Uma análise feita e publicada há meses, na Inglaterra, denunciava o Estado por estar em guerra contra a família, ser elemento perturbador da vida conjugal e familiar e se ter tornado o maior inimigo das famílias que o querem ser, sempre e em todas as circunstâncias. Isto tudo em virtude das políticas sociais que favorecem a separação, a instabilidade e formas estranhas de ser família, que se vão multiplicando com os favores da lei. Tudo isto atinge profundamente as famílias assentes em valores humanos e morais, a que, displicentemente, chamam “famílias tradicionais”, como se a tradição fosse sempre um conjunto de velharias incómodas e para deitar fora.
Não passou despercebida a grande manifestação em Madrid, no dia 30 de Dezembro, com mais de um milhão de pessoas na rua a denunciar o Estado pelo atropelo contínuo às famílias, nomeadamente às famílias cristãs. Apesar da campanha negativa das leis e dos meios de comunicação social, todos quanto fizeram e fazem uma experiência rica e enriquecedora, no seio da sua família, resistem, denunciam e clamam pela justiça que lhes é negada. O Cardeal de Madrid encabeçou a manifestação, porque o tema era sério.
A dissolução e destruição da família, todos o sabemos, não resulta de grupos espontâneos, mas é, essencialmente, fruto de políticas governamentais, traduzidas em leis e em favores sociais a uns, que a outros se negam ou dificultam. Assim, a pretexto de modernidade, se vai, pressurosamente, ao encontro de poucos e de suas apetências, com efeitos destrutivos do património social e instituições básicas da sociedade civil.
Trata-se de uma manifesta contra cultura que é preciso denunciar e contrariar com coragem, acompanhada de propostas alternativas válidas, claras e praticáveis.
Não se trata de um caminho impossível, e muitos assim o têm manifestado pela sua lucidez, luta organizada e contínua, choque numa sociedade que se deixa anestesiar ou embarca sonolenta nas palavras bonitas de quem parece procurar mais simpatias e êxitos, que soluções válidas para os problemas humanos e sociais do país.
Não digo que o Estado descuide a obrigação de procurar, para as minorias, respostas enquadradas no contexto social em que vivemos, respeitando e não agredindo as maiorias que, por sê-lo, não terão de ceder dos seus direitos e valores.
Não se pode aceitar, no caso da família, que o conjunto da população, constituído por famílias normais, fieis à lei fundamental do país e respeitando o património cultural e religioso que o sustenta, seja um conjunto descriminado e depreciado, ante as investidas de quem incarna a ditadura do efémero e do vazio moral e não respeita ninguém.
Todos sabemos como é difícil, por vezes impossível, proteger a estabilidade da família, quando o exemplo da não estabilidade vem, ostensivamente, de cima, de quem tem o poder mas também o dever de servir a comunidade nacional, como ela é e quer ser, e com o testemunho da sua vida e a demonstração pública dos valores que a norteiam.
As leis do divórcio, entre nós cada vez mais facilitado e agilizado, o embuste programado que levou muitos incautos a votar a facilitação do aborto, as crescentes dificuldades sociais para muitos casais que desejam procriar, mas não vislumbram como concretizar esse desejo normal, a maneira de resolver problemas graves que fazem de crianças objecto de discussões, lutas e trocas, as distorções da chamada educação social obrigatória, o hedonismo reinante acessível a todos, o retirar aos pais tarefas que lhes são próprias por parte do Estado que se arvora em dono e pai dos filhos dos outros, a morosidade de leis sociais que protejam e acautelam direitos e deveres familiares… Tudo isto, e não se esgota a lista dos problemas, mostra que não se respeita nem aprecia a família, nem se está disposto a promovê-la, se ela teima em ser família normal, onde o amor é lei, a vida e a relação familiar escola de valores, o lar, espaço e ambiente de humanização e capacitação para se agir em sociedade, de modo digno e responsável.
António Marcelino