domingo, 13 de janeiro de 2008

NA RUA COMPRIDA


Na rua comprida
Há gente que passa
e pára
Há gente que corre
e conversa
Há gente de olhares distantes
e frios

Na rua comprida
Há gente sozinha
e acompanhada
Há gente que procura
no murmúrio
a paz há tanto perdida

Na rua comprida
Há gente triste
e alegre
Há gente que sonha
e acredita
que a vida
com alguém
é sempre mais bonita

FM

Ao Compasso do Tempo



1. Interrogo-me diante da memória cultural de imensas pessoas ao lembrarem vultos, obra feita, exemplos (às vezes, até momentos desedificantes) em contraste com os silêncios do esquecimento. A morte mais dolorosa ocorre quase sempre após a biológica.
Como é que, no nosso meio, autores “malditos” (assim foram julgados) como Simone de Beauvoir, que o mundo literário festeja no primeiro centenário de nascimento, são postos em cena, e no caso em apreço, pela defesa da mulher, ao invectivar opressões, ao descolonizar a dependência, ao promover a dignidade de direitos iguais? Ainda bem.
Numa certa altura da trajectória da minha geração, citar Simone ou o “seu” Sartre, era diabolizar o tê-los trazido ao convívio da mente e da palavra. Dei-me conta de que foram muito poucas as pessoas que se deram ao trabalho de os conhecer, estudando-os em depuração crítica.
Há longos meses chegou ao meu conhecimento a descoberta de um escrito póstumo de Simone, polvilhado de referências auto-biográficas, desde a meninice à adolescência, e onde, sem agressividade, recorda a educação cristã do colégio que frequentou, e, mais tarde, a ruptura com as perspectivas da Igreja Católica. Tornou-se descrente. Socorrendo-me do arquivo da memória, destaco o elogio que presta às pessoas com quem teve a dita de contactar, e na ambiência de um colégio orientado por valores cristãos, os quais ela aponta a dedo, enquanto vivos na arte de viver de uma comunidade. Dai o retrato de uma geração corajosa e consistente, que ela traça!
Ninguém nasce humano; torna-se humano…, glosando o dito de Simone, a respeito da Mulher.
Ouvi esta semana uma mulher afirmar que as mulheres (ou um certo número delas) guardam dentro de si uma certa raiva, uma recusa aberta contra muita gente. Será mesmo assim? E continuava: são efeitos de uma educação que sempre inferiorizou, longe de promover a auto-estima e a admiração. Resultado? O arrastar, ao longo do tempo, a sensação da insignificância, da incapacidade, da falta de estatuto... Venham essas amputações donde vierem, são decretos de morte. Por isso muitos (as) não se tornaram humanos (as).

Januário Torgal Ferreira,

Bispo das Forças Armadas e Forças de Segurança

Leia todo o artigo em Jornal de Opinião

TECENDO A VIDA UMAS COISITAS - 60



DE COMO OS RAPAZES
ABANDONAVAM A ESCOLA

Caríssima/o:

Há coisas que têm tanta graça e tanta lógica como aquela anedota de almanaque:
- Senhora Professora, uma pessoa pode ser castigada por uma coisa que não fez?
- É claro que não, Teresinha!
- Sabe, é que não fiz o trabalho de casa...

E foi o caso.
O Olívio, que contava com a presença e o apoio do irmão mais velho que iria frequentar a 4.ª classe, sentiu-se, de um momento para o outro, como órfão: o Artur resolveu abandonar a Escola!
Era lá possível? Mas porquê? Não vês que uma pessoa sem estudos não vale nada? Anda, homem, faz ao menos a 4.ª classe!
Não... e não... e não!
Ai sim?! Então toma, e toma, e toma!, e amanhã voltas à Escola que a Senhora Professora já te mandou chamar!
Mas, no dia seguinte, o Artur levantou-se cedo e, quando o Pai chegou ao trabalho, já ele lá estava: percorreu a pé, sozinho, os quilómetros até à obra que andava em reparação...
- Ó Pai, eu quero trabalhar!
- Filho, eu preferia que voltasses para a Escola. Sabes, olha para mim que não sei ler nem escrever... e vês a falta que me faz.
- Mas eu já fiz o exame da 3.ª classe!... Agora quero trabalhar!
- Vais-te arrepender... Hás-de torcer a orelha mas ela não deita sangue...Mas pronto, não se fala mais nisso... Traz-me tijolos e depois a massa.

A Mãe até chorou “de raiva”... o rapaz não queria mas ele não sabia o que queria...

