Crónica de Frei Bento Domingues
no PÚBLICO
1. Ó Deus, Trindade Santa,/ ó luz mais radiosa que toda a luz,/ fogo mais ardente que todo o fogo,/ Tu és um oceano, a paz,/ Tu és um mar sem fundo,/ mais eu mergulho, mais eu me afundo,/ mais eu Te encontro, mais eu Te procuro ainda./ Sede que Tu saciaste no deserto um dia,/ para sempre ficar com sede de Ti.[1]
Esta oração é um poema. Não precisa de comentários. Traz consigo a sua própria inteligibilidade simbólica. Pode exigir uma iniciação, mas nunca a sua substituição.
Tentei, desde muito cedo, inscrever-me numa corrente de pensamento teológico que pratica a modéstia subversiva como atitude básica da inteligência da fé. Estou a referir-me a S. Tomás de Aquino que, em poucos anos de vida – morreu aos 49 anos – produziu uma obra monumental de análise filosófica, de exegese bíblica, de selecção patrística, sempre em confronto aberto e criativo com as várias correntes do seu tempo, de horizontes culturais e religiosos muito diferentes. Ditou um impressionante e rigoroso guião para principiantes na investigação teológica, para que não se perdessem na floresta de opiniões para todos os gostos[2]. Procurou abrir novos caminhos, na escola de Alberto Magno. Mas os pseudo discípulos viram nesse guião um repouso, uma preguiça, um substituto de constantes interrogações. Como escreveu Umberto Eco, fizeram de um incendiário, um bombeiro. Um pensador subversivo e condenado foi promovido a padroeiro de uma ignorante ortodoxia.