Durante a campanha para o referendo sobre o aborto, disse aqui que o aborto clandestino continuaria a ser uma realidade, como desde sempre o foi. E disse, na altura, que tal aconteceria, fundamentalmente, porque a mulher e o homem o vêem como acto intrinsecamente mau. Por isso o procuram e o provocam às escondidas, convencidos de que, coisa que não se vê não é crime. Mas é, sobretudo quando ignora, conscientemente, tanto as leis naturais como os princípios religiosos, neste caso para os crentes.
Não me espanta, portanto, que os abortos legais tenham ficado aquém dos esperados. Isto é, os abortos clandestinos, tendo em conta os números propagados durante a campanha, continuam. Agora, com o silêncio dos que tanto os queriam eliminar, tornando os abortos livres e pagos pelo Estado, sabe-se que eles são feitos, nem que seja, como foi o caso, no silêncio do quarto de uma jovem estudante. Uns tantos comprimidos, de venda livre, poderiam matar mãe e filho. O filho não terá escapado e a jovem que não quis ser mãe, levada pela propaganda dos que aceitam o aborto como grande conquista civilizacional, sofreu as consequências da sua opção. Para mim, ficou com uma marca que jamais esquecerá; para outros será coisa de somenos, porque o que importa é ser dona do seu corpo.
FM
sexta-feira, 15 de fevereiro de 2008
Aveiro: cidade vista de outros ângulos
Ontem à tarde fui a Aveiro, como faço com frequência. Não tantas vezes como gostaria, mas por lá vou passando, já que na cidade me sinto bem. E vi muitos casais de todas as idades, decerto por ser o Dia dos Namorados. Cheguei a pensar que seria assim todos os dias, mas se calhar não é verdade. Mas devia ser. Porque se um casal deixar de namorar, isto é, dando mais atenção ao outro(a) do que a si próprio(a), compreendendo-o(a) e amando-o(a), está o caldo entornado. Depois apreciei o modo delicado, direi mesmo amoroso, como alguns manifestavam a sua ternura. Formulo votos de que passe a ser sempre assim. Não apenas no Dia dos Namorados, mas durante todos os dias do ano. E de todos os anos.
Há muito que não andava de moliceiro. Pois ontem fui dar uma voltinha pelos canais da Ria de Aveiro. A maré estava baixa, mas nem por isso me arrependi. O passeio não se estendeu para lá das comportas, ficando-se pela cidade, mas foi muito bom, mesmo assim. Com os moliceiros ali à mão de semear, nem todos os aproveitam, com certeza por falta de dinheiro para pagar o bilhete. Mas vale a pena. Sobretudo porque podemos ver a cidade de outros ângulos. É essa cidade que a partir de hoje, e durante alguns dias, mostrarei aos meus leitores.
FM
Há muito que não andava de moliceiro. Pois ontem fui dar uma voltinha pelos canais da Ria de Aveiro. A maré estava baixa, mas nem por isso me arrependi. O passeio não se estendeu para lá das comportas, ficando-se pela cidade, mas foi muito bom, mesmo assim. Com os moliceiros ali à mão de semear, nem todos os aproveitam, com certeza por falta de dinheiro para pagar o bilhete. Mas vale a pena. Sobretudo porque podemos ver a cidade de outros ângulos. É essa cidade que a partir de hoje, e durante alguns dias, mostrarei aos meus leitores.
FM
quinta-feira, 14 de fevereiro de 2008
Na Linha Da Utopia
O mundo na mão. Que mão no mundo?
1. Há breves anos, quando apareceu um anúncio publicitário com o mundo numa mão, destacava-se o efeito da desproporção, como se realmente fosse possível ter o gigante mundo numa pequena mão humana. Para além da questão publicitária, alguns observadores viam nessa imagem fotográfica um sinal destes tempos, que nos fazem sentir o mundo sempre presente. Efectivamente assim acontece. Nunca os continentes, as comunidades e as pessoas estiverem tão próximos, nunca como hoje se conheceram tantos cantos e recantos deste planeta azul (às vezes cinzento), nunca, também, se observaram em simultâneo as misérias, os cataclismos, as venturas e desventuras da humanidade.
2. À ousadia de colocar o mundo numa mão, vai-se erguendo a ideia feita compromisso de colocar as “mãos na massa” do mundo concreto. Se todas as formas de comunicar trazem até nós as diversas realidades de mundo, cabe, consequentemente, quase como imperativo da responsabilidade, um continuado despertar envolvente cada vez mais na busca de soluções, práticas como eficazes. É esse o esforço a potenciar, multiplicar. Quando não, uma pequena parte do mundo estará à mesa num lauto banquete da abundância…a ver as imagens da gritante fome na televisão. Tão simples quanto isto. Escandaloso!
3. O deslumbrante encontro do “global” com o “particular” obriga a redimensionar tudo. Como manifesta muitas vezes o presidente da AMI (Assistência Médica Internacional), Fernando Nobre, é urgente gritar “contra a indiferença”, esta indiferença o pior dos males das chamadas sociedades de bem-estar. Até para as grandes instituições que se querem afirmar como significativas nos tempos de globalização, não há outra solução senão o procurar (re)conhecer o mundo e tê-lo sempre presente como horizonte, numa redescoberta local de soluções que se vão abrindo à universalidade, até ao mundo na “mão”!
4. O tempo do olhar para o umbigo dos “botões” passou. A época do apreciar e partilhar a diversidade local no mundo global está aí, afirmando-se como a via de enquadramento como diálogo dialéctico de todas as diversidades tão ricas neste mundo. Como sugere Jérôme Bindé, na introdução à obra “As Chaves do Século XXI” (Piaget, 2002: 13), «o séc. XXI não poderia ser reduzido a um monólogo, ainda que fosse o da tecnologia, e qualquer antecipação não pode ser, a nosso ver, senão uma “dialéctica” do futuro». Nesta base, e em busca de qualidade humana sempre crescente, será mais possível pôr no mundo a mão que não explore mas que seja o encontro ético de justas soluções. Muitas mãos ainda não vêm mais longe que os seus botões…
Alexandre Cruz
Dia dos Namorados
MADRIGAL
A minha história é simples.
A tua, meu Amor,
é bem mais simples ainda:
"Era uma vez uma flor.
Nasceu à beira de um Poeta..."
Vês como é simples e linda?
(O resto conto depois;
mas tão a sós, tão de manso
que só escutemos os dois).
Sebastião da Gama
UM DADO SOCIAL PREOCUPANTE, CONCRETO E INTERPELADOR
"Onde está a solidez da vida em sociedade, da qual a família será sempre célula viva ou morta, o valor dos compromissos pessoais e dos compromissos assumidos de modo público, a dimensão moral dos valores da vida e das pessoas, a garantia, não apenas legal, que também esta é pouca, dos direitos fundamentais dos filhos, onde a seriedade de quem deve ter princípios a reger a vida, se quer que a esta se chame vida?"
quarta-feira, 13 de fevereiro de 2008
Diocese de Aveiro no Programa Ecclesia
Torreira: Ria de Aveiro
Dois padres com carismas especiais
FÉ COMO A MARÉ
Ontem e hoje, às 18.30 horas, a Diocese de Aveiro esteve no programa Ecclesia, que passa na RTP2, em “A Fé dos Homens”, de segunda a sexta-feira. Por ali se mostraram imagens, pessoas e instituições ligadas à Igreja Aveirense, todas bem enquadradas por D. António Francisco, que sobre elas foi falando, através de palavras oportunas, das propostas e desafios de cada uma, rumo a uma comunidade diocesana mais comprometida com a vida. E disse, entre outras considerações, que “o grande desafio é evangelizar a cultura”. Em dois curtos programas, foi agradável ver o palpitar de uma diocese, com gente que aposta na procura de um mundo mais fraterno, sendo certo que há muitas pessoas cuja fé é como a maré. Ontem, passou o Stella Maris, que vive para apoiar, a vários níveis, os homens e mulheres que, directa ou indirectamente, vivem do mar e da ria, tendo em conta a realidade portuária, que passa, presentemente, por grandes transformações. Depois, vi uma paróquia piscatória, a Torreira, com projectos para implementar a aproximação e o convívio de todos quantos trabalham na laguna, olhando a vida à luz da fé cristã. E em Pardilhó, onde estaleiros e artesãos teimam em manter a construção dos moliceiros, senti que a faina da ria não pode morrer.
Da ria e do mar, passei à cidade, onde vivem e trabalham as Florinhas do Vouga, atentas aos que mais precisam. De pão e de leite quente, mas também do calor humano, que os sem-abrigo vão recebendo, a par de um trabalho que lhes devolva a auto-estima e a alegria de viver. Outras valências, naturalmente, preenchem a vida das Florinhas.
Hoje, vi o jardim espiritual que é o Movimento de Schoenstatt, com a proposta, há muitos anos, de contribuir para a formação do homem novo para uma nova sociedade, através da Aliança de Amor com Nossa Senhora. Mas, ainda, à sombra do Santuário da Mãe e Rainha Três Vezes Admirável de Schoenstatt e dos ensinamentos do fundador, Padre José Kentenich, em perfeita ligação com os programas diocesanos.
O CUFC (Centro Universitário Fé e Cultura), que está aberto à comunidade universitária e a todos, afinal, tem como objectivo fundamental promover o diálogo entre fé e cultura, qual ponte que liberte as mentes para uma maior participação social e espiritual.
O ISCRA (Instituto Superior de Ciências Religiosas de Aveiro), que, à sombra do Seminário de Santa Joana Princesa, tem por missão dinamizar a formação de cristãos, tendo em perspectiva uma fé mais esclarecida, que leve a uma comunidade mais atenta aos homens e mulheres do nosso tempo, segunda a perspectiva cristã.
Ontem e hoje, às 18.30 horas, a Diocese de Aveiro esteve no programa Ecclesia, que passa na RTP2, em “A Fé dos Homens”, de segunda a sexta-feira. Por ali se mostraram imagens, pessoas e instituições ligadas à Igreja Aveirense, todas bem enquadradas por D. António Francisco, que sobre elas foi falando, através de palavras oportunas, das propostas e desafios de cada uma, rumo a uma comunidade diocesana mais comprometida com a vida. E disse, entre outras considerações, que “o grande desafio é evangelizar a cultura”. Em dois curtos programas, foi agradável ver o palpitar de uma diocese, com gente que aposta na procura de um mundo mais fraterno, sendo certo que há muitas pessoas cuja fé é como a maré. Ontem, passou o Stella Maris, que vive para apoiar, a vários níveis, os homens e mulheres que, directa ou indirectamente, vivem do mar e da ria, tendo em conta a realidade portuária, que passa, presentemente, por grandes transformações. Depois, vi uma paróquia piscatória, a Torreira, com projectos para implementar a aproximação e o convívio de todos quantos trabalham na laguna, olhando a vida à luz da fé cristã. E em Pardilhó, onde estaleiros e artesãos teimam em manter a construção dos moliceiros, senti que a faina da ria não pode morrer.
Da ria e do mar, passei à cidade, onde vivem e trabalham as Florinhas do Vouga, atentas aos que mais precisam. De pão e de leite quente, mas também do calor humano, que os sem-abrigo vão recebendo, a par de um trabalho que lhes devolva a auto-estima e a alegria de viver. Outras valências, naturalmente, preenchem a vida das Florinhas.
Hoje, vi o jardim espiritual que é o Movimento de Schoenstatt, com a proposta, há muitos anos, de contribuir para a formação do homem novo para uma nova sociedade, através da Aliança de Amor com Nossa Senhora. Mas, ainda, à sombra do Santuário da Mãe e Rainha Três Vezes Admirável de Schoenstatt e dos ensinamentos do fundador, Padre José Kentenich, em perfeita ligação com os programas diocesanos.
O CUFC (Centro Universitário Fé e Cultura), que está aberto à comunidade universitária e a todos, afinal, tem como objectivo fundamental promover o diálogo entre fé e cultura, qual ponte que liberte as mentes para uma maior participação social e espiritual.
O ISCRA (Instituto Superior de Ciências Religiosas de Aveiro), que, à sombra do Seminário de Santa Joana Princesa, tem por missão dinamizar a formação de cristãos, tendo em perspectiva uma fé mais esclarecida, que leve a uma comunidade mais atenta aos homens e mulheres do nosso tempo, segunda a perspectiva cristã.
Dois padres com carismas especiais
Dois padres diocesanos, bem conhecidos pelos seus carismas, também tiveram o seu cantinho no programa Ecclesia. O Padre Manuel Armando, Marcos do Vale de nome artístico, põe a magia ao serviço da pastoral e da fé. Defende a importância de aproveitarmos os nossos carismas, tal como ele faz com o ilusionismo e o hipnotismo. Por sua vez, o Padre Júlio Grangeia, responsável por uma paróquia virtual, o primeiro padre cibernauta do País, ocupa uma grande fatia do ciberespaço, chegando, com a sua voz e imagem, a todo o mundo. Com o seu portal, provoca o diálogo, numa linha pastoral. Mas ainda está no YouTube, ao natural, com histórias para ajudar as pessoas e para mostrar que a Igreja “não é só de ontem, mas de hoje”.
A nossa diocese é isto: são os templos abertos a quem precisa de rezar, na procura constante de Deus, mas são, também, os cristãos que estão em inúmeras instituições, paróquias, serviços e obras, dando-se aos outros, e descobrindo os melhores caminhos para a vivência do evangelho, que passam, indubitavelmente, pela promoção do homem todo, qualquer que seja a sua raça, nacionalidade ou religião.
