quinta-feira, 7 de fevereiro de 2008

Na Linha Da Utopia



A gratuitidade

1. É a generosidade e o despojamento abnegado que farão de cada pessoa uma dádiva para o mundo. Na mensagem de Bento XVI, para a começada preparação da Páscoa 2008, é sublinhado esse valor da “oferta” como escola de vida. Uma vida que, na base de a ler como construção constante, dará as garantias da estabilidade assente na vivência do dia-a-dia. É a esse valor da renovação permanente que este tempo quaresmal pré-primaveril nos vai chamando. Numa consciência de que todas as coisas são breves e tudo fica no mundo, sendo a única via do futuro a identificação absoluta com a esperança que, procurando a identificação original, brota do invisível de Deus.
2. Neste estímulo à gratuitidade, em última análise, ninguém tem a exclusividade dos bens e ao mesmo tempo todos os bens são de todos e de cada um. Não há incompatibilidades… É uma forma de dizer que o “destino universal dos bens” apela a uma finalidade última dignificante de todas as coisas. Na referida mensagem é sublinhado que «não somos proprietários mas administradores dos bens que possuímos: assim, estes não devem ser considerados propriedade exclusiva, mas meios através dos quais o Senhor (“pai criador”) chama cada um de nós a fazer-se intermediário da sua providência junto do próximo».
3. É mesmo a identidade do ser “administrador” a nossa condição humana. Parece que, pelos sinais que o mundo continua a dar, não temos sido tão bons administradores, da ordem material (do pão e água para todos) à ordem espiritual (a fome de dignidade humana que paira em tantas concepções que excluem). Ao olharmos para a questão ecológica que nos coloca num obrigatório patamar de comunidade global, a natureza dá-nos esse sinal de uma gratuitidade a redescobrir e não mais uma táctica para explorar. Talvez tenhamos sido mais “exploradores” que gestores. Dirigindo-se à comunidade, Bento XVI lembra que, «quando se oferece gratuitamente a si mesmo, o cristão testemunha que não é a riqueza material que dita as leis da existência, mas o amor». Assim seja!
4. Afinal, muito e sempre acima de qualquer codificação ou instituição está essa força (e)terna que (lhes dá razão e que) assumiu SER PESSOA no tempo para nos conduzir pelos caminhos desse “reino” não da terra, mas dos “céus”. Que bom seria se todos os olhares críticos não perdessem tempo e mergulhassem nessa compreensão misteriosa do essencial! Também aqui, este “tempo de revisão” quer ser “meio” para um chegar pascal!

Alexandre Cruz

Padre António Vieira, um homem de todos os tempos



A celebração dos 400 anos do nascimento do Padre António Vieira, jesuíta, que se distinguiu em diversas áreas, nomadamente, na vivência e divulgação da fé crista, na defesa dos indígenas brasileiros, na oratória, na arte de escrever e na política, entre outras, veio mostrar que muito pouco sabemos de um homem cuja cultura, no século XVII, se situava muito acima do comum dos mortais. Pelos seus sermões, carregados de sabedoria e de ensinamentos, sabe-se que a sua cultura, multifacetada, fez dele um homem que se projectou no tempo. Até hoje.
Como é costume, celebrações deste género, sobre figuras pátrias fascinantes, ficam-se por Lisboa. O resto do País é paisagem. Infelizmente.
Ontem, no Centro Cultural de Belém, foram lidos e comentados alguns dos seus sermões. Encarregaram-se disso personalidades da cultura, em especial Rodrigo Guedes de Carvalho, Baptista-Bastos, Mega Ferreira, Gonçalo M. Tavares e José Tolentino Mendonça. E foi bom conhecer melhor, por uma ou outra frase que li ou reli, a riqueza da sapiência de António Vieira. Mas também foi interessante confirmar a oportunidade dos seus escritos para os nossos dias.
Pelo relato dos órgãos de comunicação social pude ficar mais rico, mas não deixei de sentir que os lisboetas são uns felizardos.

FM

Mensagem Quaresmal do Bispo de Aveiro


"O esforço de conversão e a exigência de verdade a que o discípulo de Cristo é chamado educam-nos para este ser para os outros através da generosidade e da partilha fraterna, aprendendo a viver com sobriedade, com preocupação pela justiça e com ousadia da caridade, defendendo os valores humanos fundamentais da vida, da pessoa e de um humanismo solidário. Seremos, assim, luz de esperança, percursora de um mundo novo, se caminharmos na Luz que é Cristo."

António Francisco

quarta-feira, 6 de fevereiro de 2008

Quem tem medo da história?

