António Fernandes
Estive ontem em Chaves, terra que há muito me habituei a considerar como das minhas preferidas. Por lá passei férias tentando identificar-me com a cidade e arredores. Visitei aldeias mais ou menos badaladas e outras desconhecidas, li algumas obras etnográficas, visitei castelos, fortes e castros, provei águas termais (Chaves, Vidago, Pedras Salgadas e Carvalhelhos) e fui, com a família, vezes sem conta, a salto, por carreiros pouco visíveis, a Espanha, numa altura de contrabando semiautorizado. Saboreei o vinho dos mortos, em Boticas, assisti à chega de bois, em Montalegre, e associei-me a festas. Tudo isto porque conheci na Gafanha da Nazaré uma família amiga que me entusiasmou por aquelas paragens, quando me falava de Chaves, dos pastéis típicos, da bola de carne e outros acepipes, mas também das termas, que os romanos utilizaram com proveito e que eu experimentei, das paisagens tão diferentes do meu Litoral. Aliás, Chaves terá nascido com o beneplácito do Imperador Romano Flávio.
Nazaré Chaves e António Fernandes acolheram a minha família como se fosse sua família. Daí a amizade que perdurou através de décadas, até hoje. Chegámos a trocar de casa durante as férias de agosto. Íamos para Chaves para usufruir dos ares do interior, e eles vinham para a Gafanha da Nazaré, decerto com saudades do nosso mar.
Ontem, porém, não fomos para fazer turismo, mas por razões de coração e gratidão. As amizades a isso nos aconselham. António Fernandes faleceu, depois de doença grave. Sei que tudo foi feito para que não sofresse. Mas teve de nos deixar. Para os crentes, como eu, ele está agora no coração de Deus, com seu filho José Carlos que o antecedeu nesta viagem há poucos meses, na flor da vida, aos 45 anos.
António Fernandes era um militar da Força Aérea e nessa qualidade teve de participar na guerra que Portugal travou com as ex-colónias, certamente com dor, por ter de deixar aqui, na Gafanha da Nazaré, esposa e três filhos. Quando me escrevia, revelava sempre as saudades que tinha dos seus entes queridos e a vontade de regressar em breve para junto deles.
Com ele e sua família partilhámos férias e sonhos, alegrias e cumplicidades, anseios de um mundo melhor e vontade de que os nossos filhos soubessem construir futuros risonhos apoiados no trabalho, no estudo e na honestidade.
O meu amigo António Fernandes fechou o ciclo da vida terrena para iniciar outro numa nova dimensão; mas a sua presença permanecerá connosco, através de sua esposa Nazaré, filhos e netos, memórias vivas do legado que dele receberam.
Que Deus o tenha no seu regaço de amor e misericórdia e que conforte a família e os amigos neste momento de dor.
Fernando Martins