![]() |
Bento Domingues |
«Alguns julgam-se heróis da mudança pelo regresso ao que julgam ser a Santa Missa de Sempre, que nunca existiu como missa de sempre. Andam para trás para se realizarem como estátuas de sal, fruto de uma incurável miopia»
1. O mal resulta da ausência de um bem que deveria existir, seja na natureza, seja no agir humano. A serenidade desta lucidez metafísica tem um inconveniente: ou é linguagem de robot para robots ou um insulto a quem sofre. As ciências estudam as causas desses disfuncionamentos, os processos de os evitar e os remédios da sua cura. Dizem-me que a imortalidade está no horizonte lógico da ciência. A promessa da longevidade e da juventude ilimitadas vai de encontro ao nosso desejo de viver bem, com saúde e sem envelhecimento. Esta conjectura agradável não pode evitar interrogações de carácter social, político, económico, cultural e ético. Os pós-humanistas julgam que essa hora chegará mais depressa do que se imagina. Até lá, mais vale encarar o facto de uma existência limitada que privilegia os laços da amizade e da solidariedade efectiva. A história do sofrimento dos inocentes deita para o caixote do lixo qualquer especulação sobre o mal.
Repete-se, desde Epicuro (séc. III a. C), dos modos mais diversos, que Deus e o mal não podem coabitar. O mal é um escândalo e um problema para qualquer ser humano, mas especialmente para quem é religioso. Um mundo com mal e sem Deus talvez fosse menos problemático, pois ou Deus quer eliminar o mal e não pode, ou pode e não quer. Se quer e não pode, é impotente; se pode e não quer é mau.
Nunca me impressionou muito essa conversa centrada num Deus encurralado pela lógica totalitária, sem espaço para a responsabilidade humana.