O QUADRO PRETO E AS LOUSAS
Caríssima/o:
Parece que estou a ver-nos a espreitar pela porta para olhar a sala onde ia ser o exame: aquilo é que os quadros eram grandes e pretos!
Assim era de facto: sala que se prezasse tinha um bom quadro preto na parede! É que havia-os grandes e pequenos, com e sem moldura, contra a parede ou em cavalete de madeira, cinzentos ou pretos... E nós medíamos a categoria da escola pela do quadro!
Era ainda motivo de aferição o facto de ter ou não linhas horizontais marcadas com vincos regulares; isso sim, quadro de primeira – fazer essas linhas com giz quando precisas, para as apagar juntamente com o nosso trabalho, era para esquecer...
Outro pormenor importante: a prateleira a todo o comprido da pedra e onde se depositava a esponja e o giz; se com requinte e rebordo para suportar tudo sem cair pó nem nenhum dos paus de giz, aí quase pedíamos para escrever ou fazer contas ...
Claro que nesses nossos tempos, luxo era podermos utilizar a esponja; para o dia a dia, lá estava o pano mais ou menos húmido para “safar” e deixar a superfície reutilizável em condições razoáveis... Quando o pó era demasiado, vinha a trabalheira de termos de lavar o quadro... E este pó variava conforme a qualidade dos pedaços de gesso que aproveitávamos para os nossos trabalhos no quadro; daquela vez que se levou um para a sala que fazia só riscos vincados, foi o bom e o bonito! O que o levou cheio de boa vontade apanhou um raspanete... (Não falo em giz de cor; seria caso para perguntar se saberíamos o que era isso?)
Também de ardósia, a nossa lousa. Aí fazíamos a quase totalidade dos trabalhos escritos: aprendíamos a desenhar as primeiras letras, os números; aí riscávamos as cópias, os ditados, as contas e os problemas; os mais dotados de mãos desenhavam maravilhas que o dedo impiedoso apagava!
E a lousa era mágica: rectangular, 30X20 cms, rígida (logo podia pôr-se sobre os joelhos, pousar-se sobre a carteira ou colocá-la no chão...). Para escrever nada mais que um ponteiro do mesmo material; uns, delgados e longos com a parte de cima envolvida num papel colorido, outros mais grossos ..., mas o normal eram uns restos dos que se iam partindo e que aproveitávamos pois um novo custava um tostão e dinheiro em tempo de guerra era coisa não vista.
Será bom esclarecer que tinha à volta um caixilho de madeira com o mérito de nos permitir escrever o nome e, claro, não deixava que se apagasse o trabalho que estava na parte de trás.
Contudo o mais inovador nestas lousas era o sistema de apagar ou safar: o normal era a cuspidela bem medida e o dedo, para as emendas curtas e rápidas; agora para apagar toda a superfície havia dois métodos: para as meninas, a utilização de uma “esponja” de pano; para os rapazes o normal era o cotovelo da camisola ou quando muito a palma da mão! Isto dito assim é capaz de chocar alguns elementos das brigadas ambientalistas..., mas o certo é que o ritmo de trabalho era absorvente e ouvíamos logo a voz imperativa:
- Ora vamos aos problemas!
E a lousa tinha de estar pronta para a nova tarefa...
De vez em quando, mas com certeza em vésperas de exame, a limpeza da ardósia e do caixilho era verificada!...Tudo bem lavado, esfregado e, acontecia com frequência, os caixilhos raspados com uma faca. Para a ardósia ficar mais pretinha... usava-se um pingo de azeite...
Quem aí que ainda tenha a sua velhinha lousa?
Manuel