Fernando Martins
A nossa diocese é isto: são os templos abertos a quem precisa de rezar, na procura constante de Deus, mas são, também, os cristãos que estão em inúmeras instituições, paróquias, serviços e obras, dando-se aos outros, e descobrindo os melhores caminhos para a vivência do evangelho, que passam, indubitavelmente, pela promoção do homem todo, qualquer que seja a sua raça, nacionalidade ou religião.
Fernando Martins
Na Linha Da Utopia
A autocrítica de “compreender”
1. Dos desafios mais importantes da vida será “compreender”. Compreender tudo o que acontece, nas suas várias faces de causas, factos e consequências. Mas para compreender é preciso criar a distância crítica necessária, colocar todos os dados em jogo, “joeirar”, para depois poder considerar de forma mais justa. Dos piores sintomas da falta de autocrítica será o ajuizar sem conhecer, o falar sobre algo sem saber minimamente, o optar sem se situar na pluralidade de caminhos. O focalizar e perder-se num “ponto” sem ler e entender todo um “texto” poderá ser esse sinal da falta de visão de conjunto que não procura compreender a totalidade.
2. Neste âmbito destacaríamos a obra de Maria Manuel Baptista sobre Eduardo Lourenço. O título é sugestivo: Eduardo Lourenço – A paixão de compreender (ASA, 2003). É a visão de um dos maiores pensadores portugueses actuais que estimula a todos realizarmos esse exercício insubstituível da prudência como caminho de sabedoria para nas horas presentes se ir descortinando o melhor futuro possível. Talvez o nosso tempo social não dedique o tempo necessário a este aprofundamento por “porquês” para melhor se ver os caminhos dos “para quês” como construção de ideais.
3. Perguntarmo-nos sobre “o que acontece” é ir às razões profundas e nessa origem procurarmos uma iluminação que desperte a esperança e o compromisso. Uma transversalidade de áreas precisam desta autocrítica que procura “compreender”, a começar por factos tão diários como a diminuição dos compromissos em casamentos (que compromete o futuro, até das natalidades) ou visões tão essenciais como as grandes questões da dignidade da vida humana que interpelam o modelo de sociedade e civilização (a andar para trás, enquanto o conhecimento científico anda para a frente!...).
4. Muitas destas questões têm andado como bandeiras daqui e dali, desta ou daquela “parte”, diluindo-se para o “todo” da sociedade a essência profunda das razões. Algumas intervenções procuram essa “descentralização”, mas os “ouvidos” das comunicações estão bloqueados… Talvez para algumas das argumentações pretenda-se, precisamente até, que as sociedades não tomem consciência do “tudo” que está em causa nessas causas fundamentais. Talvez a anemia do “não compreender” seja favorável como estratégia avançada de certas formas de ler a vida, para quem a liberdade na Verdade e Dignidade Humana pouco interessa. Este é o tempo da “síntese” e das razões profundas onde, mesmo sem estar na “moda”, para além dos pormenores, importa valorizar as causas que valham a pena e que possam unir. Não num mero sobreviver, mas numa vida com sentido. Autocrítica como cidadania do SER precisa-se!
Alexandre Cruz
1. Dos desafios mais importantes da vida será “compreender”. Compreender tudo o que acontece, nas suas várias faces de causas, factos e consequências. Mas para compreender é preciso criar a distância crítica necessária, colocar todos os dados em jogo, “joeirar”, para depois poder considerar de forma mais justa. Dos piores sintomas da falta de autocrítica será o ajuizar sem conhecer, o falar sobre algo sem saber minimamente, o optar sem se situar na pluralidade de caminhos. O focalizar e perder-se num “ponto” sem ler e entender todo um “texto” poderá ser esse sinal da falta de visão de conjunto que não procura compreender a totalidade.
2. Neste âmbito destacaríamos a obra de Maria Manuel Baptista sobre Eduardo Lourenço. O título é sugestivo: Eduardo Lourenço – A paixão de compreender (ASA, 2003). É a visão de um dos maiores pensadores portugueses actuais que estimula a todos realizarmos esse exercício insubstituível da prudência como caminho de sabedoria para nas horas presentes se ir descortinando o melhor futuro possível. Talvez o nosso tempo social não dedique o tempo necessário a este aprofundamento por “porquês” para melhor se ver os caminhos dos “para quês” como construção de ideais.
3. Perguntarmo-nos sobre “o que acontece” é ir às razões profundas e nessa origem procurarmos uma iluminação que desperte a esperança e o compromisso. Uma transversalidade de áreas precisam desta autocrítica que procura “compreender”, a começar por factos tão diários como a diminuição dos compromissos em casamentos (que compromete o futuro, até das natalidades) ou visões tão essenciais como as grandes questões da dignidade da vida humana que interpelam o modelo de sociedade e civilização (a andar para trás, enquanto o conhecimento científico anda para a frente!...).
4. Muitas destas questões têm andado como bandeiras daqui e dali, desta ou daquela “parte”, diluindo-se para o “todo” da sociedade a essência profunda das razões. Algumas intervenções procuram essa “descentralização”, mas os “ouvidos” das comunicações estão bloqueados… Talvez para algumas das argumentações pretenda-se, precisamente até, que as sociedades não tomem consciência do “tudo” que está em causa nessas causas fundamentais. Talvez a anemia do “não compreender” seja favorável como estratégia avançada de certas formas de ler a vida, para quem a liberdade na Verdade e Dignidade Humana pouco interessa. Este é o tempo da “síntese” e das razões profundas onde, mesmo sem estar na “moda”, para além dos pormenores, importa valorizar as causas que valham a pena e que possam unir. Não num mero sobreviver, mas numa vida com sentido. Autocrítica como cidadania do SER precisa-se!
Alexandre Cruz
Conferência sobre Santa Joana
No Museu da Cidade,
18 de Fevereiro, 18.30 horas
A Princesa Santa Joana (1452-1490) e o Infante D. Pedro (1392-1449) são temas da próxima conferência dedicada aos “aveirenses ilustres”, que se realiza no dia 18 de Fevereiro, às 18h30, no Museu da Cidade. Será orador Saul António Gomes, da Universidade de Coimbra, doutorado em História e autor do volume sobre D. Afonso V (que é sobrinho-neto do Infante D. Pedro e pai de Santa Joana) publicado pelo Círculo de Leitores. As conferências sobre os aveirenses ilustres prolongam-se até 19 de Maio.
Fonte: Correio do Vouga
Fonte: Correio do Vouga
Padre Alexandre Cruz concluiu mestrado
O Padre Alexandre Cruz, que me honra com a sua colaboração no meu blogue, concluiu com sucesso, no dia 6 de Fevereiro, o mestrado em Ciências da Educação (Formação Pessoal e Social), na Universidade de Aveiro, defendendo a tese “Uma visão pedagógica dialogal na crise da primeira globalização”, sob orientação do Prof. Carlos Meireles Coelho.
O responsável do Centro Universitário Fé e Cultura estudou o período da “primeira globalização”, ou seja, a dos descobrimentos dos sécs. XV-XVI, destacando a acção do Padre António Vieira como um dos primeiros defensores da moderna ideia da dignidade humana, que está na base dos direitos humanos.
Daqui felicito o meu bom amigo, com votos de mais sucessos, na caminhada com que procura chegar mais alto e mais longe, sempre por um mundo muito melhor.
O responsável do Centro Universitário Fé e Cultura estudou o período da “primeira globalização”, ou seja, a dos descobrimentos dos sécs. XV-XVI, destacando a acção do Padre António Vieira como um dos primeiros defensores da moderna ideia da dignidade humana, que está na base dos direitos humanos.
Daqui felicito o meu bom amigo, com votos de mais sucessos, na caminhada com que procura chegar mais alto e mais longe, sempre por um mundo muito melhor.
terça-feira, 12 de fevereiro de 2008
PORES DO SOL
"Se eu fosse pintor, passava a minha vida a pintar o pôr do Sol à beira-mar. Fazia cem telas, todas variadas, com tintas novas e imprevistas. É um espectáculo extraordinário.
Há-os em farfalhos, com largas pinceladas verdes. Há-os trágicos, quando as nuvens tomam todo o horizonte com um ar de ameaça, e outros doirados e verdes, com o crescente fino da Lua no alto e do lado oposto a montanha enegrecida e compacta. Tardes violetas, neste ar tão carregado de salitre que torna a boca pegajosa e amarga, e o mar violeta e doirado a molhar a areia e os alicerces dos velhos fortes abandonados ...
Um poente desgrenhado, com nuvens negras lá no fundo, e uma luz sinistra. Ventania. Estratos monstruosos correm do norte. Sobre o mar fica um laivo esquecido que bóia nas águas – e não quer morrer... "
Há-os em farfalhos, com largas pinceladas verdes. Há-os trágicos, quando as nuvens tomam todo o horizonte com um ar de ameaça, e outros doirados e verdes, com o crescente fino da Lua no alto e do lado oposto a montanha enegrecida e compacta. Tardes violetas, neste ar tão carregado de salitre que torna a boca pegajosa e amarga, e o mar violeta e doirado a molhar a areia e os alicerces dos velhos fortes abandonados ...
Um poente desgrenhado, com nuvens negras lá no fundo, e uma luz sinistra. Ventania. Estratos monstruosos correm do norte. Sobre o mar fica um laivo esquecido que bóia nas águas – e não quer morrer... "
Raul Brandão, in " Os Pescadores"
Foto de Ângelo Ribau
Gafanha da Nazaré: Ganhar tempo
Gafanha antiga: Igreja matriz, inaugurada em 1912
Recordo hoje o espírito de entreajuda que existia entre os gafanhões dos princípios do século passado e, talvez, das gerações anteriores, espírito esse que ainda vivi na minha meninice. Cenas que mostravam o espírito da vizinhança bastante acentuado, que se confirmava na cedência dos fósforos que se tinham esgotado, do ovo que faltava, do sal que tinha acabado, das couves para as refeições de todos os dias, que as do próprio quintal ainda não estavam à moda de apanhar, e do azeite que deixara de escorrer da garrafa.
As pessoas gostavam de trabalhar em conjunto. As tarefas agrícolas eram participadas pelos familiares e vizinhos, na certeza de que no dia seguinte estariam nos terrenos de outros ou nos seus, quando chegasse a sua vez. Trabalhavam para “ganhar tempo”, como se dizia e eu tanto observei.
Nas desmantadelas do milho, ao serão para juntar mais vizinhos, havia o bom gosto de brincar. Num desses serões, uns trolhas, que trabalhavam na Gafanha e que tinham vindo dos lados da Murtosa, apareceram com uns lençóis pela cabeça e umas máscaras improvisadas para esconderem as suas identidades. Foi uma noite bastante divertida, cada um procurando adivinhar quem seriam os mascarados. Só muito tarde, noite adiantada, se soube quem eles eram. Nunca percebi a razão destas brincadeiras que se mantêm na minha memória.
Vinham, depois, as malhadas, com o recurso ao malho. Gente possante e treinada, para marcar a cadência, à força de tanto bater lá se conseguiam separar os grãos de milho do caroço. O mesmo acontecia com a cevada, centeio ou aveia, os cereais mais cultivados nas Gafanhas.
Contudo, muito frequentemente os malhos e a força humana eram substituídos pela caminhada cadenciada das vacas dos proprietários e vizinhos sobre os cereais colocados com jeito na eira.
Estou a ver os mais jovens a imaginarem o que aconteceria quando as vacas precisassem de fazer as suas necessidades! Pois foi fácil, ou não andassem os nossos avós habituados a contornar as dificuldades. Inventaram uma retrete ambulante muito prática e higiénica: ao lado da roda formada pelas vacas em marcha, na eira, postava-se, atento, um garoto, com um bacio na mão, à espera que um qualquer animal resolvesse esvaziar a tripa ou a bexiga!
Porém, as manifestações comunitárias não se circunscreveram, nos primórdios da Gafanha, aos trabalhos agrícolas, mas estenderam-se, também, a outras actividades mais ou menos importantes.
Recordo ainda hoje a azáfama no fabrico dos adobos nos areais esbranquiçados, junto à mata. A cal viva era transportada em carros de bois desde os locais de origem, das bandas da Bairrada, ao que se dizia, até à Gafanha. Uma vez nos areais, era queimada pela simples junção de água dum poço que ali mesmo era aberto. Juntavam-se, depois, as famílias dos nubentes e os amigos e vizinhos, com os mais entendidos no comando das operações, para amassarem a cal com a areia e para moldarem os adobos em formas previamente feitas de tábuas.
Os mais experientes manejavam a colher da cal, ajeitando e apertando a massa sobre a forma de madeira, que era retirada, pouco depois, para se continuar a operação tantas vezes quantos os adobos necessários. E ali ficavam eles a secar à torreira batida pelos ventos que só os pinheiros enfrentavam corajosamente.
Vinham, a seguir, as “ajuntadelas”. O mesmo rancho lá ia empilhar os adobos para que adquirissem a consistência que só o tempo podia dar.
Nas vésperas da construção da casa, procedia-se à “acartadela” em carros de bois ou de vacas postos à disposição dos interessados pelos que os possuíam. Sabiam estes que tais favores eram sempre compensados, em maré semelhante, pelos que eram agora beneficiados. Depois, essa mesma gente ajudava, na hora própria, a “levantar a casa”, tarefa orientada pelo mestre ou familiar mais conhecedor.
Logo que a casa ficasse coberta, e quantas vezes sem o mínimo conforto, ali se recolhia o jovem casal para iniciar vida nova sob a bênção de Deus e dos pais.
Os acabamentos seguiriam quando houvesse dinheiro, porque o hábito de “ficar a dever” foi coisa que surgiu apenas nos nossos dias.