Reparou então o Olívio que também outros rapazes não tinham regressado à Escola para a 4.ª classe e todos andavam a trabalhar. E ele não compreendia!
O “aeiou” depressa o fez esquecer esta falta e os companheiros eram como se outros irmãos não só nas brincadeiras mas também no apoio dentro da sala.

Manuel

sábado, 12 de janeiro de 2008

Imagens de Coimbra



Passei hoje por Coimbra. A correr, que não havia tempo para mais. Pela Coimbra da velha universidade e dos doutores, dos estudantes e dos futricas. Pela Coimbra dos fados e das baladas, do Mondego e dos poetas. Pela Coimbra das saudades e da Académica, das capas negras e das guitarradas. Pela Coimbra das tascas e das serenatas, dos amores e das paixões. Com o Sol a afundar-se no horizonte e a cair no mar, ainda longe, pude registar estas imagens, que ofereço aos meus leitores.

REPENSAR DEUS: O ATEÍSMO DE DEUS



Repensar Deus e O Ateísmo de Deus foram os títulos que dois jornalistas deram a declarações minhas na quadra natalícia. E, claro, não faltou quem se escandalizasse.
Não é Deus sempre o mesmo? Então, porquê e como repensá-lo? Cá está! Realmente, Deus não muda, é sempre o mesmo. Mas quem o pensa somos nós e sempre a partir de um lugar e de um tempo. Como escreveu Mestre Eckhart, "o facto de Deus ser imutável faz com que todas as coisas se movam". Deus transforma-se na sua história com os homens e as mulheres, como as mulheres e os homens se transformam na sua história com Deus ou sem Deus - o ateísmo também faz parte da história religiosa da Humanidade.
Depois, a afirmação do "ateísmo de Deus" é menos provocatória do que se julga. Deus não põe a questão de Deus, precisamente porque é Deus e não há Deus acima de Deus.
Mas, para lá da provocação, a afirmação é mais exigente e pode ter consequências inesperadas. Deus é plenitude e excesso, não precisando do culto dos homens. Assim, pelo menos na perspectiva cristã, Deus revelou-se não por causa dele mesmo, mas por causa dos homens e das mulheres. Deus não criou os seres humanos por causa da sua glória, mas exclusivamente por causa da felicidade deles, seres humanos. O único interesse de Deus na criação é a realização plena dos homens e das mulheres. Santo Ireneu disse-o de modo pregnante: "A glória de Deus é o Homem vivo."
Ao contrário do Enuma Elish, poema épico da Babilónia sobre o mito da criação, no qual os homens aparecem para servirem os deuses, no livro do Génesis, os homens não são servos de Deus - a criação é por causa dos homens e não por causa de Deus. Mais tarde, Jesus explicitará, dizendo aos discípulos que os não chama servos, mas amigos, pois revelou-lhes quem é e o que é Deus para os homens: Deus é amor. Aí está a razão por que, nos casamentos, por exemplo, se não deveria referir os noivos como servos: eles, de facto, não são servos, mas amigos de Deus.
Esta é com certeza a revolução mais extraordinária da história religiosa da Humanidade, sendo preciso tirar daí as devidas consequências. A maior talvez seja a autonomia nos diferentes domínios: político, científico, económico, filosófico, moral... As realidades terrestres devem ser pensadas e conduzidas segundo a sua racionalidade própria.
O ponto mais sensível será a ética. As religiões não ditam como específicos os conteúdos morais universalmente exigíveis. Crentes e não crentes, a partir dos avanços que a História foi alcançando no domínio das diferentes gerações de direitos humanos - certamente também por acolhimento de muita inspiração religiosa -, deverão chegar, com argumentação racional-prática, àquele consenso de um mínimo ético decente sem o qual os seres humanos ficariam abaixo da possibilidade de realizarem a sua humanidade. Trata-se daquilo que alguns, como Adela Cortina, chamam uma "ética de mínimos", referente à justiça e àquele nível básico de condições que permitirá, depois, que, em sociedades pluralistas, convivam diferentes "éticas de máximos", isto é, grupos com distintas propostas de sentido, felicidade e vida plena.
Então, Deus é inútil? Deus não se encontra na lógica da necessidade, mas do excesso e da graça. Assim, também no campo ético, pode ser inspirador de uma atitude nova e de uma nova esperança. E os crentes, no quadro de uma sociedade pluralista - o Estado deve ser laico; as sociedades não são laicas, mas plurais -, podem e devem participar no debate público, sem terem de pôr de lado a sua inspiração religiosa. Como escreveu o filósofo agnóstico Jürgen Habermas, "a garantia de liberdades éticas iguais exige a secularização do poder do Estado, mas proíbe a universalização política da concepção secularista do mundo. Os cidadãos secularizados, na assunção do seu papel de cidadãos, não devem negar liminarmente um potencial de verdade às concepções religiosas nem pôr em causa o direito de os concidadãos crentes oferecerem contributos, em linguagem religiosa, para as discussões públicas".


