Jesus vai a caminho da casa do Centurião para satisfazer o seu pedido: curar um servo muito estimado que estava quase a morrer. É surpreendido por uma delegação de notáveis anciãos que vem ao seu encontro. Acolhe-a com solicitude e ouve a “carta” de recomendações que trazia: Estima a nossa gente e mandou construir a sinagoga; é digno de ser atendido.
Esta declaração destaca um modo contrastante com o habitual. O exército romano ocupante impunha as suas leis e promovia os seus símbolos; frequentemente menosprezava ou destruía os vestígios locais da identidade das populações. Interessar-se pelos súbditos e promover o seu bem-estar era estranho e tornava-se merecedor de uma atenção especial. O cuidado revelado pela vida e saúde do servo mostra o ambiente próximo e familiar que cultivava com todos os que o rodeiam e servem. O recurso aos anciãos judeus e aos amigos enviados põe em realce a rede de relações sociais e religiosas que mantinha e apreciava.
Lucas, o autor da narrativa, faz-nos ver uma figura simpática, cheia de humanidade e de solicitude; uma pessoa reconhecida na autoridade que exerce e nas convicções que alimenta; um estranho a nível religioso – era pagão - embora com sinais de grande simpatia pelos judeus e de reflectir nos comentários que lhe chegam a respeito de Jesus de Nazaré -, homem notável em Cafarnaúm, próximo do mar de Tiberíades.
“Nem mesmo em Israel encontrei tão grande fé”, exclama Jesus ao ouvir a mensagem que os amigos do centurião lhe trazem. Que se terá passado no seu coração para reafirmar de outro modo a necessidade de ajuda?! Antes, pedia que fosse a sua casa; agora, que diga apenas uma palavra e a cura seria alcançada. Mesmo à-distância! E visualiza a sua convicção com o exemplo da sua vida, do seu proceder. Uma palavra basta. Como acontece com ele quando ordena aos subalternos. Que grau de profundidade atingiu a sua consciência a respeito de Jesus! Que graça de iluminação o terá beneficiado para alcançar tal convicção que merece da parte de Jesus tanta admiração e tão grande elogio!
O retrato do centurião desenhado neste episódio dá rosto humano à pessoa de fé, humilde e solidária, confiante, suplicante e familiar; fé professada em público, perante os amigos e os notáveis da terra; fé em dinamismo de crescimento para a maturidade. Que actualidade interpelante para os tempos que vivemos!
Fé pessoal e não apenas de tradição ou meramente sociológica. Fé humilde alicerçada no reconhecimento da pequenez do ser humano, necessitado e fragilizado. Fé envolvente e solidária, activa, atenta aos outros e às suas limitações e capacidades. Fé confiante na solicitude de Jesus, o único alicerce seguro a quem vale a pena recorrer. Fé vivida em família e professada em público, sem falsos alardes ou inibições paralisantes das melhores energias da nossa humanidade sadia.
O centurião contagiou com a sua fé os anciãos e os amigos, beneficiou o servo, provocou a admiração de Jesus, fez ressoar perante a multidão o elogio mais genuino. E legou-nos a bela oração que rezamos antes de comungarmos: “Senhor, não sou digno…”. Fé que certamente viria a confirmar-se com novas razões, a partir da experiência pascal e do seguimento do Senhor ressuscitado.
O legado do centurião, agora enriquecido, está nas nossas mãos. Há muitas doenças a solicitar a nossa intervenção. Há pessoas boas cheias de recursos para a missão de anunciar e transmitir a fé. Há espaços humanos, especialmente marcantes, a exigir uma presença activa e alegre, marcada pela novidade que satisfaz os vazios da existência pessoal e da “secura” de muitos âmbitos da sociedade.
O Papa Francisco referindo-se ao papel da família afirma na «A Alegria do Amor»: “O exercício de transmitir aos filhos a fé, no sentido de facilitar a sua expressão e crescimento, permite que a família se torne evangelizadora e, espontaneamente, comece a transmiti-la a todos os que se aproximam dela e mesmo fora do próprio ambiente familiar. Os filhos que crescem em famílias missionárias, frequentemente tornam-se missionários, se os pais sabem viver esta tarefa duma maneira tal que os outros os sintam vizinhos e amigos, de tal modo que os filhos cresçam neste estilo de relação com o mundo, sem renunciar à sua fé nem às suas convicções”. AL 289.
A educação da fé cristã faz surgir um novo estilo de vida pautado pela amizade e vizinhança, pela relação humanizada com o mundo e suas realidades consistentes. Vale a pena considerar o exemplo do centurião e exultar com a sua fé tão elogiada por Jesus.