Fernando Martins
Recordo hoje o espírito de entreajuda que existia entre os gafanhões dos princípios do século passado e, talvez, das gerações anteriores, espírito esse que ainda vivi na minha meninice. Cenas que mostravam o espírito da vizinhança bastante acentuado, que se confirmava na cedência dos fósforos que se tinham esgotado, do ovo que faltava, do sal que tinha acabado, das couves para as refeições de todos os dias, que as do próprio quintal ainda não estavam à moda de apanhar, e do azeite que deixara de escorrer da garrafa.
As pessoas gostavam de trabalhar em conjunto. As tarefas agrícolas eram participadas pelos familiares e vizinhos, na certeza de que no dia seguinte estariam nos terrenos de outros ou nos seus, quando chegasse a sua vez. Trabalhavam para “ganhar tempo”, como se dizia e eu tanto observei.
Nas desmantadelas do milho, ao serão para juntar mais vizinhos, havia o bom gosto de brincar. Num desses serões, uns trolhas, que trabalhavam na Gafanha e que tinham vindo dos lados da Murtosa, apareceram com uns lençóis pela cabeça e umas máscaras improvisadas para esconderem as suas identidades. Foi uma noite bastante divertida, cada um procurando adivinhar quem seriam os mascarados. Só muito tarde, noite adiantada, se soube quem eles eram. Nunca percebi a razão destas brincadeiras que se mantêm na minha memória.
Vinham, depois, as malhadas, com o recurso ao malho. Gente possante e treinada, para marcar a cadência, à força de tanto bater lá se conseguiam separar os grãos de milho do caroço. O mesmo acontecia com a cevada, centeio ou aveia, os cereais mais cultivados nas Gafanhas.
Contudo, muito frequentemente os malhos e a força humana eram substituídos pela caminhada cadenciada das vacas dos proprietários e vizinhos sobre os cereais colocados com jeito na eira.
Estou a ver os mais jovens a imaginarem o que aconteceria quando as vacas precisassem de fazer as suas necessidades! Pois foi fácil, ou não andassem os nossos avós habituados a contornar as dificuldades. Inventaram uma retrete ambulante muito prática e higiénica: ao lado da roda formada pelas vacas em marcha, na eira, postava-se, atento, um garoto, com um bacio na mão, à espera que um qualquer animal resolvesse esvaziar a tripa ou a bexiga!
Porém, as manifestações comunitárias não se circunscreveram, nos primórdios da Gafanha, aos trabalhos agrícolas, mas estenderam-se, também, a outras actividades mais ou menos importantes.
Recordo ainda hoje a azáfama no fabrico dos adobos nos areais esbranquiçados, junto à mata. A cal viva era transportada em carros de bois desde os locais de origem, das bandas da Bairrada, ao que se dizia, até à Gafanha. Uma vez nos areais, era queimada pela simples junção de água dum poço que ali mesmo era aberto. Juntavam-se, depois, as famílias dos nubentes e os amigos e vizinhos, com os mais entendidos no comando das operações, para amassarem a cal com a areia e para moldarem os adobos em formas previamente feitas de tábuas.
Os mais experientes manejavam a colher da cal, ajeitando e apertando a massa sobre a forma de madeira, que era retirada, pouco depois, para se continuar a operação tantas vezes quantos os adobos necessários. E ali ficavam eles a secar à torreira batida pelos ventos que só os pinheiros enfrentavam corajosamente.
Vinham, a seguir, as “ajuntadelas”. O mesmo rancho lá ia empilhar os adobos para que adquirissem a consistência que só o tempo podia dar.
Nas vésperas da construção da casa, procedia-se à “acartadela” em carros de bois ou de vacas postos à disposição dos interessados pelos que os possuíam. Sabiam estes que tais favores eram sempre compensados, em maré semelhante, pelos que eram agora beneficiados. Depois, essa mesma gente ajudava, na hora própria, a “levantar a casa”, tarefa orientada pelo mestre ou familiar mais conhecedor.
Logo que a casa ficasse coberta, e quantas vezes sem o mínimo conforto, ali se recolhia o jovem casal para iniciar vida nova sob a bênção de Deus e dos pais.
Os acabamentos seguiriam quando houvesse dinheiro, porque o hábito de “ficar a dever” foi coisa que surgiu apenas nos nossos dias.
Fernando Martins
Aznavour no Pavilhão Atlântico
Para os românticos, no dia 23 de Fevereiro Mais de três décadas depois, Charles Aznavour volta a Portugal, para cantar no Pavilhão Atlântico. Será no dia 23 de Fevereiro que este Senhor da Canção Romântica mostrará, aos 83 anos de idade, como se canta bem. Aqui fica um cheirinho do que ele cantará.
Na Linha Da Utopia
Despesa versus Investimento
1. Estas duas palavras, despesa e investimento, conjugam muita da tensão entre duas concepções distintas, em que o meio será a virtude. Considerar como “despesa” áreas fundamentais da sociedade que poderão ser alavancas do futuro é fica-se pelo meio do caminho. Normalmente, as (continuadas) épocas do aperto económico são muito mais amigas da palavra “despesa”, dessa forma fechando as portas daquilo que pode ser raiz de novas soluções. Em conformidade, pouca margem é dada a uma concepção de “investimento”, considerando-se, precipitadamente, o “rigor” inimigo das apostas essenciais no futuro.
2. Não é fácil, a não ser na teoria, a conjugação funcional destes factores eixo do desenvolvimento dos povos. Exigirá o saber-se caminhar numa fronteira de difícil discernimento, mas em que a envolvência participativa de todos os agentes dessa determinada área muito poderão colaborar no encontrar das melhores soluções no terreno. Não é nada de novo o dizer-se que todas as despesas nas áreas fulcrais da saúde, educação, acção social e justiça devem ser mudadas de nome, sendo designadas como investimentos para uma sociedade mais humana e justa para todos. Umas a montante outras a jusante.
3. Não há comunidade social que se segure muito tempo centrada só no por as contas em dia, sem olhar a meios para atingir esses fins. Esta óptica numérica sempre cegou lendo tudo como despesa e desumanizando as pessoas e as relações, deitando a perder as motivações em valores e ideais comuns, algo que caracteriza os humanos nas sociedades livres democráticas. E se os grandes investimentos são projectados em grandes obras ou acontecimentos continuam-se a adiar, para além da “cosmética”, os grandes investimentos no maior tesouro das sociedades, as pessoas. Vão sendo muitas as afirmações de um mau estar social, de uma multidão de juventude sem “lugar”, a par de continuadas denúncias de corrupções numa justiça que tem o seu ritmo…
4. O terreno está difícil. Frutifica o que se deveria apagar e não floresce o que seria imperioso reinar. Como não dá frutos numéricos imediatos, (nada de novo) continua a não haver lugar de explícito insubstituível (transversal e específico) para uma formação humana sensibilizadora para os valores fundamentais da comunidade (nacional, europeia e global). Queremos colher os frutos sem termos o generoso cuidado de investir na sementeira. Eis um dos dramas das sociedades que crescem nas “coisas” mas vão ficando pobres de horizontes de ser-sentir-pensar-esperar. Felizmente, parece que em termos de educação artística e formação musical algo estará em processo de realização. Assim seja, de forma envolvente com todos, aberta, transversal…(?). Aprender música é saber matemática!
Alexandre Cruz
1. Estas duas palavras, despesa e investimento, conjugam muita da tensão entre duas concepções distintas, em que o meio será a virtude. Considerar como “despesa” áreas fundamentais da sociedade que poderão ser alavancas do futuro é fica-se pelo meio do caminho. Normalmente, as (continuadas) épocas do aperto económico são muito mais amigas da palavra “despesa”, dessa forma fechando as portas daquilo que pode ser raiz de novas soluções. Em conformidade, pouca margem é dada a uma concepção de “investimento”, considerando-se, precipitadamente, o “rigor” inimigo das apostas essenciais no futuro.
2. Não é fácil, a não ser na teoria, a conjugação funcional destes factores eixo do desenvolvimento dos povos. Exigirá o saber-se caminhar numa fronteira de difícil discernimento, mas em que a envolvência participativa de todos os agentes dessa determinada área muito poderão colaborar no encontrar das melhores soluções no terreno. Não é nada de novo o dizer-se que todas as despesas nas áreas fulcrais da saúde, educação, acção social e justiça devem ser mudadas de nome, sendo designadas como investimentos para uma sociedade mais humana e justa para todos. Umas a montante outras a jusante.
3. Não há comunidade social que se segure muito tempo centrada só no por as contas em dia, sem olhar a meios para atingir esses fins. Esta óptica numérica sempre cegou lendo tudo como despesa e desumanizando as pessoas e as relações, deitando a perder as motivações em valores e ideais comuns, algo que caracteriza os humanos nas sociedades livres democráticas. E se os grandes investimentos são projectados em grandes obras ou acontecimentos continuam-se a adiar, para além da “cosmética”, os grandes investimentos no maior tesouro das sociedades, as pessoas. Vão sendo muitas as afirmações de um mau estar social, de uma multidão de juventude sem “lugar”, a par de continuadas denúncias de corrupções numa justiça que tem o seu ritmo…
4. O terreno está difícil. Frutifica o que se deveria apagar e não floresce o que seria imperioso reinar. Como não dá frutos numéricos imediatos, (nada de novo) continua a não haver lugar de explícito insubstituível (transversal e específico) para uma formação humana sensibilizadora para os valores fundamentais da comunidade (nacional, europeia e global). Queremos colher os frutos sem termos o generoso cuidado de investir na sementeira. Eis um dos dramas das sociedades que crescem nas “coisas” mas vão ficando pobres de horizontes de ser-sentir-pensar-esperar. Felizmente, parece que em termos de educação artística e formação musical algo estará em processo de realização. Assim seja, de forma envolvente com todos, aberta, transversal…(?). Aprender música é saber matemática!
Alexandre Cruz
Como tornar a cinza em lume?
A Quaresma coincide com o irromper da primavera, e a coincidência não é apenas de calendário, mas de fundo. Há um nítido apelo primaveril, o mesmo sopro tenro, um igual perfume disseminado nesta proposta quaresmal, que pode até (injustamente) passar por sisuda ou anódina, quando é o oposto disso.
A Quaresma é um tempo simbólico. Constitui, em vista da Páscoa, um sobressalto vital. A Quaresma vem exorcizar o fatalismo, reagir ao ditado pragmático do "deixa andar". Tudo isso em nome de uma grande esperança: "Pode um homem sendo velho nascer de novo?", perguntava Nicodemos a Jesus. E não ficou sem resposta.
Neste pôr-a-vida-em-processo-de-florescimento somos ajudados por três expressões do património espiritual cristão:
1. A oração. A oração é uma brecha que nasce da escuta. Pelo provisório faz passar o Eterno. Ao puramente histórico empresta uma vocação transcendente. Permite que o homem olhe não apenas para Deus, mas seja capaz de olhar-se a ele próprio com os olhos de Deus.
2. O jejum. Vivemos triturados na digestão que o mundo faz de nós. Trazemos o Ser hipotecado ao Ter. Corremos de um lado para outro, reféns e instrumentos, mais do que autónomos e criativos. A privação, quando corresponde a um acto espiritual, amplia o campo da liberdade. Cria novas disponibilidades, possibilita o exercício do pensamento e do discernimento, melhora o sentido de humor…
3. Ao jejum está ligada a prática da esmola, que tem a sua modalidade mais autêntica na condivisão. Lê-se no profeta Isaías: "O jejum que Eu quero não será antes este: quebrar as cadeias injustas, desatar os laços de servidão…? Não será repartir o teu pão com o faminto, dar pousada aos pobres sem abrigo, levar roupa aos que não têm com que se vestir e não voltar as costas ao teu semelhante?". O jejum abre o nosso coração aos outros. A esmola testemunha-o no compromisso por um mundo fraterno.
Por isso, quando, ao começar a Quaresma, os cristãos recebem sobre a sua cabeça o sinal das cinzas, acolhem também a interpelação: "como tornar a cinza em lume?"
José Tolentino Mendonça
Renúncia quaresmal que não chega a quem precisa
Beneficiar quem não tem que comer, quem se viu privado de casa por alguma tragédia natural, quem não tem emprego...
Recordo uma conversa com o saudoso padre Armindo Duarte, então pároco do Campo Grande (Lisboa), há já uns quantos anos: dizia ele que a renúncia quaresmal não devia ficar em casa. Isso seria o mesmo que ajudar apenas a família. E acrescentava que a Quaresma deveria ser, "antes de mais, um tempo de profunda revisão de vida e de renúncia a tudo o que pode centrar o homem em si próprio e não em Deus".
Percebo, ao lembrar estas palavras, que falta uma intensa pedagogia da renúncia e da partilha fraterna. É verdade que, colocados perante emergências graves (terramotos, inundações,…), os cristãos respondem com generosidade. Mas também é verdade que essas situações têm respostas generosas de toda a sociedade civil. Os cristãos não fazem mais que os outros, poderíamos então dizer.
Onde os cristãos se devem distinguir dos outros é no espírito que aprendemos nos Actos dos Apóstolos: "Eram assíduos ao ensino dos Apóstolos, à união fraterna, à fracção do pão e às orações. (…) Todos os crentes viviam unidos e possuíam tudo em comum" (2, 42; 44).
Não se trata de fazer igual, mas de recriar, para os tempos de hoje, o mesmo espírito. Ora, é aí, na pedagogia e recriação da partilha, que as comunidades cristãs estão a falhar. Que consciência social temos dos pobres à nossa volta, das milhares de famílias que não têm o dinheiro suficiente para comer e satisfazer as suas necessidades básicas? Dizem os números que, em Portugal, são ainda vinte por cento da população: em cada cinco pessoas à nossa volta, há quatro que vivem bem demais, porque uma vive mal demais.
