Trabalho: uma afirmação de liberdade e responsabilidade!
A propósito da proposta directiva, aprovada pela União Europeia, em 10 de Junho de 2008, e sobre a qual escrevi um texto de partilha, no passado dia 23 de Junho, com o título “A exploração, a dignidade do trabalho e o lugar do homem”, que permite alargar o limite do horário de trabalho até às 65 horas semanais, já muito se escreveu e disse. Nestes assuntos, que colocam de um lado empresários e do outro lado trabalhadores, a unanimidade é quase impossível, pois os interesses, das duas partes, raramente são os mesmos.
Seria bom que todos estivessem do mesmo lado e ainda não perdi a esperança, sinceramente, de que, um dia, tal objectivo seja atingido, para o bem das empresas, dos empresários, dos trabalhadores e da sociedade em geral.
Sei que não é fácil fazer destes desejos realidades, pelo que muito tem que mudar a nível de mentalidades, atitudes e comportamentos de todos os intervenientes, a não ser que, mais ano menos ano, o desespero tome, de vez, conta do homem, e a selva, em que o mundo se está a transformar, faça sobressair o lado mais negro e sombrio do ser humano, do qual a violência é a expressão mais sinistra e desumanizante!
Contudo, não posso nem devo calar-me perante as palavras de um alto dirigente da sociedade portuguesa, a propósito desta directiva da UE, ao afirmar que os trabalhadores se devem preocupar mais em preservar os seus postos de trabalho do que estarem a pensar em questões de legislação laboral. Sem comentários!
As múltiplas crises que estão espalhadas um pouco por todo o lado dão-nos sinais claros de que o limite da capacidade de compreensão do cidadão comum está a ser atingido. Ora, quando assim é, o passo para a irracionalidade humana é rápido e de consequências imprevisíveis, pelo que tudo tem que ser repensado e refundado, já não só a nível dos conceitos económicos ou das políticas que vão gerindo (mal) o mundo, mas do próprio conceito de liberdade.
As crises são cada vez muito mais profundas (e disso já não vale a pena duvidar) e radicam nos estímulos pessoais e sociais com que avaliamos tudo o que nos cerca, em todos os tempos e lugares. Trata-se, portanto, de uma crise de valores, sejam eles históricos, culturais ou absolutos, ainda que os dois primeiros nunca se devam sobrepor aos valores do próprio individuo (os absolutos), desde que este os exerça no uso pleno e sadio de todas as suas faculdades mentais e tenha como objectivo não só o seu próprio bem, mas igualmente o bem-estar dos outros.
Uma sociedade, qualquer que seja, só é doente na medida em que os homens que mais responsabilidades têm na sua liderança, seja da coisa pública ou não, também padeçam da mesma doença e a transmitem aos seus concidadãos como se de uma epidemia silenciosa se tratasse. Homem saudável é aquele que sabendo que, livremente, pode fazer mal opta, também de forma livre, por fazer o bem, pois esse é o primeiro desejo que ele tem para si mesmo, pelo que ele não se pode contradizer na sua pessoa.
Deste modo, cada homem é, em grande parte, a medida do bem ou do mal dos outros, através da forma como exerce a sua liberdade e a sua responsabilidade em si mesmo e com quem interage activamente.
Infelizmente, não falta por aí quem procure separar a responsabilidade da liberdade, dando mesmo a entender que a primeira limita a segunda.
Nada mais falso e perigoso! O homem deve entender que a responsabilidade não limita a liberdade, antes faz parte dela, na medida em que é através dela que a liberdade não passa de um conjunto de instintos e impulsos incontrolados, ao sabor das circunstâncias e dos caprichos de momento. De outro modo, o risco da manipulação, por parte dos que teimam em propagar as suas próprias doenças aos outros, é constante e, muitas das vezes, uma necessidade para que se julguem ou finjam felizes. E isto já está a acontecer, infelizmente!
Vítor Amorim