sábado, 16 de fevereiro de 2008

Carlos do Carmo: Fado da Saudade

Carlos do Carmo, um senhor do Fado, canção nacional, venceu o Prémio Goya, com o "Fado da Saudade". Aqui o ponho à disposição dos meus leitores/ouvintes.

Jardim Oudinot: Obras já em curso



As prometidas obras urbanísticas do Jardim Oudinot começaram. Pelo menos, ontem já vi sinais de que se mexe por ali. Bancos e mesas foram arrancados e atirados para um canto, em jeito de quem anda a preparar o terreno para que os arranjos, bonitos, ajudem a dar vida àquele espaço privilegiado, com a ria por pano de fundo. Quem um dia lá for, em momentos de lazer, poderá deliciar-se com o ar fresco da laguna e com os barcos de pesca em busca de descanso no porto, ali ao lado.

S. Jacinto em festa


S. Jacinto em fotos tiradas do Forte de Barra. Clicar para ver melhor

S. Jacinto celebra hoje o seu 53.º aniversário. Motivo para festa, sempre, embora por vezes não haja alegria para isso. A S. Jacinto e à sua gente ligam-me laços de vizinhança e de amizade. lá Trabalhei lá dois anos, nos meus princípios profissionais, como professor, e desde essa altura passei a compreender melhor o seu isolamento. Por isso, quando posso, lembro que os residentes em S. Jacinto precisam mais do que umas lanchas e de um ferry-boat. Disse vezes sem conta que a ligação natural de S. Jacinto é com a Gafanha. Terras separadas apenas pela laguna, com uma ponte tudo ficaria resolvido. Mas teimaram com o ferry-boat e agora não faltam os protestos. É caro e não está sempre à mão. Só para turistas e pouco mais, penso eu. Importa, portanto, agendar, quanto antes, a ponte que estabeleça a ligação mais natural com a margem de cá. Então, quando isso acontecer, todos poderão sentir e ver como S. Jacinto ficará com outra vida.
Permitam-me que recorde, para além dos alunos que lá tive, de ambos os sexos, todo o ambiente dominado pela ria e pelo mar, com peixe fresco todas as manhãs. E a lota, com as artes de fazer render o peixe. Um dia ousei comprar algum e nem percebi que o lote estava a ficar por um preço exorbitante. Então, alguém me segredou: "Não ofereça mais; eu compro por si." Concordei e esperei. Acabei por ficar com peixe muito mais barato. Afinal, eu não conhecia os truques da venda na lota. Mas não faltou quem me ajudasse.
Lembro-me bem do Café do Labareda, onde almocei muitas vezes. Peixe quase sempre, mas muito bom, porque era apanhado na hora. E também da loja, onde se vendia de tudo, do Lelinho, pai do meu bom amigo Gilberto Nunes, que foi proprietário e gerente da Auto Viação Aveirense. O Lelinho era um homem bom. Era uma espécie de protector de toda a gente. Família em dificuldade tinha nele um apoio amigo.
Também recordo o dinamismo do Estaleiro do Roeder, que dava trabalho a centenas de pessoas, da terra e arredores. Quase todas as famílias dependiam, economicamente, directa ou indirectamente, do Estaleiro e da Aviação Naval.
S. Jacinto ficou sempre no meu espírito. Quando olho para a sua gente, até a sinto como minha família.

