Corrida difícil a que não faltam candidatos
Todos os países passam por momentos de perplexidade, dados os problemas a enfrentar, com propostas e soluções sempre mais difíceis e complexas. Pouco tempo passado das eleições europeias, com o amargo de boca e o desconforto das muitas abstenções, o anúncio, para breve e já com data marcada, das legislativas e autárquicas, faz viver um desses momentos, que não deixam tranquilos os responsáveis da nação, nem os cidadãos mais atentos. A menos que se pense que a solução dos problemas é só dos políticos ou a da terra queimada…
Muitos problemas se perfilam neste horizonte, em que já se multiplicam rumores, se jogam previsões, se anunciam candidatos, se insinuam ameaças, se profetizam desgraças. Ao povo, comunicação social e políticos não lhes falta imaginação.
Fala-se, com alguma razão, do descrédito da classe política; dos problemas graves não resolvidos; dos motivos conhecidos que levam à escolha dos novos candidatos; dos já eleitos antes que os votos cheguem às urnas; da crispação social e da ausência de esperança; das soluções propostas em anteriores legislaturas, que, por vezes, se agravaram os problemas que pretendiam resolver; dos políticos medíocres que querem tronos que excedem a sua estatura; da classificação, nada democrática, de os adversários normais se considerarem inimigos detestáveis; dos cidadãos de primeira, que têm tudo, mesmo sem o pedir, e dos cidadãos desqualificados e anónimos, que se vão cansando de gritar e de esperar pela resposta a direitos, não respeitados nem atendidos.
Portugal, ainda sem tempo suficiente para ter amadurecido politicamente, foi-se politizando, mais por influência de grupos, mais marcados por ideologias pobres e ânsia de poder, do que por compreensão do regime democrático e dos objectivos do bem comum, que devem ser o clima de respeito e o motor de decisão para participar e governar.
Parece urgente uma reflexão de senso comum, que, mesmo assim, em muitos casos já não vai a tempo, em virtude de compromissos assumidos, de influências locais, de caminhos mal pensados, mas abertos, por onde se passa e se chega ao sítio desejado.
As eleições legislativas e autárquicas estão mais próximas do povo do que as europeias. Os candidatos a escolher e a propor ao escrutínio eleitoral são mais conhecidos pelos eleitores a quem não escapa o juízo realista sobre as suas qualidades e defeitos, nome e fama, êxitos e fracassos pessoais, profissionais e cívicos, pelo trabalho antes realizado ou aproveitamento dos cargos onde se ganharam influências mas se perdeu o nome.
Legislar não se compadece com pessoas que pouco mais vêem que os seus interesses e os do seu partido. Não nos venham dizer que basta que alguns saibam ver o alcance das leis que se fazem e aos outros, a maioria, apenas resta votar como lhes é mandado. O país paga a todos por igual, para que, por igual, todos saibam o que fazer, a favor de todos. A situação lastimável a que se chegou com algumas leis é culpa maior dos responsáveis pela escolha, por vezes insensata e por motivos ocultos, dos candidatos a legisladores.
As autarquias, por sua vez, são hoje lugar de responsabilidades acrescidas, campo minado, ocasião de tentações. São, por isso, instâncias de exigência, maior e permanente de honestidade, de saber e competência, capacidade de acolhimento, diálogo e aguda sensibilidade, trabalho de equipa e abertura a todos.
Motivos de escolha para pagar favores, compensar perdas e desgostos políticos, por pressão de grupos e manobras locais, aparecem como desonestidade cívica, desrespeito pelos eleitores, colocação de interesses pessoais e partidários acima dos nacionais e locais. Governa-se com pessoas normais, desde que se saiba o que significa a normalidade, os seus limites e exigências. Neste juízo, cabe a lucidez sobre a capacidade dos candidatos a propor.
António Marcelino