vacância) à vaca. 
São ordens... 
Eu então, ordinalmente ordeiro, ordenado, ordenhado, 
Às ordens da ordenança em ordem unida e dispersa 
(Para acabar a conversa 
Como aprendi na Infantaria), 
Ordenhado chorei meu triste fado. 
Mas tristeza ordenhada é nata de alegria: 
E chorei leite condensado, 
Leite em pó, leite céptico asséptico, 
Oh, milagre ordinal de um mundo cibernético! 

Vitorino Nemésio, Limite de Idade (1972)