FM

O CÉREBRO, O EU E A LIBERDADE



O que diz alguém, quando diz "eu"? Afirma--se a si mesmo como sujeito, autor das suas acções conscientes, centro pessoal responsável por elas, alguém referido a si mesmo, na abertura e em contraposição a tudo.
Mas há observações perturbadoras. Por exemplo, pode acontecer que alguém adulto, ao olhar para si em miúdo, se veja de fora, apontando como que para um outro: aquele era eu, sou eu?
Há filósofos que se referem à ilusão do eu. Certas interpretações do budismo caminham nesta direcção. No quadro da impermanência e da interdependência de todas as coisas, fala-se da inexistência do eu. Matthieu Ricard, investigador em genética celular e monge budista, deu-me, num congresso no Porto, um exemplo: veja ali o rio Douro. O que é o rio Douro, onde está? Ele não existe como substância, pois não há senão uma corrente de água. Está a ver a consciência? O que é ela senão um fluxo permanente de pensamentos fugazes, de vivências? O eu não passa de um nome para designar um continuum, como nomeamos um rio.
Mas há a experiência vivida e inexpugnável do eu, ainda que numa identidade em transformação, que continuamente se faz, desfaz e refaz. O que se passa é que, não se tratando de uma realidade coisista, é inobjectivável e inapreensível.
É e será sempre enigmático como aparecem no mundo corpóreo o eu e a consciência. É claro que o eu não pode ser pensado à maneira de uma alma, um homunculus, um observador dentro do corpo - o fantasma dentro da máquina. Há, portanto, uma correlação entre a consciência e os processos cerebrais. Mas significa isto que essa correlação é de causalidade, de tal modo que haverá um dia uma explicação neuronal adequada para os estados espirituais? Ou, como já viu Leibniz e é agora acentuado pelo filósofo Th. Nagel, mesmo que, por exemplo, tivéssemos todos os conhecimentos científicos sobre os processos neuronais de um morcego, não saberíamos o que é o mundo a partir do seu ponto de vista? A questão é: como se passa de acontecimentos eléctricos e químicos no cérebro - processos neuronais da ordem da terceira pessoa - para a experiência subjectiva na primeira pessoa?
Apesar de se não afastar por princípio a possibilidade de se poder vir a dar essa compreensão, o filósofo Colin McGinn pensa que talvez nunca venhamos a entender como é que a consciência surge num mundo corporal, a partir de processos físicos. Também o neurocientista W. Prinz disse recentemente numa entrevista: "Os biólogos podem explicar como funcionam a química e a física do cérebro. Mas até agora ninguém sabe como se chega à experiência do eu nem como é que o cérebro é capaz de gerar significados."
E sou livre ou não? É claro que, como escreve o filósofo M. Pauen, se as nossas actividades espirituais se identificassem com processos cerebrais, segundo leis naturais, já se não poderia falar em liberdade - "As nossas acções seriam determinadas não por nós, mas por aquelas leis."
Mas, afinal, quem age, quem é o autor das minhas acções: o meu cérebro ou eu? "Como não é a minha mão, mas eu, quem esbofeteia esta ou aquela pessoa, não é o meu cérebro, mas eu, quem decide. O facto de eu pensar com o cérebro não significa que seja o cérebro, e não eu, quem pensa", escreve o filósofo Th. Buchheim.
Só existe liberdade, se há alguém capaz de autodeterminação. A determinação por um "eu", segundo um juízo de valor, é que faz com que uma acção seja livre e não puro acaso ou enquadrada no determinismo das leis naturais. Como diz P. Bieri - cito segundo H. Küng, em Der Anfang aller Dinge (O Princípio de Todas as Coisas) -, "é inútil procurar na textura material de um quadro o representado ou a sua beleza; é igualmente inútil procurar na mecânica neurobiológica do cérebro a liberdade ou a sua ausência. Ali, não há nem liberdade nem falta de liberdade. Do ponto de vista lógico, o cérebro não é o lugar adequado para esta ideia. A vontade é livre, se se submete ao nosso juízo sobre o que é adequado querer em cada momento. A vontade carece de liberdade, quando juízo e vontade seguem caminhos divergentes".


Anselmo Borges, no DN

sexta-feira, 15 de fevereiro de 2008

Pôr do Sol


Pôr do Sol visto junto ao Santo André

O Sol é um brincalhão. Ontem, em viagem, vi-o a deixar-nos com ar desafiador. Estava com a cor do fogo, vermelho vivíssimo. Só pude apreciá-lo, e fiquei-me por aí. Mas prometi a mim mesmo que no dia seguinte ficaria à coca, para o registar com toda a sua pujança. Vai daí, preparei-me, estrategicamente, para o meter na minha máquina fotográfica. Mas ele, não. Não quis mostrar-se como eu gostava. E por ali andou, no seu caminhar, rumo à outra banda. O vermelho vivo, que nos faz vibrar até ao âmago, não chegou. Mesmo assim, prometi que um dia destes o hei-de apanhar, para mostrar ao mundo que por aqui também o Sol brilha para todos.
FM

Justiça igual para todos?

A comunicação social tem multiplicado as notícias sobre as ilegalidades cometidas pela administração do BCP. As autoridades do Estado, que tutelam o sector, já divulgaram algumas dessas ilegalidades. Ainda não se viu, nem ouviu, qualquer membro dessa administração a negar as irregularidades apontadas. Dá a impressão que não se passa nada. Se um simples funcionário, deste ou doutro banco, ou um modesto cliente de um qualquer banco protagonizassem qualquer falha que prejudicasse uma entidade bancária, onde é que eles já estariam? É isto que revolta o comum do cidadão. Como é que se pode acreditar que a Justiça portuguesa é igualzinha para toda a gente? Eu ainda quero acreditar que é, mas qualquer dia começo a ter a certeza de que não. E tenho pena que isso aconteça porque, se a Justiça não é justa e igual para todos, onde é que o Estado de Direito vai parar? FM

O ABORTO CLANDESTINO

Durante a campanha para o referendo sobre o aborto, disse aqui que o aborto clandestino continuaria a ser uma realidade, como desde sempre o foi. E disse, na altura, que tal aconteceria, fundamentalmente, porque a mulher e o homem o vêem como acto intrinsecamente mau. Por isso o procuram e o provocam às escondidas, convencidos de que, coisa que não se vê não é crime. Mas é, sobretudo quando ignora, conscientemente, tanto as leis naturais como os princípios religiosos, neste caso para os crentes. Não me espanta, portanto, que os abortos legais tenham ficado aquém dos esperados. Isto é, os abortos clandestinos, tendo em conta os números propagados durante a campanha, continuam. Agora, com o silêncio dos que tanto os queriam eliminar, tornando os abortos livres e pagos pelo Estado, sabe-se que eles são feitos, nem que seja, como foi o caso, no silêncio do quarto de uma jovem estudante. Uns tantos comprimidos, de venda livre, poderiam matar mãe e filho. O filho não terá escapado e a jovem que não quis ser mãe, levada pela propaganda dos que aceitam o aborto como grande conquista civilizacional, sofreu as consequências da sua opção. Para mim, ficou com uma marca que jamais esquecerá; para outros será coisa de somenos, porque o que importa é ser dona do seu corpo. FM

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