Em prol de uma ecologia
da pessoa humana
António Marcelino
“Os homens não têm a felicidade nos lábios,
nem a verdade
nas suas entranhas,
porque a felicidade é filha das lágrimas
e a verdade é
gerada pela dor”
Kabril Gibran
«Atento, desde há muitos anos, a este problema, nunca vi os
movimentos de ecologistas preocupados com o que se faz em relação ao aborto e
com a destruição das mulheres, protagonistas de primeira importância, humana e
social, na procriação. Os raciocínios correntes são redutores e parece
interessar mais a eficácia, o imediato sem esforço, que o respeito pela
natureza humana e suas leis, em ordem à vida procurada e defendida. Dirão que a
ciência tem, também, a sua palavra. Pois que a diga, ao serviço da vida, não da
sua destruição. A educação sexual promovida e programada, que se dá a crianças
e adolescentes nas escolas, onde leva ou pode levar esta gente indefesa?»
Os movimentos ecológicos acordaram, em comum, para a
resposta à interpelação urgente de um sinal dos tempos, que se pode traduzir
pelo grito de respeito e defesa da natureza criada, ameaçada e, em muitos
casos, já destruída, pelos atropelos que contra ela muitas pessoas fazem.
Justifica-se a preocupação, dado que se trata de um bem de todos e a todos
necessário. O que já se conseguiu neste campo, sobretudo com as crianças e a
gente mais nova, é impressionante. Muito é o que se tem feito através da
educação nas escolas, das campanhas publicitárias e da multiplicação dos meios
adequados e acessíveis que ajudam a respeitar ambiente natural e a saber
classificar e recolher resíduos e desperdícios. Se recordarmos o que entre nós
se passava há trinta ou quarenta anos, vemos uma diferença abissal neste
aspecto, hoje com proveito para toda a gente.
Acontece, porém, que natureza criada é, também, a natureza
humana, a pessoa concreta e, no respeito por ela, há ainda muito caminho para
andar. É verdade que a defesa da natureza criada e do que ela comporta e
significa faz-se em razão das pessoas. Mas não podem parar aí os cuidados
comuns. Há, segundo o que vemos e sentimos, a urgência de uma defesa clara da
natureza humana, ou seja, das pessoas concretas, frente às agressões graves
contra as leis que regem a sua vida. Pensemos, por exemplo, na distribuição,
nos centros de saúde públicos, de anticonceptivos químicos que bloqueiam,
interrompem e desviam o curso normal das leis da natureza, muitas vezes com
consequências graves na saúde da mulher. Cientistas de grande valor
internacional, defendem e provam que os métodos naturais, não por razões morais
ou religiosas, mas por razões científicas provadas, são os únicos que respeitam
a sequência normal das leis da natureza em relação à concepção de novas vidas.
Atento, desde há muitos anos, a este problema, nunca vi os
movimentos de ecologistas preocupados com o que se faz em relação ao aborto e
com a destruição das mulheres, protagonistas de primeira importância, humana e
social, na procriação. Os raciocínios correntes são redutores e parece
interessar mais a eficácia, o imediato sem esforço, que o respeito pela
natureza humana e suas leis, em ordem à vida procurada e defendida. Dirão que a
ciência tem, também, a sua palavra. Pois que a diga, ao serviço da vida, não da
sua destruição. A educação sexual promovida e programada, que se dá a crianças
e adolescentes nas escolas, onde leva ou pode levar esta gente indefesa?
Noutro campo em aberto, não parece haver especial cuidado
educar no respeito pelos outros, em atitudes e gestos de concórdia e paz. A
violência nas escolas cresce e ganha cada dia formas novas e requintadas. Assim
o dizem os serviços do Estado, preocupados com o que se passa e com as
consequências que daí derivam. Mas, já não é apenas o espaço escolar, mas,
também se verifica no espaço familiar e no espaço público, que são bens e
direitos de todos nós. Há desprezo pela vida, agressividade incontrolada,
violência cheia de consequências. Matam-se pessoas como se fossem coelhos,
dentro lar e com filhos menores por testemunhas. Muita gente anda armada com armas
de morte, porque tem a violência a encher-lhe o coração. As pessoas valem menos
que os gatos, os cães e os touros de lide. E porquê? Quantos são os que se
preocupam, denunciam e clamam?
Medidas contra a pessoa humana são ainda as leis que
banalizam o divórcio que não respeitam, antes destroem, impunemente, a
instituição do casamento e os direitos da criança, traduzidos em cuidados que
devem defender e garantir o seu equilíbrio afectivo e emotivo, propiciando uma
vida tranquila, fomentada, diariamente, pelo amor insubstituível e simultâneo
do pai e da mãe. Muitas crianças são forçadas a viver um presente sem futuro,
sem que deixemos de reconhecer que há casais divorciados que olham para os
filhos, em comum, como a grande riqueza da sua vida. Quantas crianças, porém,
se tornam violentas, caminham cedo já para psicólogos e psiquiatras! É muito
difícil a uma criança crescer e viver pacificada, se o clima em que é criada, e
trocada nos fins de semana, não lhes propicia uma ambiente sereno e o amor
efectivo e afectivo, a que tem direito. Que respeito existe por uma criança que
tem direitos, mais do que os legais, mas nem sempre promovidos e defendidos
eficazmente, num período fundamental do desenvolvimento das suas capacidades,
sentimentos e integração social? Medidas e tutelas legais são, por vezes,
farisaicas e fáceis de driblar.
As violações da pessoa humana são mais numerosas e graves
que as violações da restante natureza. Delas passam ao lado muitos ecologistas,
delas se ocupa o Estado com mezinhas jurídicas. A sociedade foi-se deixando
anestesiar e para tudo encontra justificação? Kabril Gibran, um profeta dos
tempos novos, escreveu: “Os homens não têm a felicidade nos lábios, nem a
verdade nas suas entranhas, porque a felicidade é filha das lágrimas e a verdade
é gerada pela dor”. Quando as pessoas não valem, todas as coisas sobram.
Uma ecologia a favor da pessoa humana não pode ser fruto de
facilidades, de distracções, de prazeres imediatos. É uma luta diária. A
natureza é para as pessoas e são as pessoas que lhe dão sentido e valor
consistente.