Claro que existe a renúncia quaresmal. Mas, desde há vários anos, sinto que esta iniciativa, tão genuína e interpeladora na sua origem, está abastardada. Ela começou por ser um modo de nos mobilizarmos para apoiar outros, mais necessitados, renunciando a algum supérfluo do que era nosso. Hoje, ela é uma forma tranquila de descansarmos a consciência com mais um gesto sem consequências: no final da Quaresma, coloca-se uma ou duas notas no respectivo envelope que a paróquia forneceu, entrega-se e a vida continua.
Há outro problema, colectivo: a maior parte dos destinos dados ao dinheiro recolhido na renúncia quaresmal (neste, como em outros anos) tem sido para a construção de edifícios e infra-estruturas eclesiais.
Sei que muitos deles são fora de Portugal, tal como de novo sucede este ano. Em vários casos, os beneficiados são os cristãos e as igrejas dos países lusófonos, aos quais nos ligam laços de história e fraternidade. Admita-se, portanto, que a renúncia quaresmal sai de casa, para utilizar a expressão do padre Armindo. Sai, sai de casa. Mas é, ainda, a nossa família alargada que dela beneficia.
Serve a Quaresma, ainda, para alguma coisa? Interpela-nos o autêntico sentido da Páscoa? O que defendo, então? Que um verdadeiro espírito de partilha concretizado através da renúncia quaresmal deve beneficiar quem não tem que comer, quem se viu privado de casa por alguma tragédia natural, quem não tem emprego. Deve optar, antes, por apoiar o que possam ser projectos de desenvolvimento que beneficiem as pessoas e não apenas infra-estruturas. Há milhões de pessoas no mundo sem nada, à espera de poder beneficiar do progresso de que nós já beneficiamos. Milhões de pessoas que desejam, apenas, construir a sua vida. Enquanto nós optamos por ajudar a construir paredes.
António Marujo, Jornalista
segunda-feira, 11 de fevereiro de 2008
Na Linha Da Utopia
Não é “mais um” doente
1. Celebrar-se o Dia Mundial do Doente a 11 de Fevereiro de cada ano, é oportunidade para reflectirmos sobre esta sensível realidade. Doentes todos já o fomos, somos ou seremos. É por isso que sempre teremos de falar na primeira pessoa e com tal sensibilidade que de pouco valem as frases feitas, decoradas ou as receitas pré-elaboradas. O facto de cada pessoa ser um mundo aplica-se de forma explícita neste terreno da limitada condição humana. Falar de doença ou sofrimento, mais que teorias, será falar de pessoas doentes, em que todo o aconchego colaborante será bem-vindo ao necessário alívio possível e conforto em horas e dias tão difíceis.
2. Não pretendemos falar dos cuidados paliativos, das receitas clínicas, de toda a gama diversificada dos cuidados de saúde. Interessa-nos compreender o que está antes e que dá razão de ser às comunidades hospitalares ou a uma sociedade que deve colocar os mais frágeis no centro das suas preocupações. O modo como compreendemos, cooperamos e agimos para com as pessoas doentes (estamos sempre na primeira pessoa) será o modelo de sociedade que procuramos como ideal. E neste patamar, todas as ajudas serão bem vindas, da ordem das dores físicas até à ordem da paz de espírito. Não compreender isto será desfocar não servindo a Pessoa.
3. Se todas as políticas sempre terão de colocar as pessoas acima de tudo, então em quadrantes como a saúde esse centro de referência merecerá a máxima atenção, em área onde cada momento de tempo, sempre único, pode ser fatal. Talvez na vida das sociedades esta seja mesmo uma da áreas mais sensíveis onde, pelo cuidado minucioso, não pudesse haver ninguém que trabalhasse na saúde por qualquer outro interesse que não fosse uma clara VOCAÇÃO de serviço às pessoas na sua condição de fragilidade. A este respeito, os tempos parecem difíceis. Sem pretendermos generalizar, muitos negócios da saúde são escandalosos; ainda há dias falava-se dos milhões dos transplantes (Visão, 7 Fev.).
4. Felizmente que hoje vai sendo caminho aberto das comunidades hospitalares o saber-se acolher todas as ajudas que, no respeito pela livre consciência, podem garantir serenidade exterior e interior às pessoas doentes. Afinal, que outra função dos estados senão o garantir e mesmo promover este terreno de liberdade? As comunidades hospitalares, acolhedoras do pluralismo dos seus utentes (que são acima de tudo) PESSOAS, assim, abrem-se à totalidade da humanidade daqueles que lá passam os “momentos” da sensibilizada fronteira do sofrimento. Nessa hora, venha toda a força, toda a paz, toda a sensibilidade, toda a presença, todas as palavras mesmo que no silêncio!
Alexandre Cruz
1. Celebrar-se o Dia Mundial do Doente a 11 de Fevereiro de cada ano, é oportunidade para reflectirmos sobre esta sensível realidade. Doentes todos já o fomos, somos ou seremos. É por isso que sempre teremos de falar na primeira pessoa e com tal sensibilidade que de pouco valem as frases feitas, decoradas ou as receitas pré-elaboradas. O facto de cada pessoa ser um mundo aplica-se de forma explícita neste terreno da limitada condição humana. Falar de doença ou sofrimento, mais que teorias, será falar de pessoas doentes, em que todo o aconchego colaborante será bem-vindo ao necessário alívio possível e conforto em horas e dias tão difíceis.
2. Não pretendemos falar dos cuidados paliativos, das receitas clínicas, de toda a gama diversificada dos cuidados de saúde. Interessa-nos compreender o que está antes e que dá razão de ser às comunidades hospitalares ou a uma sociedade que deve colocar os mais frágeis no centro das suas preocupações. O modo como compreendemos, cooperamos e agimos para com as pessoas doentes (estamos sempre na primeira pessoa) será o modelo de sociedade que procuramos como ideal. E neste patamar, todas as ajudas serão bem vindas, da ordem das dores físicas até à ordem da paz de espírito. Não compreender isto será desfocar não servindo a Pessoa.
3. Se todas as políticas sempre terão de colocar as pessoas acima de tudo, então em quadrantes como a saúde esse centro de referência merecerá a máxima atenção, em área onde cada momento de tempo, sempre único, pode ser fatal. Talvez na vida das sociedades esta seja mesmo uma da áreas mais sensíveis onde, pelo cuidado minucioso, não pudesse haver ninguém que trabalhasse na saúde por qualquer outro interesse que não fosse uma clara VOCAÇÃO de serviço às pessoas na sua condição de fragilidade. A este respeito, os tempos parecem difíceis. Sem pretendermos generalizar, muitos negócios da saúde são escandalosos; ainda há dias falava-se dos milhões dos transplantes (Visão, 7 Fev.).
4. Felizmente que hoje vai sendo caminho aberto das comunidades hospitalares o saber-se acolher todas as ajudas que, no respeito pela livre consciência, podem garantir serenidade exterior e interior às pessoas doentes. Afinal, que outra função dos estados senão o garantir e mesmo promover este terreno de liberdade? As comunidades hospitalares, acolhedoras do pluralismo dos seus utentes (que são acima de tudo) PESSOAS, assim, abrem-se à totalidade da humanidade daqueles que lá passam os “momentos” da sensibilizada fronteira do sofrimento. Nessa hora, venha toda a força, toda a paz, toda a sensibilidade, toda a presença, todas as palavras mesmo que no silêncio!
Alexandre Cruz
“FILIPA DE LENCASTRE – A rainha que mudou Portugal”
“FILIPA DE LENCASTRE – A rainha que mudou Portugal” é um romance histórico de Isabel Stilwell, jornalista e escritora, de ascendência inglesa. Pela leitura desta obra, que se apoiou em muita investigação, percebe-se o entusiasmo com que Isabel Stilwell trabalhou. Era preciso, como a personalidade da rainha que mudou Portugal exigia, escrever um texto com o rigor histórico possível, mais de seiscentos anos depois dos factos relatados. Um romance histórico não tem que seguir, rigorosamente, os pormenores que um tratado científico merece e exige. No entanto, como li algures, há anos, para se conhecer a vida do povo de uma época, nada melhor do que um romance.
Quem gosta de história, em especial quem estudou História de Portugal, tem neste livro uma excelente oportunidade para se deliciar com um romance, cujas personagens são conhecidas. Uma rainha culta e de personalidade forte, mãe da “Ínclita geração; altos infantes”, no dizer de Camões, rigorosa e cuidadosa com a educação dos seus filhos, mas ainda de seu marido, Filipa de Lencastre moralizou os (maus) hábitos da corte.
À medida que as páginas corriam, fui recordando factos e pessoas da história que a minha memória tinha atirado já para uma gaveta, cenas que na minha juventude me encantaram, projectos e heróis que ajudaram a construir o Portugal de hoje e que andam muito esquecidos.
O livro está dividido em duas partes: “Philippa, Princesa de Inglaterra” e “Filipa, Rainha de Portugal”. Dois países e dois povos de muitos contrastes, com a protagonista desta obra a reflectir e a agir em conformidade com a sua educação e formação religiosa, alicerçadas numa sensibilidade muito delicada, que procurou incutir em quantos a rodeavam e serviam, nomeadamente os seus descendentes. Quem gostar de ler tem aqui uma boa oportunidade para ocupar, de forma diferente, os tempos livres.
FM
domingo, 10 de fevereiro de 2008
MUNDIAL DE FUTEBOL: PRESIDENTE DA REPÚBLICA PEDE CALMA
Cavaco Silva diz que Portugal tem "outras prioridades", para além da organização do Mundial 2018 de Futebol. O nosso País precisa, de facto, de pessoas com o sentido das responsabilidades.
A ideia anda no ar. Gilberto Madail terá avançado com a ideia de uma candidatura conjunta, com a Espanha, ao Mundial de Futebol de 2018. Os portugueses até parece que se esqueceram já do EURO 2004, que levou Portugal a construir, com clubes e autarquias, estádios de futebol que estão, agora, às moscas.
Num País quase sempre em crise, com milhares de portugueses em dificuldades, não nos podemos dar ao luxo de andar a pensar em projectos megalómanos, que trariam, é certo, prestígio a Portugal, mas que tirariam o lugar a outros mais urgentes.
FM
A ideia anda no ar. Gilberto Madail terá avançado com a ideia de uma candidatura conjunta, com a Espanha, ao Mundial de Futebol de 2018. Os portugueses até parece que se esqueceram já do EURO 2004, que levou Portugal a construir, com clubes e autarquias, estádios de futebol que estão, agora, às moscas.
Num País quase sempre em crise, com milhares de portugueses em dificuldades, não nos podemos dar ao luxo de andar a pensar em projectos megalómanos, que trariam, é certo, prestígio a Portugal, mas que tirariam o lugar a outros mais urgentes.
FM
Golfinhos nos Açores
Ontem recebi esta foto do mar dos Açores. De inédito tem o facto de registar a passagem, rara nesta altura do ano, de golfinhos, ao largo da ilha de S. Jorge. Causou espanto, mas houve a calma suficiente para registar a presença dos golfinhos em tranquila passagem de passeio pelas ilhas açorianas. Eles lá iam, serenos, rumo a paragens que só os próprios conheciam.
RIA DE AVEIRO
Lagoa com vista para o mar
É uma grande lagoa costeira, com 45 km de extensão no sentido norte-sul (de Ovar aos arredores de Vagos) e 12 no sentido leste-oeste. Dos 11 000 hectares deste sistema lagunar, cerca de metade é afectado pelas marés, tendo a sua vegetação grande importância ecológica. Apesar do declínio da extracção do sal, ainda há um milhar de hectares ocupado por salinas. No Outono, grande número de aves migratórias passa por aqui. A comunicação da Ria com o mar faz-se perto da cidade de Aveiro, através da Barra Nova, aberta em 1808.
É uma grande lagoa costeira, com 45 km de extensão no sentido norte-sul (de Ovar aos arredores de Vagos) e 12 no sentido leste-oeste. Dos 11 000 hectares deste sistema lagunar, cerca de metade é afectado pelas marés, tendo a sua vegetação grande importância ecológica. Apesar do declínio da extracção do sal, ainda há um milhar de hectares ocupado por salinas. No Outono, grande número de aves migratórias passa por aqui. A comunicação da Ria com o mar faz-se perto da cidade de Aveiro, através da Barra Nova, aberta em 1808.
In PÚBLICO de hoje
NOTA: O acesso faz-se pela A25, direcção Aveiro e Praias. Foto do meu arquivo.
IMPORTA DESCOBRIR AS SUGESTÕES DE DEUS
"Aprender a viver é aprender a morrer a tudo o que nos estraga sob o ponto de vista intelectual, afectivo e social. Os 40 dias da Quaresma são uma bênção. Um tempo de retiro destinado a aprender a resistir à tirania diabólica da publicidade que nos impõe modelos de vida e de organização económica, social, política, cultural, religiosa e irreligiosa, a nível local e global, pessoal e familiar. Um tempo para a descoberta do que é essencial, supérfluo e prejudicial. Um tempo para descobrir as sugestões de Deus, dentro e fora de nós"
Frei Bento Domingues,
in PÚBLICO de hoje
TECENDO A VIDA UMAS COISITAS - 64
DO ENSINO NA GAFANHA
Caríssima/o:
E perguntava-se: «E na Gafanha como seria?»
Como resposta apreciemos esta série de retratos, todos eles carregados de cores muito intensas. Seu autor, o P. João Vieira Resende, aproveitou a «Monografia da Gafanha» para os revelar nas páginas 105 e 106.
