O PÚBLICO inseriu hoje nas suas páginas uma extensa entrevista com D. Manuel Clemente, Bispo do Porto, que transcrevo para o meu blogue, atendendo à importância e à oportunidade das suas reflexões. Na íntegra, para quem gostar e tiver tempo.
Um trabalho de Teresa de Sousa.
Há povos-cais, onde se chega e de onde se parte.
Julgo que é essa a nossa condição
O seu olhar sobre o mundo e sobre o país transmite o tempo de uma instituição milenária. Não se angustia com a pressa do tempo presente. Atravessa os séculos como se tivessem sido ontem. Mesmo que sem ilusões. D. Manuel Clemente, 62 anos, bispo do Porto desde 2007, remete tudo à pessoa e às pessoas. O confronto mundial entre culturas diferentes ou o imperioso reconhecimento que temos de fazer de nós próprios, enquanto portugueses. Como sair deste "tempo de escombros"? A resposta está na última encíclica de Bento XVI. "Com uma nova síntese humanista."
"Tempo de escombros", palavras muito fortes com que se refere aos tempos actuais no diálogo epistolar com José Manuel Fernandes que foi agora editado. Vivemos uma tripla crise: a nossa, a europeia, que é como se fosse nossa, e a crise mundial ou, se quiser, do lugar do Ocidente no mundo. São estes os tempos de escombros a que se referia?
Era a esses escombros, sim. Aquilo a que também se refere a expressão "pós-modernidade". Como sabe, desde o pós-guerra que aquelas certezas muito sólidas, aquelas ideologias duras e aqueles desígnios colectivos que nos embalavam até aí começaram a fragmentar-se. E é nesse sentido que apareceu, nessa conversa, a palavra "escombros". É o que resta de uma casa que, de repente, ruiu. E esses escombros não são apenas arquitectónicos, são também mentais e culturais. É muito difícil hoje vivermos num universo verdadeiramente conjunto e conjugado. Cada um faz, mais ou menos, o seu universo. E, neste ambiente - nesta atmosfera, como dizem os homens da pós-modernidade -, é muito difícil estabelecermos um diálogo aceite e perspectivado para alguns objectivos pré-definidos.
Desaparecem as certezas e as referências, as fronteiras deixam de existir, a globalização une e divide ao mesmo tempo. São perigosos estes momentos?
São, mas são também inevitáveis porque a humanidade é isso, é evolução. Em primeiro lugar, nunca se acrescentou tanta novidade, quer técnica quer também cultural, como nas últimas décadas. Nós, hoje, com este acesso imediato à informação e ao que é novo, aprendemos numa década - ou, pelo menos, apreendemos, quando não as sofremos - mudanças que três ou quatro gerações atrás eram de uma vida inteira, se fossem.