domingo, 1 de julho de 2007

Um artigo de Anselmo Borges, no DN


O HOMEM:
CRIADO À IMAGEM DE DEUS?


Parece estender-se cada vez mais a tentação de pensar que o Homem é um animal entre outros. Se diferença houvesse, não seria essencial e qualitativa, mas apenas de grau.
Mas quem anda atento reconhecerá com certeza que a diferença entre o Homem e os outros animais não é apenas de grau, mas essencial e qualitativa. Pelo menos, é preciso manter a pergunta
Também o Homem é corpo, mas um corpo que fala e que diz eu. Ora, um corpo que produz sons duplamente articulados, portanto, transportando sentido, é um corpo que transcende a animalidade.
Que o Homem não fica submerso na instintividade da vida prova-o o facto de, por exemplo, ao contrário do animal, no domínio da sexualidade, ser capaz de pesar razões, abster- -se, pensar no que é melhor para si e para o parceiro, ter inventado o erotismo e também a pornografia, procurar técnicas anticonceptivas. Aí está a liberdade, a moralidade e, consequentemente, a responsabilidade. Pelo menos até certo ponto, o Homem é senhor de si e dos seus actos.
O Homem é capaz de renunciar à satisfação imediata dos seus impulsos: é "o asceta da vida", escreveu Max Scheler. Por isso, é capaz de jejuar e ergueu, por exemplo, um edifício jurídico-penal, para evitar a vingança cega, dirimir diferendos, não fazer justiça pelas próprias mãos.
Quando vemos um animal sentado, de olhos fechados, com a cabeça entre as mãos ou encostada à mão direita, estamos em presença de um Homem que medita. Está ensimesmado, entrou dentro de si próprio, desceu à sua intimidade, submerso na sua subjectividade pessoal.
Não vivo longe de um aeroporto, e reparo, quando passeio pela praia, como os cães vadios da zona se põem a correr na areia, atrás das sombras dos aviões que se apressam para a pista. Cá está: o animal vive da imediatidade dos instintos e o mundo para ele é fundamentalmente um conjunto de estímulos, que atraem ou repelem. O Homem, ao contrário, dada a sua capacidade de distanciação, vive no real: é um "animal de realidades", repetia Zubiri.
O Homem "começou a ser Homem intentando criar beleza", escreveu o filósofo Pedro Laín Entralgo. O Homem não vive amarrado e encerrado na satisfação das suas necessidades vitais. Ele transcende o simplesmente biológico, criando cultura. E vive do gratuito: cria e contempla a beleza, pois é o ser "criativamente possuído pelo fascinante esplendor do inútil" (G. Steiner). Para sobreviver, não precisava de investigar na mecânica quântica. O que ganha no tempo dedicado aos mortos? No entanto, o tempo que gastamos inutilmente com os mortos!...
Os animais também comunicam. Mas nunca um animal fez perguntas. O Homem é o animal que pergunta. E perguntar coloca-nos na perplexidade, pois implica ao mesmo tempo saber e não saber. Se perguntamos é porque não sabemos, mas sobre aquilo de que nada sabemos não perguntamos. Afinal, o que sabemos, quando perguntamos? Na pergunta, o que se mostra é o imostrável. No perguntar, o Homem revela que é o ser do intervalo - entre o finito e o infinito - e que está ligado ao Transcendente, pelo menos como questão.
O Homem é um ser paradoxal. Somos bípedes sanguinários, capazes de sadismo feroz. Inventamos máquinas de guerra brutal e instrumentos de tortura indizível. Pilhamos, massacramos, somos de uma ganância ilimitada, de uma vulgaridade ridícula, de um materialismo rasteiro. No entanto, como escreveu o agnóstico George Steiner, "este mamífero desgraçado e perigoso gerou três ocupações, vícios ou jogos de uma dignidade completamente transcendente. São eles a música, a matemática e o pensamento especulativo (no qual incluo a poesia, cuja melhor definição será música do pensamento). Radiantemente inúteis, estas três actividades são exclusivas dos homens e das mulheres e aproximam-se tanto quanto algo se pode aproximar da intuição metafórica de que fomos realmente criados à imagem de Deus".
É por isso que, apesar dos avanços das ciências humanas, da genética, das neurociências, que devem ser maximamente promovidos, permanecerá, íntegra, a pergunta: o que é o Homem?