«Foi bem acentuado e característico o seu estado de atraso. Quantas vezes para escalpelizar em alguém uma grosseria, uma incorrecção, ou um deslise, se empregava, ou emprega ainda [1944], a apóstrofe:”És um gafanhão!”, como se dissesse:”És um ignorante!”. A frase diz tudo!...
«Concorreu também a Gafanha com o seu pesado contingente para que Portugal, em face das estatísticas oficiais, tenha passado, com verdade, no conceito dos povos e nações civilizadas, como sendo uma das mais atrasadas [...com] legiões e autênticos povoados de analfabetos.
«A Gafanha, tão distanciada dos centros escolares e da instrução, a muitos quilómetros de Aveiro, Ílhavo e Vagos, sem meios de comunicação, reduzindo assim os seus habitantes à crítica situação de uma vida de primários, deveria com toda a justiça, ser olhada com mais atenção, carinho e amor. No entanto não foi assim. Só tarde, mesmo muito tarde, se pensou alguma coisa nesta triste situação.
Caríssima/o:
E perguntava-se: «E na Gafanha como seria?»
Como resposta apreciemos esta série de retratos, todos eles carregados de cores muito intensas. Seu autor, o P. João Vieira Resende, aproveitou a «Monografia da Gafanha» para os revelar nas páginas 105 e 106.
«Foi bem acentuado e característico o seu estado de atraso. Quantas vezes para escalpelizar em alguém uma grosseria, uma incorrecção, ou um deslise, se empregava, ou emprega ainda [1944], a apóstrofe:”És um gafanhão!”, como se dissesse:”És um ignorante!”. A frase diz tudo!...
«Concorreu também a Gafanha com o seu pesado contingente para que Portugal, em face das estatísticas oficiais, tenha passado, com verdade, no conceito dos povos e nações civilizadas, como sendo uma das mais atrasadas [...com] legiões e autênticos povoados de analfabetos.
«A Gafanha, tão distanciada dos centros escolares e da instrução, a muitos quilómetros de Aveiro, Ílhavo e Vagos, sem meios de comunicação, reduzindo assim os seus habitantes à crítica situação de uma vida de primários, deveria com toda a justiça, ser olhada com mais atenção, carinho e amor. No entanto não foi assim. Só tarde, mesmo muito tarde, se pensou alguma coisa nesta triste situação.
«Quando outras povoações, com menos direitos, já eram beneficiadas com escolas e instrução, a Gafanha ficava sempre na retaguarda, entregue a um aturado esquecimento, a um criminoso enquistamento cerebral.
«Até 1880, toda a Gafanha, com um povoamento denso, não tinha uma única escola, e desta data até 1908 só funcionava a escola de 1880, que durante aquele período servia pessimamente, pela sua deslocação, toda a Gafanha ocidental, ou seja as actuais freguesias da Nazaré e da Encarnação e a Gafanha da Boa-Hora (Vagos), numa longitude marginal de cerca de cinco léguas. Era um horror! Já tarde, em 1908, criou-se a segunda escola na Boa-Hora, também afastada e menos necessitada, visto ficar no outro extremo sul da Gafanha, que era e é menos povoada.
«Em 1909 é criada finalmente a terceira escola da Gafanha, na Encarnação, que desta vez ficou mais central[...].
«Mas até esta data, que penúria, que miséria na instrução destes povos!
Foi uma eternidade de obscurantismo naqueles cérebros. [...]
«Erros da política do tempo, retemperada no caciquismo e no favoritismo, dos quais os povos eram sempre o bode expiatório.»
Como se está a ver, a situação não era nada famosa..
Mas continuaremos..
Manuel
«Mas até esta data, que penúria, que miséria na instrução destes povos!
Foi uma eternidade de obscurantismo naqueles cérebros. [...]
«Erros da política do tempo, retemperada no caciquismo e no favoritismo, dos quais os povos eram sempre o bode expiatório.»
Como se está a ver, a situação não era nada famosa..
Mas continuaremos..
Manuel
Na Linha Da Utopia
A juventude da Parvónia
1. Mesmo após a polémica, tudo continua na mesma. E a certa altura já nem se sabe como reagir ao mau gosto que vai crescendo de forma desmedida. O assunto é a campanha, diga-se sem jeito nem inteligência, da “parvónia” chamada Media Markt. A conclusão da história publicitada, após um arranjo que leva ao ridículo um chefe militar e um escuteiro, é que quem é “parvo” é que não vai ao Media Markt. Enfim, para além da pobreza da qualidade do anúncio, já há muita gente a dizer precisamente o contrário…
2. O ditado diz que «quem não sente não é filho de boa gente». Sabemos como são as coisas. Entre o silêncio do não ligar ao assunto (esta a receita dos tempos indiferentes), ou a coragem de dar uma “pedrada no charco”, correndo o perigo das múltiplas interpretações, até de exagero, a Junta Central do CNE emitiu um comunicado, apelando ao bom senso ético. O parvo anúncio coloca o jovem escuteiro oriundo, imigrado (emigrante?), do país Parvónia no cenário mais ridículo…
3. Após o corajoso comunicado da Junta Central (sabendo que correria o perigo das análises habitualmente passivas de “estar a dar importância demasiada ao assunto”), CNE que neste país pela “escola de vida” do Escutismo procura realizar um ideal de trabalho sério com mais 70 mil jovens portugueses, a resposta do Media Markt (do seu country manager!), aliviando a coisa, não deixa de nos dar dois sinais: 1º, que a aparvalhada figura do escuteiro pretendia «representar a juventude» portuguesa; 2º, que só os escuteiros ficaram ofendidos, pois «nenhuma associação de militares nos contactou» (bom, o papel do militar não desce à figura do jovem).
4. O que vale é que os jovens já se estão pouco importando com o que deles dizem, senão!... Indiferentes, no “porreirismo” do deixa andar que vão copiando pelas referências sociais, já comem tudo… É de saudar a Junta Central do CNE, que fala em nome das instituições se viram, vêem ou verão, expostos a um ridículo anestesiador dos padrões de dignidade e qualidade de uma sociedade. Quem sabe esta (ex)posição do CNE tenha sido um contributo para os próximos anúncios que, para garantir a polémica que vende, colocariam figuras de estado nessa parvónia…(Talvez aí a coisa mudasse!) E depois queixamo-nos dos medos do futuro!
Alexandre Cruz
1. Mesmo após a polémica, tudo continua na mesma. E a certa altura já nem se sabe como reagir ao mau gosto que vai crescendo de forma desmedida. O assunto é a campanha, diga-se sem jeito nem inteligência, da “parvónia” chamada Media Markt. A conclusão da história publicitada, após um arranjo que leva ao ridículo um chefe militar e um escuteiro, é que quem é “parvo” é que não vai ao Media Markt. Enfim, para além da pobreza da qualidade do anúncio, já há muita gente a dizer precisamente o contrário…
2. O ditado diz que «quem não sente não é filho de boa gente». Sabemos como são as coisas. Entre o silêncio do não ligar ao assunto (esta a receita dos tempos indiferentes), ou a coragem de dar uma “pedrada no charco”, correndo o perigo das múltiplas interpretações, até de exagero, a Junta Central do CNE emitiu um comunicado, apelando ao bom senso ético. O parvo anúncio coloca o jovem escuteiro oriundo, imigrado (emigrante?), do país Parvónia no cenário mais ridículo…
3. Após o corajoso comunicado da Junta Central (sabendo que correria o perigo das análises habitualmente passivas de “estar a dar importância demasiada ao assunto”), CNE que neste país pela “escola de vida” do Escutismo procura realizar um ideal de trabalho sério com mais 70 mil jovens portugueses, a resposta do Media Markt (do seu country manager!), aliviando a coisa, não deixa de nos dar dois sinais: 1º, que a aparvalhada figura do escuteiro pretendia «representar a juventude» portuguesa; 2º, que só os escuteiros ficaram ofendidos, pois «nenhuma associação de militares nos contactou» (bom, o papel do militar não desce à figura do jovem).
4. O que vale é que os jovens já se estão pouco importando com o que deles dizem, senão!... Indiferentes, no “porreirismo” do deixa andar que vão copiando pelas referências sociais, já comem tudo… É de saudar a Junta Central do CNE, que fala em nome das instituições se viram, vêem ou verão, expostos a um ridículo anestesiador dos padrões de dignidade e qualidade de uma sociedade. Quem sabe esta (ex)posição do CNE tenha sido um contributo para os próximos anúncios que, para garantir a polémica que vende, colocariam figuras de estado nessa parvónia…(Talvez aí a coisa mudasse!) E depois queixamo-nos dos medos do futuro!
Alexandre Cruz
sábado, 9 de fevereiro de 2008
MANUEL ALEGRE: VOZ CRÍTICA DENTRO DO PS
Manuel Alegre, um histórico do PS, está descontente com a política protagonizada pelo seu partido. Hoje, num encontro com apoiantes ligados à sua candidatura a Presidente da República, à revelia e mesmo contra o candidato do seu partido, Mário Soares, denunciou a política actual. Presentemente, é um crítico contundente da política de Sócrates, mostrando esse descontentamento a todo o momento.
À saída do encontro, afirmou que, até hoje, ainda não compreendeu a política levada a cabo pelo Governo do PS. E acrescentou: “Não se pode fechar coisas sem criar alternativas, além de que fechar serviços públicos em zonas do país onde não existe mais nada é deixar as pessoas com menos do que nada e numa situação de abandono, de aflição, e com a sensação de que foram desprotegidas e abandonadas pelo Estado democrático.”
Depois deixou recados. Para o seu partido e para o País: É preciso refrescar a democracia; o povo português está triste; não há debate no PS; é necessário reformar o sistema; os partidos não se regeneram com facilidade por dentro; há um buraco negro no partido [PS], na democracia e no País. Claro que não é só o PS o culpado. O sistema [onde é que eu ouvi isto?] já vem de trás!
Será que os nossos políticos andam cegos? É que não vêem a realidade do povo português, que vive numa angústia terrível, alimentada pela incerteza do amanhã.
FM
À saída do encontro, afirmou que, até hoje, ainda não compreendeu a política levada a cabo pelo Governo do PS. E acrescentou: “Não se pode fechar coisas sem criar alternativas, além de que fechar serviços públicos em zonas do país onde não existe mais nada é deixar as pessoas com menos do que nada e numa situação de abandono, de aflição, e com a sensação de que foram desprotegidas e abandonadas pelo Estado democrático.”
Depois deixou recados. Para o seu partido e para o País: É preciso refrescar a democracia; o povo português está triste; não há debate no PS; é necessário reformar o sistema; os partidos não se regeneram com facilidade por dentro; há um buraco negro no partido [PS], na democracia e no País. Claro que não é só o PS o culpado. O sistema [onde é que eu ouvi isto?] já vem de trás!
Será que os nossos políticos andam cegos? É que não vêem a realidade do povo português, que vive numa angústia terrível, alimentada pela incerteza do amanhã.
FM
FÁTIMA COM MAIS PEREGRINOS
FÁTIMA COM MAIS PEREGRINOS
Quatro milhões e 800 mil pessoas participaram no ano passado nas várias celebrações no Santuário de Fátima. Os números foram revelados esta Quinta-feira, mostrando um aumento de 600 mil pessoas em relação a 2006.
O aumento também se verificou nas peregrinações oficiais, um total de 3909, das quais 1344 portugueses e 2565 oriundas do estrangeiro.
O Santuário recebeu peregrinações de 74 países, verificando-se um grande crescimento nos peregrinos vindos de países de Leste. Outros países que apresentam maior crescimento em número de peregrinos são o Brasil e a Coreia do Sul. Itália, Polónia, EUA e Espanha continuam a ser os principais países de origem.
A inauguração da nova igreja da Santíssima Trindade, em Outubro do ano passado, foi um dos momentos altos de 2007, reunindo milhares de pessoas em volta do Cardeal Tarcisio Bertone, Secretário de Estado do Vaticano e legado pontifício de Bento XVI para o encerramento das comemorações dos 90 anos das Aparições.
Os fiéis que participaram em 2526 missas oficiais foram 4milhões e 191 mil, a que se somam 689 mil em missas particulares. Comparativamente com o ano anterior houve mais 600 mil fiéis nestas celebrações.
O Serviço de Peregrinos registou também os números de outras celebrações oficiais, como o Rosário e outras celebrações paralitúrgicas. Houve 1403 celebrações oficiais tendo participado 3 milhões e 893 mil pessoas, quase mais um milhão do que em 2006.
Fonte: Ecclesia
Quatro milhões e 800 mil pessoas participaram no ano passado nas várias celebrações no Santuário de Fátima. Os números foram revelados esta Quinta-feira, mostrando um aumento de 600 mil pessoas em relação a 2006.
O aumento também se verificou nas peregrinações oficiais, um total de 3909, das quais 1344 portugueses e 2565 oriundas do estrangeiro.
O Santuário recebeu peregrinações de 74 países, verificando-se um grande crescimento nos peregrinos vindos de países de Leste. Outros países que apresentam maior crescimento em número de peregrinos são o Brasil e a Coreia do Sul. Itália, Polónia, EUA e Espanha continuam a ser os principais países de origem.
A inauguração da nova igreja da Santíssima Trindade, em Outubro do ano passado, foi um dos momentos altos de 2007, reunindo milhares de pessoas em volta do Cardeal Tarcisio Bertone, Secretário de Estado do Vaticano e legado pontifício de Bento XVI para o encerramento das comemorações dos 90 anos das Aparições.
