Há uma história que Aristóteles narra sobre uma palavra do filósofo Heráclito a uns forasteiros que queriam chegar até ele. Aproximando-se, viram como se aquecia junto a um fogão. Detiveram-se surpreendidos, enquanto ele lhes dava ânimo: "Também aqui estão presentes os deuses".
Os visitantes ficaram frustrados e desconcertados na curiosidade que os levou a irem ao encontro do pensador. Julgavam ter de encontrá-lo em circunstâncias que, ao contrário do viver dos homens comuns, deveriam mostrar em tudo os traços do excepcional e do raro e, por isso, excitante.
Em vez disso - e estou a transcrever o comentário do filósofo Martin Heidegger à história relatada por Aristóteles -, os curiosos encontraram Heráclito junto ao fogão. É um lugar banal e bastante comum. Ver um pensador com frio que se aquece tem muito pouco de interessante. A situação é mesmo frustrante para os curiosos. Que farão ali? Heráclito lê essa curiosidade frustrada nos seus rostos. Ele sabe que a falta de algo de sensacional e inesperado é suficiente para fazer com que os recém-chegados se vão embora. Por isso, infunde-lhes ânimo. Pede-lhes que entrem: "Também aqui estão presentes os deuses". Também ali, naquele lugar corriqueiro, é o espaço para a presentificação de Deus.