sábado, 30 de junho de 2007

Carta do Papa aos católicos chineses



BENTO XVI
DEFENDE DIÁLOGO
COM AS
AUTORIDADES CHINESAS




Bento XVI, com sentido sobrenatural e com uma linguagem eminentemente pastoral, se dirige a toda a Igreja que está na China. A sua intenção não é a de criar situações de atrito com pessoas e com grupos particulares: ele, mesmo pondo em evidência certas situações críticas, o faz com muita compreensão devido aos aspectos contingentes e pelas pessoas envolvidas, apesar de recordar com extrema clareza os princípios teológicos. O Papa deseja convidar a Igreja a uma mais profunda fidelidade a Jesus Cristo, lembrando a todos os católicos chineses a missão de ser evangelizadores no actual contexto concreto do seu País.
O Santo Padre observa com respeito e com profunda simpatia a história antiga e recente do grande Povo chinês e renova, uma vez mais, a disponibilidade para dialogar com as autoridades chinesas, ciente de que a normalização da vida da Igreja na China pressupõe um diálogo franco, aberto e construtivo com as Autoridades.
Bento XVI, assim como o seu Predecessor, João Paulo II, está também firmemente convencido de que tal normalização oferecerá uma inigualável contribuição para a paz no mundo, criando assim um marco insubstituível no grande mosaico da convivência pacífica entre os povos.
:
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Com que ideia ficarão dos portugueses?

HÁ QUEM CULTIVE
O PRAZER DA MALEDICÊNCIA Nas democracias, sobretudo nas mais maduras, é normal haver respeito pela liberdade de cada um, liberdade essa que não invade a liberdade dos outros. Também é óbvio que o direito de opinião deve ser respeitado. Acontece, porém, que muita gente pensa que, por respeito a esses direitos, cada um pode dizer e fazer o que quer e o que lhe apetece, mesmo com ofensas gratuitas e brincadeiras de mau gosto.
Tenho dificuldade em aceitar e em viver num clima desses. Criticar o que está mal, apontar erros e avançar com propostas para uma vivência democrática mais sã e mais justa está muito certo. Mas será que isso implica a ofensa, a calúnia, a mentira, o boato e a pura má-língua? Portugal vive, de há meses a esta parte, um clima impensável para uma democracia decente e respeitadora dos mais elementares direitos dos cidadãos. Por tudo e por nada, correm na Internet as mais aberrantes calúnias e as anedotas mais estúpidas e ofensivas das pessoas. Quando as pressinto, atiro-as logo para o lixo. Mas sei que há muita gente que adora difundi-las, só pelo prazer de cultivar a maledicência. Paralelamente, há mensagem lindíssimas e informações oportunas, que dá gosto ler e meditar. Agora as brincadeiras de mau gosto têm vindo ao de cima, envolvendo membros do Governo. Processos judiciais e demissões estão na moda. Não sei se será mais grave isso ou permitir que esse ambiente continue, criando instabilidade nos departamentos estatais. Nas empresas privadas não há tempo, decerto, para atitudes semelhantes, que eu saiba.
Gente a acusar-se mutuamente de forma torpe, não estará correcto. Pactuar com ela, também não. Cá para mim, tudo isto só é possível por haver quem, em vez de trabalhar, passa a vida com mexericos, alimentando ataques pessoais e guerras partidárias. Quando os políticos da UE se instalarem por cá e quando começarem a olhar para este clima de brincadeira pegada, com que ideia ficarão dos portugueses?
Fernando Martins

A propósito das missas em latim

A PACIÊNCIA DO ESPÍRITO SANTO
:
Sou do tempo das missas em latim, com o celebrante de costas para a assembleia. Isto aconteceu na Igreja Católica durante séculos, por razões que não importa agora recordar. Imagino que o Espírito Santo teve, durante esse tempo todo, uma paciência incrível para segurar o povo dentro das igrejas, à espera que os celebrantes acabassem de ler e dizer uma frases em latim, que quase ninguém entendia. Entretanto, as pessoas iam tendo a percepção de que era importante orar e, pelo sim pelo não, lá iam rezando o terço até à bênção final. Quando eu era garoto, nem homilias havia com regularidade na Gafanha da Nazaré. Depois do concílio Vaticano II, convenci-me de que as eucaristias, nas Línguas das gentes com quem e para quem eram celebradas, jamais deixariam que desenterrassem o latim para as liturgias comunitárias e dirigidas ao povo. Pelo que sei, ainda há católicos saudosistas desses tempos. Há tempos alguém falava-me da importância do mistério que representava a missa em latim. O Santo Padre, que agora aprovou a possibilidade de serem celebradas missas segundo o rito anterior ao Vaticano II, possivelmente até em latim, estará a admiti-las, certamente, para casos especiais ou para grupos restritos ou, provavelmente, para celebrações com participantes de várias nações. O pior, a meu ver, será se a moda pega e se, por tudo e por nada, alguns sacerdotes se convencem de que as missas em latim são mais bonitas e mais misteriosas, e também, por isso, com mais capacidade para aproximar as pessoas de Deus e dos irmãos. Cá para mim, espero que a moda não pegue. Já imaginaram estarmos a participar numa eucaristia, sem percebermos nada do que o celebrante está a dizer?
Fernando Martins