Os fiéis que participaram em 2526 missas oficiais foram 4milhões e 191 mil, a que se somam 689 mil em missas particulares. Comparativamente com o ano anterior houve mais 600 mil fiéis nestas celebrações.
O Serviço de Peregrinos registou também os números de outras celebrações oficiais, como o Rosário e outras celebrações paralitúrgicas. Houve 1403 celebrações oficiais tendo participado 3 milhões e 893 mil pessoas, quase mais um milhão do que em 2006.
Fonte: Ecclesia
O CARDEAL TETTAMANZI E OS CATÓLICOS DIVORCIADOS
Há anos, no aeroporto de Lisboa, uma senhora que eu não conhecia de lado nenhum aproximou-se para me dizer delicadamente, num quase agradecimento, que se tinha divorciado, com o meu contributo.
"Como?!...", atirei-lhe eu, perplexo. E ela: que eu tinha feito uma conferência - era verdade - e tinha dito que ninguém deveria ser obrigado a viver no inferno e ela vivia num inferno e, com aquelas minhas palavras, arranjara coragem.
De outra vez, ia a entrar para uma conferência, e um casal disse-me à queima-roupa: "Obrigados pelo que escreveu sobre os católicos divorciados e recasados!"
Nós nunca sabemos quais são exactamente as consequências, boas e más, do que dizemos ou escrevemos. Mais uma razão para se procurar a verdade e a honestidade!
Há dias, um outro casal intimou-me: "Viu aquelas declarações de um cardeal sobre os divorciados? Escreva qualquer coisa sobre isso."
Eu pensava que as pessoas eram mais ou menos indiferentes ao facto de a Igreja proibir a comunhão aos católicos que se divorciam e voltam a casar. Mas fui-me apercebendo de que não é assim. Quando permanecem ligadas à Igreja, é doloroso. Para quem não será doloroso, em qualquer situação, sentir-se excluído? À distância, é fácil ver que muitos, homens e mulheres, seguiram Jesus, fascinados, porque ele incluía no Reino de Deus - o Reino de Deus é, numa primeira instância, "uma vida mais digna e feliz para todos" (J. A. Pagola) - aqueles e aquelas que a sociedade e a religião oficial excluíam. O teólogo Edward Schillebeeckx pergunta algures sobre a alegria de um marginalizado convidado por alguém significativo para "tomar um copo". Ora, Jesus sentou-se à mesa - um sinal da presença do Messias de Deus -- com os pecadores públicos, as prostitutas, os pobres, aqueles e aquelas que a vida excluiu. A alegria deles foi sem nome.
Agora, o arcebispo de Milão, cardeal Dionigi Tettamanzi, numa carta pastoral que tem por título "O Senhor está perto de quem tem o coração ferido", reconheceu que a Igreja Católica "descuidou e ignorou" os separados e divorciados. A Igreja não esteve atenta aos seus "sofrimentos". Assim, Tettamanzi exprime-lhes o seu "pesar", se encontraram homens ou mulheres da comunidade cristã que "de algum modo os tenham ferido", "julgado sem misericórdia" ou "condenado".
Lê-se na carta: "A Igreja sabe que em certos casos não só é lícito, mas inevitável, tomar a decisão de uma separação. Para defender a dignidade da pessoa, evitar traumas profundos e salvaguardar a grandeza do matrimónio, que não pode transformar-se num rosário insustentável de ataques e ferimentos mútuos." Por isso, a Igreja não os "julga" nem os "olha como estranhos que faltaram a um pacto; pelo contrário, sente-se participante das necessidades que os tocam intimamente".
Assim, faz-lhes um apelo para que não abandonem a Igreja: "Também de vós a Igreja espera uma presença activa", e convida-os, concretamente, a "participar com fé na Missa".
Mas cá está! Continua a proibição de acederem à comunhão. Ora, é precisamente esta exclusão que faz problema. De facto, é como alguém ser convidado para um banquete e, depois, não lhe ser permitido comer e participar.
Objectar-se-á que a Igreja tem de ser fiel à doutrina. Eu diria que é evidente que há o ideal de um casamento indissolúvel e fiel e de uma família estável, a promover também pelo Estado. Aliás, em princípio, quem se casa não leva consigo, à partida, o subterfúgio do divórcio, que implica imenso sofrimento para os cônjuges e sobretudo para as crianças. Mas também há a vida na sua realidade tantas vezes crua, como reconhece o cardeal.
Sem culpa, com culpa de um ou do outro ou dos dois, por vezes, "a separação é lícita e inevitável".
Quando já não há amor, já não são aquele e aquela que se conheceram e amaram. O tempo mudou-os.
Se, depois, em dignidade e na responsabilidade, refizeram a vida num novo casamento, deverá a Igreja, lembrando-se de Jesus, o da inclusão, manter para todos, definitivamente, a exclusão da comunhão?
"Como?!...", atirei-lhe eu, perplexo. E ela: que eu tinha feito uma conferência - era verdade - e tinha dito que ninguém deveria ser obrigado a viver no inferno e ela vivia num inferno e, com aquelas minhas palavras, arranjara coragem.
De outra vez, ia a entrar para uma conferência, e um casal disse-me à queima-roupa: "Obrigados pelo que escreveu sobre os católicos divorciados e recasados!"
Nós nunca sabemos quais são exactamente as consequências, boas e más, do que dizemos ou escrevemos. Mais uma razão para se procurar a verdade e a honestidade!
Há dias, um outro casal intimou-me: "Viu aquelas declarações de um cardeal sobre os divorciados? Escreva qualquer coisa sobre isso."
Eu pensava que as pessoas eram mais ou menos indiferentes ao facto de a Igreja proibir a comunhão aos católicos que se divorciam e voltam a casar. Mas fui-me apercebendo de que não é assim. Quando permanecem ligadas à Igreja, é doloroso. Para quem não será doloroso, em qualquer situação, sentir-se excluído? À distância, é fácil ver que muitos, homens e mulheres, seguiram Jesus, fascinados, porque ele incluía no Reino de Deus - o Reino de Deus é, numa primeira instância, "uma vida mais digna e feliz para todos" (J. A. Pagola) - aqueles e aquelas que a sociedade e a religião oficial excluíam. O teólogo Edward Schillebeeckx pergunta algures sobre a alegria de um marginalizado convidado por alguém significativo para "tomar um copo". Ora, Jesus sentou-se à mesa - um sinal da presença do Messias de Deus -- com os pecadores públicos, as prostitutas, os pobres, aqueles e aquelas que a vida excluiu. A alegria deles foi sem nome.
Agora, o arcebispo de Milão, cardeal Dionigi Tettamanzi, numa carta pastoral que tem por título "O Senhor está perto de quem tem o coração ferido", reconheceu que a Igreja Católica "descuidou e ignorou" os separados e divorciados. A Igreja não esteve atenta aos seus "sofrimentos". Assim, Tettamanzi exprime-lhes o seu "pesar", se encontraram homens ou mulheres da comunidade cristã que "de algum modo os tenham ferido", "julgado sem misericórdia" ou "condenado".
Lê-se na carta: "A Igreja sabe que em certos casos não só é lícito, mas inevitável, tomar a decisão de uma separação. Para defender a dignidade da pessoa, evitar traumas profundos e salvaguardar a grandeza do matrimónio, que não pode transformar-se num rosário insustentável de ataques e ferimentos mútuos." Por isso, a Igreja não os "julga" nem os "olha como estranhos que faltaram a um pacto; pelo contrário, sente-se participante das necessidades que os tocam intimamente".
Assim, faz-lhes um apelo para que não abandonem a Igreja: "Também de vós a Igreja espera uma presença activa", e convida-os, concretamente, a "participar com fé na Missa".
Mas cá está! Continua a proibição de acederem à comunhão. Ora, é precisamente esta exclusão que faz problema. De facto, é como alguém ser convidado para um banquete e, depois, não lhe ser permitido comer e participar.
Objectar-se-á que a Igreja tem de ser fiel à doutrina. Eu diria que é evidente que há o ideal de um casamento indissolúvel e fiel e de uma família estável, a promover também pelo Estado. Aliás, em princípio, quem se casa não leva consigo, à partida, o subterfúgio do divórcio, que implica imenso sofrimento para os cônjuges e sobretudo para as crianças. Mas também há a vida na sua realidade tantas vezes crua, como reconhece o cardeal.
Sem culpa, com culpa de um ou do outro ou dos dois, por vezes, "a separação é lícita e inevitável".
Quando já não há amor, já não são aquele e aquela que se conheceram e amaram. O tempo mudou-os.
Se, depois, em dignidade e na responsabilidade, refizeram a vida num novo casamento, deverá a Igreja, lembrando-se de Jesus, o da inclusão, manter para todos, definitivamente, a exclusão da comunhão?
sexta-feira, 8 de fevereiro de 2008
Figuras da nossa terra
Manel da Raquel
Falando com pessoa amiga de figuras típicas da Gafanha, logo veio à baila o Manel da Raquel. Se fosse vivo, teria agora 68 anos. Durante a conversa, logo nos lembrámos da simpatia com que era acolhido por toda a comunidade. Era um deficiente mental, mas conseguia reconhecer as pessoas e até articulava algumas palavras e dizia curtíssimas frases. Era prestável, quando lhe apetecia, e vivia muito à volta da igreja matriz, onde participava nas principais missas, funerais e outras cerimónias, sem causar qualquer distúrbio. Quem ficasse ao lado dele, podia ouvir como ele, imitando as pessoas, sussurrava monossílabos ininteligíveis, de resposta ao celebrante. Eram mais sons do que palavras. E ali estava, na cerimónia, sentado, ajoelhado ou de pé, como qualquer participante.
Depois, andava de café em café a encontrar-se com os amigos, ajudando, se estivesse em dia disso, um ou outro, em tarefas simples. Não havia ninguém que não lhe dirigisse a palavra, à qual ele respondia, habitualmente, com alegria. Às vezes, irritavam-no, sem qualquer razão, mas, no fundo, todos gostavam do Manel da Raquel. Raquel era sua mãe, que muito sofreu para tratar de dois filhos deficientes.
O Manel utilizava os autocarros da Auto Viação Aveirense, entrando e saindo quando lhe apetecesse. Sempre ouvindo e respondendo às brincadeiras dos amigos e conhecidos. E até ia, com frequência, ver o seu Beira-Mar, ao estádio Mário Duarte, onde tinha sempre a porta franqueada. Era de todos conhecido e por muitos respeitado e ajudado. Nunca me lembro de o ter visto mal vestido ou sujo, salvo quando, pela força das circunstâncias, não sabia evitar a sujidade.
De quando em vez, fazia de sinaleiro, junto à igreja, quando pressentia que a manobra estava difícil. E um dia, conta-se, tantas ordens deu que o condutor, que não o conhecia, avançou, provocando um choque com outro veículo. Perante os protestos do confiante condutor, respondeu, com alguma graça: “é preciso ter olhinhos; é preciso ter olhinhos!”
No Timoneiro de Setembro/Outubro de 1977, tinha ele 38 anos, noticia-se, em artigo do Padre Miguel Lencastre, ao tempo prior da Gafanha da Nazaré, que a mãe do Manel faleceu no dia 30 de Outubro, tendo-se realizado o funeral no dia 1 de Novembro. A missa do funeral celebrou-se no cemitério, com a participação de toda a gente que ali recordava os seus mortos. No momento da colecta, o Padre Miguel fez um apelo à população para que contribuísse com os seus donativos, porque era urgente ajudar o Manel e seu irmão Carlos, também deficiente. Depois foi o arranjo da pobre habitação, dando-lhe melhores condições de habitabilidade.
Anos mais tarde, o Manel foi acolhido por um irmão, na Gafanha da Encarnação. E nunca mais apareceu nos sítios do costume. Houve, certamente, razões para isso. Morreu passado algum tempo. E não faltou quem dissesse que tal se ficou a dever ao facto de o Manel da Raquel ter saído do seu ambiente natural. Penso que não. O que importa, neste momento, é recordar esta figura típica da nossa terra, de quem todos gostavam.
Fernando Martins
Falando com pessoa amiga de figuras típicas da Gafanha, logo veio à baila o Manel da Raquel. Se fosse vivo, teria agora 68 anos. Durante a conversa, logo nos lembrámos da simpatia com que era acolhido por toda a comunidade. Era um deficiente mental, mas conseguia reconhecer as pessoas e até articulava algumas palavras e dizia curtíssimas frases. Era prestável, quando lhe apetecia, e vivia muito à volta da igreja matriz, onde participava nas principais missas, funerais e outras cerimónias, sem causar qualquer distúrbio. Quem ficasse ao lado dele, podia ouvir como ele, imitando as pessoas, sussurrava monossílabos ininteligíveis, de resposta ao celebrante. Eram mais sons do que palavras. E ali estava, na cerimónia, sentado, ajoelhado ou de pé, como qualquer participante.
Depois, andava de café em café a encontrar-se com os amigos, ajudando, se estivesse em dia disso, um ou outro, em tarefas simples. Não havia ninguém que não lhe dirigisse a palavra, à qual ele respondia, habitualmente, com alegria. Às vezes, irritavam-no, sem qualquer razão, mas, no fundo, todos gostavam do Manel da Raquel. Raquel era sua mãe, que muito sofreu para tratar de dois filhos deficientes.
O Manel utilizava os autocarros da Auto Viação Aveirense, entrando e saindo quando lhe apetecesse. Sempre ouvindo e respondendo às brincadeiras dos amigos e conhecidos. E até ia, com frequência, ver o seu Beira-Mar, ao estádio Mário Duarte, onde tinha sempre a porta franqueada. Era de todos conhecido e por muitos respeitado e ajudado. Nunca me lembro de o ter visto mal vestido ou sujo, salvo quando, pela força das circunstâncias, não sabia evitar a sujidade.