Anselmo Borges

In Diário de Notícias

sexta-feira, 11 de janeiro de 2008

JANEIRAS À CHUVA




AS TRADIÇÕES TÊM DE CONTINUAR

Recebi esta noite, em minha casa, o Grupo Etnográfico da Gafanha da Nazaré. Mesmo em noite de chuva e frio, caras e vozes que conheço, há anos, vieram mais uma vez cantar as Janeiras, para manter a tradição. Pais e filhos, todos entusiasmados, tocando e cantando melodias que permanecem, indelevelmente, na minha memória. O Grupo Etnográfico desenvolve esta acção há mais de 20 anos, pegando numa experiência de um outro grupo popular que a tinha iniciado uma dúzia de anos antes. De casa em casa, o Grupo é acolhido, normalmente, por cerca de 300 famílias. Também participa num ou noutro festival de Cantares das Janeiras, organizado por um Rancho ligado à Federação do Folclore Português.
Canta as Janeiras, presentemente, para não deixar morrer a tradição e para angariar fundos para o Grupo Etnográfico, sempre à procura de contribuições para custear as suas multiplas despesas. Como é conhecido de muitos, na Gafanha da Nazaré, organiza, anualmente, três Festivais de Folclore: o da Gafanha da Nazaré propriamente dito; o da Praia da Barra; e o da Festa de Nossa Senhora dos Navegantes.
Se tudo correr como o Grupo deseja, talvez seja possível participar num Festival de Folclore, em Palermo, Itália, ainda este ano. Mas as suas actividades continuam, já que a recolha, o estudo e o ensaio de novos Cantares, acompanhados de danças, recolhidos na tradição popular, são uma exigência constante.
Daqui endereço os meus parabéns ao Grupo Etnográfico da Gafanha da Nazaré e a todos os seus dirigentes e restantes membros, gente que vive com muito entusiasmo a etnografia ligada a esta região das Gafanhas.

FM
DEUS NOS DÊ FESTAS ALEGRES

Deus nos dê festas alegres
Com seu divino amor
A Virgem Nossa Senhora
Deu à luz o Redentor
Cantaremos nossas canções
Para visitar Jesus
Vamos ver sua lapinha
Cheia da divina luz

A Gafanha da Nazaré
É esta a sedutora
Damos graças ao Menino
E à Virgem Nossa Senhora

O presépio enfeitado
Nos espera e nos seduz
Para prestar homenagem
Ao que a Virgem deu à luz
Vamos indo pastorinhos
Com toda a nossa alegria
Visitar o Deus Menino
Filho da Virgem Maria

Vamos indo piedosos
Cada qual com sua oferta
Oferecer ao Menino
Que é dia da sua festa
É o nosso Deus Menino
É o rei dos pobrezinhos
Oferecer-lhe as ofertas
Dos humildes pastorinhos

CÂMARA DE ÍLHAVO COM ASSESSOR CULTURAL




Soube, pela comunicação social, que Ílhavo já tem um assessor cultural, que ficará responsável pela programação do Município, nessa área. É ele José Pina, que se apresenta credenciado por larga experiência na programação cultural em Santa Maria da Feira, um dos maiores municípios do país.
Promete que vai trabalhar com o meio associativo local, “estimulando a sua produção artística”, enquanto procurará dinamizar “uma programação diversi-ficada, regular e de reconhecido valor artístico, em áreas como a música, a dança, o teatro e o cinema”.
Boa vontade e entusiasmo não faltarão, sendo certo que todos os ílhavos ficarão a alimentar a esperança de que algo de bom seja feito por todos.
Numa primeira reacção, poderíamos ser levados a perguntar se não haveria pelo concelho de Ílhavo alguém com capacidade para tais funções. Acho, no entanto, que não vale a pena perder tempo com essas questões. Hoje em dia, os trabalhos e os trabalhadores, os técnicos e os dirigentes não podem ter fronteiras. O importante é que as coisas se façam para as pessoas e com as pessoas, valorizando-se sempre as melhoras apostas, aquelas que elevam e engrandecem as populações.
Da minha humilde pessoa, os projectos do Município, sobretudo os destas áreas, tão abrangentes quanto possível, poderão contar com o meu aplauso.

FM

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