Papa vai dirigir carta aos bispos



Missas no Rito antigo
estão de volta


A Santa Sé anunciou oficialmente que Bento XVI aprovou a utilização univer-sal do Missal promulgado pelo Beato João XXIII em 1962, com o Rito de São Pio V, utilizado na Igreja durante séculos.
Segundo o comunicado divulgado esta manhã, representantes de várias conferências episcopais estiveram reunidos no Vaticano com o Papa, durante uma hora, para falarem do "Motu proprio" de Bento XVI sobre esta questão. A reunião foi presidida pelo Cardeal Tarcisio Bertone, Secretário de Estado do Vaticano.
O Rito de São Pio V, que a Igreja Católica usava até 1962 e que foi substituído pela liturgia do "Novus Ordo" (Novo Ordinário) aprovada como resultado da reforma litúrgica do Concílio Vaticano II, é assim aprovado para uso universal. O Papa estende a toda a Igreja de Rito Latino a possibilidade de celebrar a Missa e os Sacramentos segundo livros litúrgicos promulgados antes do Concílio.
A publicação do documento de Bento XVI, que será acompanhado por uma "longa carta pessoal do Santo Padre a cada Bispo", está prevista para os próximos dias.
Esta aprovação universal significaria que a Missa do antigo Rito poderá ser celebrada livremente em todo mundo, pelos sacerdotes que assim o desejarem, sem necessidade de autorização hierárquica de um Bispo.
Os livros litúrgicos redigidos e promulgados após o Concílio continuarão, contudo, a constituir a forma ordinária e habitual do Rito Romano.
O Rito resultante da reforma litúrgica conciliar instituía uma nova forma de celebrar a missa que revogava, não o uso do Latim, mas o uso do anterior Rito de S. Pio V. O "Novus Ordo" tem também uma versão em Latim.

Fonte: Ecclesia

sexta-feira, 29 de junho de 2007

Citação


"O riso é a mais útil forma da crítica porque é a mais acessível à multidão"


Eça de Queirós,
in PÚBLICO de hoje
:
NOTA: Esta simples citação do grande Eça trouxe-me à memória um livrinho que li há muitos anos sobre o romancista de "A cidade e as serras", o primeiro romance que dele li. Chama-se o livrinho "O espírito e a graça de Eça de Queiroz", preparado por Luiz de Oliveira Guimarães, com prefácio de Fradique Mendes, como se lê logo na capa. Edição da Romano Torres, com data de 1945.
Li-o com prazer e recordei-o hoje, por artes nem sei de quê.
Deste livro transcrevo:

"Portugal é um país que todos dizem que é rico, povoado por gente que todos sabem que é pobre"
:
"Um dia, em Paris, quiseram que Eça de Queiroz subisse em balão. Recusou.
- Eu não sou político, meus amigos!
E, depois dum silêncio, esclareceu:
- Só os políticos é que conhecem a complicada arte de se equilibrarem nos ares!"
:
"Atenas produziu a escultura, Roma fez o direito, Paris inventou a revolução, a Alemanha achou o misticismo. Lisboa que criou? O Fado"

Museu Paroquial da Gafanha da Nazaré







UM ESPAÇO MUSEOLÓGICO
QUE MERECE SER VISITADO

No sábado, 23 de Junho, foi inaugurado o Museu Paroquial da Gafanha da Nazaré, em cerimónia simples que contou com a presença de D. António Francisco dos Santos, Bispo de Aveiro, servindo de cicerone o Prior da freguesia, Padre José Sardo Fidalgo.
Penso que toda a gente compreenderá a importância de um espaço museológico como este, onde se preservam peças que fazem parte integrante da história da comunidade católica da Gafanha da Nazaré.
Para além de paramentos da igreja primitiva, que foi inaugurada em 1912, os visitantes podem apreciar outras peças de muito valor, simbólico e não só, como castiçais, jarras decorativas, cálices e turíbulos, píxides e custódias, navetas e missais. Há imagens dos primeiros tempos da igreja, um livro de actas da Irmandade de Nossa Senhora da Nazaré, dos princípios do século XX, uma bandeira da mesma irmandade, com data de 1941, e muitos outros motivos para uma visita atenta.
As paredes do Museu estão bem decoradas com painéis do artista Manuel Correia, alusivos à parábola do Filho Pródigo. Um trabalho muito expressivo e de rara sensibilidade, que merece ser olhado com olhos de ver.
A comunidade católica da Gafanha da Nazaré está de parabéns. O que é preciso, agora, é que todos visitem este Museu Paroquial, enriquecendo-o, se puderem, com peças que tenham pertencido à paróquia, uma vez que, segundo lá se recorda, em legenda bem visível, há património da freguesia que anda perdido e que ainda não foi possível recuperar.

Fernando Martins

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