De quando em vez, fazia de sinaleiro, junto à igreja, quando pressentia que a manobra estava difícil. E um dia, conta-se, tantas ordens deu que o condutor, que não o conhecia, avançou, provocando um choque com outro veículo. Perante os protestos do confiante condutor, respondeu, com alguma graça: “é preciso ter olhinhos; é preciso ter olhinhos!”
No Timoneiro de Setembro/Outubro de 1977, tinha ele 38 anos, noticia-se, em artigo do Padre Miguel Lencastre, ao tempo prior da Gafanha da Nazaré, que a mãe do Manel faleceu no dia 30 de Outubro, tendo-se realizado o funeral no dia 1 de Novembro. A missa do funeral celebrou-se no cemitério, com a participação de toda a gente que ali recordava os seus mortos. No momento da colecta, o Padre Miguel fez um apelo à população para que contribuísse com os seus donativos, porque era urgente ajudar o Manel e seu irmão Carlos, também deficiente. Depois foi o arranjo da pobre habitação, dando-lhe melhores condições de habitabilidade.
Anos mais tarde, o Manel foi acolhido por um irmão, na Gafanha da Encarnação. E nunca mais apareceu nos sítios do costume. Houve, certamente, razões para isso. Morreu passado algum tempo. E não faltou quem dissesse que tal se ficou a dever ao facto de o Manel da Raquel ter saído do seu ambiente natural. Penso que não. O que importa, neste momento, é recordar esta figura típica da nossa terra, de quem todos gostavam.
Fernando Martins
Açores: Pico e Faial
Faial: Vulcão dos Capelinhos
Açores: Pico e Faial
Mais desafios para férias, nas ilhas atlânticas dos Açores. Como deve ser interessante andar por lá com os olhos bem abertos, para ver o mar de todos os lados e a terra com cheiros e paisagens, que se hão-de tornar inesquecíveis a quem puder senti-los com o corpo e com a alma!
Jacinta Canta Zeca Afonso
Aqui fica, para apreciação dos meus amigos, uma belíssima interpretação da Jacinta. Zeca Afonso sai enriquecido com a voz desta cantora que tanto aprecio.
DIÁLOGO IGREJA MUNDO, DIFICIL MAS INDISPENSÁVEL
"Olhar o mundo das pessoas, com um olhar positivo como Deus o olha, acorda apelos e sentimentos de responsabilidade. Sempre foi para a Igreja um caminho de renovação, de resposta válida e de presença significativa, estar atenta e solidária com os problemas das pessoas, quer estes se traduzam em alegrias ou tristezas, vitórias ou derrotas, certezas ou dúvidas. A novidade de Deus e dos seus dons revela-se no confronto com as realidades que afectam, de modo positivo ou negativo, a vida das pessoas concretas, em cada tempo, lugar ou condição."
quinta-feira, 7 de fevereiro de 2008
Na Linha Da Utopia
A gratuitidade
1. É a generosidade e o despojamento abnegado que farão de cada pessoa uma dádiva para o mundo. Na mensagem de Bento XVI, para a começada preparação da Páscoa 2008, é sublinhado esse valor da “oferta” como escola de vida. Uma vida que, na base de a ler como construção constante, dará as garantias da estabilidade assente na vivência do dia-a-dia. É a esse valor da renovação permanente que este tempo quaresmal pré-primaveril nos vai chamando. Numa consciência de que todas as coisas são breves e tudo fica no mundo, sendo a única via do futuro a identificação absoluta com a esperança que, procurando a identificação original, brota do invisível de Deus.
2. Neste estímulo à gratuitidade, em última análise, ninguém tem a exclusividade dos bens e ao mesmo tempo todos os bens são de todos e de cada um. Não há incompatibilidades… É uma forma de dizer que o “destino universal dos bens” apela a uma finalidade última dignificante de todas as coisas. Na referida mensagem é sublinhado que «não somos proprietários mas administradores dos bens que possuímos: assim, estes não devem ser considerados propriedade exclusiva, mas meios através dos quais o Senhor (“pai criador”) chama cada um de nós a fazer-se intermediário da sua providência junto do próximo».
3. É mesmo a identidade do ser “administrador” a nossa condição humana. Parece que, pelos sinais que o mundo continua a dar, não temos sido tão bons administradores, da ordem material (do pão e água para todos) à ordem espiritual (a fome de dignidade humana que paira em tantas concepções que excluem). Ao olharmos para a questão ecológica que nos coloca num obrigatório patamar de comunidade global, a natureza dá-nos esse sinal de uma gratuitidade a redescobrir e não mais uma táctica para explorar. Talvez tenhamos sido mais “exploradores” que gestores. Dirigindo-se à comunidade, Bento XVI lembra que, «quando se oferece gratuitamente a si mesmo, o cristão testemunha que não é a riqueza material que dita as leis da existência, mas o amor». Assim seja!
4. Afinal, muito e sempre acima de qualquer codificação ou instituição está essa força (e)terna que (lhes dá razão e que) assumiu SER PESSOA no tempo para nos conduzir pelos caminhos desse “reino” não da terra, mas dos “céus”. Que bom seria se todos os olhares críticos não perdessem tempo e mergulhassem nessa compreensão misteriosa do essencial! Também aqui, este “tempo de revisão” quer ser “meio” para um chegar pascal!
Alexandre Cruz
Padre António Vieira, um homem de todos os tempos
A celebração dos 400 anos do nascimento do Padre António Vieira, jesuíta, que se distinguiu em diversas áreas, nomadamente, na vivência e divulgação da fé crista, na defesa dos indígenas brasileiros, na oratória, na arte de escrever e na política, entre outras, veio mostrar que muito pouco sabemos de um homem cuja cultura, no século XVII, se situava muito acima do comum dos mortais. Pelos seus sermões, carregados de sabedoria e de ensinamentos, sabe-se que a sua cultura, multifacetada, fez dele um homem que se projectou no tempo. Até hoje.
Como é costume, celebrações deste género, sobre figuras pátrias fascinantes, ficam-se por Lisboa. O resto do País é paisagem. Infelizmente.
Ontem, no Centro Cultural de Belém, foram lidos e comentados alguns dos seus sermões. Encarregaram-se disso personalidades da cultura, em especial Rodrigo Guedes de Carvalho, Baptista-Bastos, Mega Ferreira, Gonçalo M. Tavares e José Tolentino Mendonça. E foi bom conhecer melhor, por uma ou outra frase que li ou reli, a riqueza da sapiência de António Vieira. Mas também foi interessante confirmar a oportunidade dos seus escritos para os nossos dias.
Pelo relato dos órgãos de comunicação social pude ficar mais rico, mas não deixei de sentir que os lisboetas são uns felizardos.
FM
Como é costume, celebrações deste género, sobre figuras pátrias fascinantes, ficam-se por Lisboa. O resto do País é paisagem. Infelizmente.
Ontem, no Centro Cultural de Belém, foram lidos e comentados alguns dos seus sermões. Encarregaram-se disso personalidades da cultura, em especial Rodrigo Guedes de Carvalho, Baptista-Bastos, Mega Ferreira, Gonçalo M. Tavares e José Tolentino Mendonça. E foi bom conhecer melhor, por uma ou outra frase que li ou reli, a riqueza da sapiência de António Vieira. Mas também foi interessante confirmar a oportunidade dos seus escritos para os nossos dias.
Pelo relato dos órgãos de comunicação social pude ficar mais rico, mas não deixei de sentir que os lisboetas são uns felizardos.
FM
Mensagem Quaresmal do Bispo de Aveiro
"O esforço de conversão e a exigência de verdade a que o discípulo de Cristo é chamado educam-nos para este ser para os outros através da generosidade e da partilha fraterna, aprendendo a viver com sobriedade, com preocupação pela justiça e com ousadia da caridade, defendendo os valores humanos fundamentais da vida, da pessoa e de um humanismo solidário. Seremos, assim, luz de esperança, percursora de um mundo novo, se caminharmos na Luz que é Cristo."
António Francisco
quarta-feira, 6 de fevereiro de 2008
Quem tem medo da história?
O centenário do regicídio trouxe ao de cima reacções curiosas. Por um lado, os historiadores a dar relevo à figura do rei, aos seus projectos e às maquinações que o levaram à morte. Por outro lado, o governo a dizer não ás iniciativas surgidas e AR a dizer que seria uma mancha, um erro sem sentido evocar-se um símbolo daquilo que foi derrotado, a execranda monarquia, e deu lugar à vitória do que somos hoje, a gloriosa república.É muito difícil encontrar competência, coragem e sensatez, para se lerem com liberdade interior acontecimentos históricos, quando tocam convicções ideológicas ou partidárias.
É o caso.
A monarquia não é uma ameaça, a república não tem um toque de perfeição acabada. A história é sempre mestra, para quem a souber ler sem preconceitos, nem olhos vesgos.
Mais uma vez aí temos um presente vazio, um passado apagado e um futuro sem esperança.
António Marcelino
Imagens dos Açores
Ilha do Pico: Lava solidificada
Diz-se, com razão, que os Açores nos oferecem paisagens deslumbrantes. A natureza, virgem em muitos recantos das suas ilhas, mostra-nos horizontes agrestes duma beleza inesquecível, para quem tem a dita de os olhar de perto. O meu filho João Paulo, professor por aquelas bandas, visitou este fim-de-semana as ilhas do Pico e do Faial, com algumas colegas, e do que todos viram enviaram-me fotografias para as partilhar com o mundo. Por qui as vou publicando durante alguns dias, para que alimentemos o desejo de visitar os Açores.
Padre António Vieira nasceu há 400 anos
Jesuíta, nascido a 6 de Fevereiro de 1608, ficou na história da literatura, da política e da Igreja Portuguesa.
"António Vieira nasceu em Lisboa junto da Sé. Aos 6 anos teve que se transferir para o Brasil. Acompanhou com a família o seu pai que tinha sido destacado para desempenhar funções na Alfândega de Salvador da Baía, então capital daquela colónia portuguesa. Entrou para o colégio da Companhia de Jesus daquela cidade, desejando ser missionário e dedicar a vida à conversão dos ameríndios. Tornou-se jesuíta e evidenciou-se rapidamente como um mestre da palavra: um ardente evangelizador e defensor dos índios, nomeadamente lutando contra a voragem esclavagista que grassava então nas terras de Vera Cruz."
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"Nascer pequeno, e morrer grande, é chegar a ser homem. Por isso nos deu Deus tão pouca terra para o nascimento, e tantas terras para a sepultura. Para nascer, pouca terra: para morrer, toda a terra: para nascer, Portugal: para morrer, o mundo."
Padre António Vieira, no Público de hoje (No PÚBLICO on-line, 2.º Caderno, P2, páginas 4, 5, 6 e 7), em trabalho de António Marujo
Regicídio e República
Não podemos aceder à história apenas pelos circuitos dos humores momentâneos. Se a aproximação aos factos se faz sempre com elementos condicionados, quer pelo conhecimento parcial, quer pela distância do tempo, quer pela névoa da ideologia que foca e desfoca o que, embora inconscientemente, parece relevante, cumpre-nos sempre reler a história e examinar mais profunda e friamente os dados e os significados.
A República esteve discretamente escondida nas entrelinhas de quase todas as crónicas que foram feitas sobre o assassínio do Rei de Portugal de em 1908. Notou-se algum desconforto em não condenar expressamente um acto de violência máxima, apenas por ele ter sido lançado por quem poderia pretender outra coisa: matar a monarquia enquanto matava o Rei.
Chegamos assim aos retorcidos da história e suas interpretações. Os cronistas não estão isentos desta manipulação, nem os jornalistas, os políticos, os intelectuais ou religiosos. Nem a opinião pública. Temos em Portugal experiências recentes de factos que foram enxertados nos anais segundo as conveniências enigmáticas dos seus historiógrafos. Percebe-se, mas não é honesto.
Por isso merece o maior realce o testemunho exemplar do Cardeal Patriarca de Lisboa pela celebração a que presidiu em S. Vicente de Fora e pela palavra luminosa que lançou sobre o centenário do regicídio.
Estamos a dois anos de celebrar o centenário da implantação da República. Nalguns areópagos começa a contagem de espingardas, glórias e vindictas. Pelo que já se cheira vai haver muitas histórias à volta da mesma República. Datas como 1789, 1834, 1926 vão dar que perorar a eruditos de circunstância. Mais do que extrair dividendos importa um esforço comum por aprofundar o que objectivamente se passou para termos algo de autêntico a transmitir às gerações vindouras. A história não é um brinquedo de circunstância.
António Rego
Na Linha Da Utopia
As cinzas
1. Os símbolos pertencem à vida. Eles estão por toda a parte, das coisas mais simples como os emblemas da praça pública ou de instituições às realidades mais profundas da existência humana e das religiões. Os estudiosos da identidade humana das sociedades falam do “símbolo” como inerente a uma consciência de “pertença”, não se podendo silenciar, por mais racionalista que se seja, a face simbólica da própria vida. Pode até ser com outros nomes, mas desde que exista uma sensibilidade humana que se projecta, a dimensão simbólica, que nos transporta sempre para “algo mais”, convive com o nosso dia-a-dia.
2. Desde os tempos mais antigos que a própria força da natureza apela à compreensão do universo e do lugar das pessoas no mundo. Se com a força da primavera nasce uma nova natureza, o mundo da sabedoria bíblica, que procura a primazia única de cada ser humano, irá propor que se renasça também para uma Vida Nova. Este dinamismo pedagógico, como caminho de revisitação da fonte original e revisão de vida em cada momento presente, atravessa os séculos, afirmando-se como um factor estimulante de melhoria, de progresso, de transformação da vida pessoal e social.