O centenário do regicídio trouxe ao de cima reacções curiosas. Por um lado, os historiadores a dar relevo à figura do rei, aos seus projectos e às maquinações que o levaram à morte. Por outro lado, o governo a dizer não ás iniciativas surgidas e AR a dizer que seria uma mancha, um erro sem sentido evocar-se um símbolo daquilo que foi derrotado, a execranda monarquia, e deu lugar à vitória do que somos hoje, a gloriosa república.É muito difícil encontrar competência, coragem e sensatez, para se lerem com liberdade interior acontecimentos históricos, quando tocam convicções ideológicas ou partidárias. É o caso. A monarquia não é uma ameaça, a república não tem um toque de perfeição acabada. A história é sempre mestra, para quem a souber ler sem preconceitos, nem olhos vesgos. Mais uma vez aí temos um presente vazio, um passado apagado e um futuro sem esperança.
António Marcelino

Imagens dos Açores

Ilha do Pico: Na serra mais alta de Portugal

Ilha do Pico: Lava solidificada



Diz-se, com razão, que os Açores nos oferecem paisagens deslumbrantes. A natureza, virgem em muitos recantos das suas ilhas, mostra-nos horizontes agrestes duma beleza inesquecível, para quem tem a dita de os olhar de perto. O meu filho João Paulo, professor por aquelas bandas, visitou este fim-de-semana as ilhas do Pico e do Faial, com algumas colegas, e do que todos viram enviaram-me fotografias para as partilhar com o mundo. Por qui as vou publicando durante alguns dias, para que alimentemos o desejo de visitar os Açores.

Padre António Vieira nasceu há 400 anos

Jesuíta, nascido a 6 de Fevereiro de 1608, ficou na história da literatura, da política e da Igreja Portuguesa.

"António Vieira nasceu em Lisboa junto da Sé. Aos 6 anos teve que se transferir para o Brasil. Acompanhou com a família o seu pai que tinha sido destacado para desempenhar funções na Alfândega de Salvador da Baía, então capital daquela colónia portuguesa. Entrou para o colégio da Companhia de Jesus daquela cidade, desejando ser missionário e dedicar a vida à conversão dos ameríndios. Tornou-se jesuíta e evidenciou-se rapidamente como um mestre da palavra: um ardente evangelizador e defensor dos índios, nomeadamente lutando contra a voragem esclavagista que grassava então nas terras de Vera Cruz."

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"Nascer pequeno, e morrer grande, é chegar a ser homem. Por isso nos deu Deus tão pouca terra para o nascimento, e tantas terras para a sepultura. Para nascer, pouca terra: para morrer, toda a terra: para nascer, Portugal: para morrer, o mundo."
Padre António Vieira, no Público de hoje (No PÚBLICO on-line, 2.º Caderno, P2, páginas 4, 5, 6 e 7), em trabalho de António Marujo

Regicídio e República





Não podemos aceder à história apenas pelos circuitos dos humores momentâneos. Se a aproximação aos factos se faz sempre com elementos condicionados, quer pelo conhecimento parcial, quer pela distância do tempo, quer pela névoa da ideologia que foca e desfoca o que, embora inconscientemente, parece relevante, cumpre-nos sempre reler a história e examinar mais profunda e friamente os dados e os significados.
A República esteve discretamente escondida nas entrelinhas de quase todas as crónicas que foram feitas sobre o assassínio do Rei de Portugal de em 1908. Notou-se algum desconforto em não condenar expressamente um acto de violência máxima, apenas por ele ter sido lançado por quem poderia pretender outra coisa: matar a monarquia enquanto matava o Rei.
Chegamos assim aos retorcidos da história e suas interpretações. Os cronistas não estão isentos desta manipulação, nem os jornalistas, os políticos, os intelectuais ou religiosos. Nem a opinião pública. Temos em Portugal experiências recentes de factos que foram enxertados nos anais segundo as conveniências enigmáticas dos seus historiógrafos. Percebe-se, mas não é honesto.
Por isso merece o maior realce o testemunho exemplar do Cardeal Patriarca de Lisboa pela celebração a que presidiu em S. Vicente de Fora e pela palavra luminosa que lançou sobre o centenário do regicídio.
Estamos a dois anos de celebrar o centenário da implantação da República. Nalguns areópagos começa a contagem de espingardas, glórias e vindictas. Pelo que já se cheira vai haver muitas histórias à volta da mesma República. Datas como 1789, 1834, 1926 vão dar que perorar a eruditos de circunstância. Mais do que extrair dividendos importa um esforço comum por aprofundar o que objectivamente se passou para termos algo de autêntico a transmitir às gerações vindouras. A história não é um brinquedo de circunstância.


António Rego

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