3. Não compreender e não se perguntar pelo dinamismo esperançoso destes tempos pedagógicos é viver “longe” da raiz, onde não se procura um sentido comunitário aperfeiçoado para a vida no tempo e espaço que nos são dados viver. Que sentido tem o Natal sem o compreender da sua origem reveladora? Que lugar de significado terá a Páscoa se não se abrir o “coração” a um caminho de transformação? Talvez das coisas mais importantes da vida seja compreender-se que os dinamismos da existência que sentimos foram vividos, acolhidos e superados por pessoas e(m) comunidades antes de nós. Também desta forma estamos unidos à humanidade. Claro, não basta cumprir por “cumprir”, é o sentido profundo com que se vive…para se viver no mais e melhor de cada dia.
4. Há tempos dávamos conta de uma nova área de estudo chamada “reflexologia”… Vamos chamando novos nomes, cheios de markting, para “coisas” antigas. Por um lado, dilui-se o património de “sentido” de que somos herdeiros; por outro, por outras palavras, vamos sempre lá parar, pois na reflexologia procura-se compreender a dimensão espiritual da vida e o seu fazer-se história (de salvação). Estes dias marcam o início de um tempo de reflexão: é Quaresma, tempo como caminho de preparação da Páscoa para os que livremente se enraízam no cristianismo. Quem lá adiante festejar Páscoa, acolhe um convite que começou da forma mais interpelante: com as “Cinzas”. Não são cinzas de pessimismo, de tristeza, de tempo negativo. Nada disso. São tomada de consciência profunda da nossa condição humana. Um “choque” estratégico e despertador que quer sensibilizar para o aperfeiçoamento de vida. Só assim, lá adiante será Páscoa; na diversidade corajosa, a “passagem”!
Alexandre Cruz
terça-feira, 5 de fevereiro de 2008
DESPEDIR TRABALHADORES PARA CONTRATAR OUTROS
Confederações patronais querem poder despedir trabalhadores para renovarem os seus quadros de pessoal
As confederações patronais da indústria e do comércio querem que as empresas passem a poder despedir trabalhadores quando pretendam renovar os seus quadros de pessoal. "Não raro, as empresas estão apenas carecidas de trabalhadores diferentes e não de menos trabalhadores. É essa renovação que também se tem de possibilitar", defende a Confederação da Indústria Portuguesa (CIP), num parecer ontem divulgado sobre o Livro Branco das Relações Laborais, documento que vai servir de base à revisão do Código do Trabalho. Li este texto no PÚBLICO on-line de hoje e fiquei chocado. Os trabalhadores mais idosos poderão estar a caminho do despedimento, por necessidade de as empresas renovarem os seus quadros. Para mim, trata-se de uma proposta desumana e injusta. Em vez de promoverem os seus trabalhadores, mediante cursos de formação, na própria empresa ou fora dela, despedem-se, para contratarem quem já tem formação adequada.
E que fazer aos trabalhadores despedidos? O Estado que os sustente? Os familiares, se puderem, que lhes dêem um prato de sopa? As instituições de solidariedade social que os acolham? Há ideias que tenho dificuldade em digerir. Há propostas que me recuso a aceitar.
Sabe-se que há empresas com trabalhadores que nunca foram preparados para as exigências da produção em moldes modernos. Mas que culpa têm eles de nunca ninguém os estimular e ajudar na sua valorização profissional? Será que o despedimento, nestas circunstâncias, é digno e humano? Será que uma vez despedidos conseguirão trabalho em qualquer outra empresa? Não me parece. E como é possível que responsáveis pelo patronato industrial e comercial tenham coragem de avançar com tais propostas?
E que fazer aos trabalhadores despedidos? O Estado que os sustente? Os familiares, se puderem, que lhes dêem um prato de sopa? As instituições de solidariedade social que os acolham? Há ideias que tenho dificuldade em digerir. Há propostas que me recuso a aceitar.
Sabe-se que há empresas com trabalhadores que nunca foram preparados para as exigências da produção em moldes modernos. Mas que culpa têm eles de nunca ninguém os estimular e ajudar na sua valorização profissional? Será que o despedimento, nestas circunstâncias, é digno e humano? Será que uma vez despedidos conseguirão trabalho em qualquer outra empresa? Não me parece. E como é possível que responsáveis pelo patronato industrial e comercial tenham coragem de avançar com tais propostas?
FM
CARNAVAL, CINZAS E QUARESMA
É natural que nem todos compreendam ou saibam as razões das Festas Móveis, como a Páscoa. E como o saber não ocupa lugar, aqui deixo, como sugestão de leitura, um texto que explica a marcação da Páscoa, no calendário da Igreja Católica. Olhando para o calendário, rapidamente se percebe que é a Páscoa quem rege o Carnaval: a Páscoa é celebrada no primeiro Domingo da lua cheia após o equinócio da Primavera [21 de Março], no hemisfério Norte. O Carnaval acontece entre 3 de Fevereiro e 9 de Março, sempre quarenta e sete dias antes da Páscoa, ou seja, após o sétimo Domingo que antecede o Domingo de Páscoa. Mas pode ler mais sobre sobre Carnaval, Cinzas e Quaresma.
Imagens da Ria
SOLIDÃO NO CANAL DE MIRA
Ontem, o Canal de Mira, junto à Vagueira, vivia uma certa solidão. Pouca gente olhava para ele ou parava para o apreciar, como era justo. O dia estava luminoso, e algumas nuvens, bem visíveis, emprestavam-lhe um encanto raro. Um barquito, tímido e quieto, parecia desolado, tão votado ao esquecimento se encontrava. Olhei para ele com vontade de dar uma voltinha pela laguna, tão serenamente ela me convidava. Não fui, nem autorização tinha para isso, mas não resisti a fixá-la, assim bonita, para que todos vejam, se é que ainda não sabiam, que a Ria de Aveiro é mesmo linda, diferente e amiga, em qualquer canto, de Ovar a Mira.
VIAJANDO PELO PATRIMÓNIO AVEIRENSE
Amaro Neves no CUFC
No dia 13 de Fevereiro, 2.ª quarta-feira do mês, o CUFC vai oferecer mais uma excelente oportunidade a todos os aveirenses para que fiquem a conhecer melhor o património histórico e artístico que nos rodeia.
Amaro Neves, historiador e especialista em história de arte, vai ser o convidado de mais uma Conversa Aberta, do Fórum::UniverSal. Com entrada livre, a conferência, seguida de diálogo, será apresentada às 21 horas, nas instalações do CUFC, junto à Universidade de Aveiro, esperando-se casa cheia. É que não é todos os dias que poderemos ouvir, ao vivo, alguém que conhece, de forma bastante profunda, o nosso património histórico e artístico.
No dia 13 de Fevereiro, 2.ª quarta-feira do mês, o CUFC vai oferecer mais uma excelente oportunidade a todos os aveirenses para que fiquem a conhecer melhor o património histórico e artístico que nos rodeia.
Amaro Neves, historiador e especialista em história de arte, vai ser o convidado de mais uma Conversa Aberta, do Fórum::UniverSal. Com entrada livre, a conferência, seguida de diálogo, será apresentada às 21 horas, nas instalações do CUFC, junto à Universidade de Aveiro, esperando-se casa cheia. É que não é todos os dias que poderemos ouvir, ao vivo, alguém que conhece, de forma bastante profunda, o nosso património histórico e artístico.
Na Linha Da Utopia
António Vieira faz 400 anos
1. António Vieira nasceu há 400 anos, em Lisboa. Originariamente mestiço, foi a 6 de Fevereiro de 1608 que chegou a este mundo o homem que atravessaria o século XVII semeando até ao limite a confiança que o desmotivado país bem precisava. Criador de pontes pelos mares que viaja sete vezes rumo ao Brasil (passando por Cabo Verde), inaugura um novo estilo de pertença em que a “língua” e a “cultura” são o lugar do encontro do essencial humano (até ao fim, 17 de Junho 1697, na Baía – Brasil).
2. O tempo de Vieira acolhe os impactos de profundas transformações ao nível do que hoje chamamos de “comunidade internacional”: a cisão europeia das “reformas”; a nova “imagem” de um mundo agora com quatro continentes; as confirmadas descobertas cosmológicas de Galileu; um paradigma de abordagem centralizado na Razão instrumental em detrimento da Revelação; a concepção de uniformidade político-religiosa de estado que “obriga” à expulsão dos judeus; a generalizada exploração desumana de escravos…
3. A realidade portuguesa não se afirmava com melhores cenários. Fruto do fechamento (com D. João III) de que a Inquisição (instituída em 1536) seria sinal simbólico, a par do desvio da “matriz global” das descobertas portugueses para as “areias marroquinas” (Alcácer Quibir, 1578), Portugal viveria no tempo seiscentista um cenário de crise, insegurança, incerteza na perca da identidade pelo tomar dos reis de Espanha (em 1580). Este contexto da perca da independência, também por uma certa nobreza ociosa, seria o terreno de um tempo adiado, descomprometido, desmotivado, corrupto, morto.
4. É neste amplo e complexo enquadramento que melhor se poderá compreender o cidadão do mundo que foi o padre António Vieira. Missionário Jesuíta, pregador pedagogo público (na base da força que tinha o Sermão no barroco da época), embaixador de D. João IV, Vieira das terras do Brasil em edificação comunitária, prima pelo essencial da humanidade e da religião: vive o espírito cristão “ecuménico” (na defesa e reintegração dos judeus) e antecipa (a par de Bartolomeu de Las Casas e Montaigne) o patamar da dignidade humana universal. Para todos os seres humanos: escravos e índios, dizendo que estes também estão inscritos nos livros de Deus. Uma autêntica revolução na mentalidade da época!
5. Continuamente desmontando a visão eurocêntrica do mundo, Vieira projecta Portugal numa História do Futuro, em identidade universalista, ao tempo um factor motivador fundamental à própria consolidação da Restauração de 1640. Em tudo busca a unidade humana: «Se a fortuna os fez escravos, a natureza fê-los homens: e porque há-de poder mais a desigualdade da fortuna para o desprezo, que a igualdade da natureza para a estimação? Quando os desprezo a eles, mais me desprezo a mim» (Sermões do Rosário, Sermão XXVII). Dizem alguns estudiosos que até pela literatura (quanto mais pela identidade) é com pena que Vieira se estuda muitíssimo pouco em Portugal e muito se estuda no Brasil. Pena para nós! Talvez o futuro esteja mesmo lá (Eduardo Lourenço).
Alexandre Cruz
1. António Vieira nasceu há 400 anos, em Lisboa. Originariamente mestiço, foi a 6 de Fevereiro de 1608 que chegou a este mundo o homem que atravessaria o século XVII semeando até ao limite a confiança que o desmotivado país bem precisava. Criador de pontes pelos mares que viaja sete vezes rumo ao Brasil (passando por Cabo Verde), inaugura um novo estilo de pertença em que a “língua” e a “cultura” são o lugar do encontro do essencial humano (até ao fim, 17 de Junho 1697, na Baía – Brasil).
2. O tempo de Vieira acolhe os impactos de profundas transformações ao nível do que hoje chamamos de “comunidade internacional”: a cisão europeia das “reformas”; a nova “imagem” de um mundo agora com quatro continentes; as confirmadas descobertas cosmológicas de Galileu; um paradigma de abordagem centralizado na Razão instrumental em detrimento da Revelação; a concepção de uniformidade político-religiosa de estado que “obriga” à expulsão dos judeus; a generalizada exploração desumana de escravos…
3. A realidade portuguesa não se afirmava com melhores cenários. Fruto do fechamento (com D. João III) de que a Inquisição (instituída em 1536) seria sinal simbólico, a par do desvio da “matriz global” das descobertas portugueses para as “areias marroquinas” (Alcácer Quibir, 1578), Portugal viveria no tempo seiscentista um cenário de crise, insegurança, incerteza na perca da identidade pelo tomar dos reis de Espanha (em 1580). Este contexto da perca da independência, também por uma certa nobreza ociosa, seria o terreno de um tempo adiado, descomprometido, desmotivado, corrupto, morto.
4. É neste amplo e complexo enquadramento que melhor se poderá compreender o cidadão do mundo que foi o padre António Vieira. Missionário Jesuíta, pregador pedagogo público (na base da força que tinha o Sermão no barroco da época), embaixador de D. João IV, Vieira das terras do Brasil em edificação comunitária, prima pelo essencial da humanidade e da religião: vive o espírito cristão “ecuménico” (na defesa e reintegração dos judeus) e antecipa (a par de Bartolomeu de Las Casas e Montaigne) o patamar da dignidade humana universal. Para todos os seres humanos: escravos e índios, dizendo que estes também estão inscritos nos livros de Deus. Uma autêntica revolução na mentalidade da época!
5. Continuamente desmontando a visão eurocêntrica do mundo, Vieira projecta Portugal numa História do Futuro, em identidade universalista, ao tempo um factor motivador fundamental à própria consolidação da Restauração de 1640. Em tudo busca a unidade humana: «Se a fortuna os fez escravos, a natureza fê-los homens: e porque há-de poder mais a desigualdade da fortuna para o desprezo, que a igualdade da natureza para a estimação? Quando os desprezo a eles, mais me desprezo a mim» (Sermões do Rosário, Sermão XXVII). Dizem alguns estudiosos que até pela literatura (quanto mais pela identidade) é com pena que Vieira se estuda muitíssimo pouco em Portugal e muito se estuda no Brasil. Pena para nós! Talvez o futuro esteja mesmo lá (Eduardo Lourenço).
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