domingo, 9 de maio de 2021

Na morte adormeci e acordou-me Deus

A morte de um amigo é também a morte de algo em nós. No mais fundo do amor humano existe o desejo de eternidade.
1. As atitudes perante a morte foram e são muito diferentes de pessoa para pessoa, mesmo dentro da mesma época e da mesma cultura, religiosa ou não. No primeiro escrito cristão, é-nos dado a ler: “não queremos, irmãos, que fiqueis na ignorância a respeito dos que morreram, para não andardes tristes como os outros, que não têm esperança.” [1]
Mesmo quem julga que depois da morte não há mais nada pode não dispensar algum ritual que exprima o amor, o vazio, a saudade, o reconhecimento. A morte de um amigo é também a morte de algo em nós. No mais fundo do amor humano existe o desejo de eternidade: tu não me morrerás!
Os elogios fúnebres perdem-se, muitas vezes, a destacar o legado deixado por quem partiu. A obra passa a ser mais importante do que o seu autor: é esquecer que a grande obra de um ser humano é a de se tornar cada vez mais humano, em todas as suas relações.
Durante a pandemia, sobretudo nos momentos em que era mais difícil acompanhar os rituais da morte – velório, enterro, cremação –, muitas pessoas pediram-me para celebrar, mesmo à distância, a Eucaristia, na qual, por vezes, também não podiam participar. Esses pedidos, da parte de quem os faz, significam que a morte não é a última palavra sobre a existência humana. As orações e as liturgias são obra dos vivos que exprimem um paradoxo: já não podem viver nas formas de contacto e de comunicação com as pessoas que nos deixaram, mas também não aceitam que tudo tenha acabado. A morte é o impensável, mas faz-nos sentir a perda do outro em nós. Sabemos que a linguagem em torno da morte é sempre inadequada.

sábado, 8 de maio de 2021

Jesus e a Igreja. 4

Crónica de Anselmo Borges 
no Diário de Notícias 

Na Igreja, haverá líderes no, com e para o Povo de Deus, para celebrar nas comunidades e com as comunidades a Eucaristia: a vida, a morte e a ressurreição de Jesus e da Humanidade inteira. A Eucaristia é memória da última Ceia e também de todas as refeições que Jesus tomou concretamente com pecadores e excluídos, precisamente para indicar a presença e a actuação do Reino de Deus. Esses banquetes tinham causado profunda impressão nos discípulos. Jesus aliás comparou a realidade do Reino de Deus a bodas e banquetes. Não se trata, pois, do padre-sacerdote do culto ritual-sacrificial. Jesus rejeitou o sacerdócio judaico e o culto sacrificial do seu tempo, e nada indica que quisesse instituir um novo culto sacrificial. Ele próprio não era "sacerdote" nem nenhum dos "Doze" nem Paulo. As suas relações com o Templo e o culto nele realizado pelos sacerdotes foram de ruptura, de tal modo que foi o sacerdócio judaico que o levou à cruz. No Novo Testamento, a palavra "sacerdote" no sentido sacrificial-cultual foi evitada. A concepção sacrificial da Eucaristia, que implica a introdução do sacerdote, é posterior, tendo na sua base sobretudo a vontade de impedir a acusação de ateísmo pelo facto de os cristãos se recusarem a prestar culto aos deuses e não oferecerem sacrifícios.

sexta-feira, 7 de maio de 2021

Jesus convida-nos a viver a sua alegria

Reflexão de Georgino Rocha 
para o Domingo VI da Páscoa

São João, o discípulo amado que reclinou a cabeça no ombro de Jesus na ceia de despedida, deixa-nos em discursos sucessivos as confidências mais íntimas e profundas do Mestre, antes de ir para o Jardim das Oliveiras e iniciar o processo da paixão. As leituras de hoje convidam-nos a contemplar o amor de Deus manifestado na pessoa, nos gestos e palavras de Jesus e, agora, tornado presente na vida diária pelo amor dos discípulos. Na Igreja comunidade, núcleo da civilização do amor. Vamos acompanhar a narrativa e saborear a sua mensagem.
Em discurso directo, Jesus dá a conhecer as relações que mantém com Deus Pai e as que pretende que os seus discípulos cultivem e pratiquem. Não recorre a metáforas nem a símbolos. Fala de realidades sublimes em linguagem normal. E centra-as no amor em cadeia, que tem a fonte no Pai, toma o rosto humano em si mesmo, estende-se a quem o segue e ama como ele. Este é centro donde provém tudo quanto faz e diz. Este é o centro para onde converge a missão que confia à comunidade dos amigos. Este é o centro que gera a mais eloquente história de amor vivida de tantas maneiras, ao longo dos tempos, por pessoas de todas as idades e categorias sociais. Jo 15, 9-17

quinta-feira, 6 de maio de 2021

O que me espera todos os dias


Saí hoje por motivos de saúde e senti um ambiente já mais agradável, com temperatura a condizer com os meus anseios. Era meio da manhã e cruzei-me com muita gente conhecida. Nas esplanadas que dão para a Avenida José Estêvão predominavam alguns convívios próprios do café da manhã, que muitos desfrutam nos intervalos profissionais, nas horas de ócio, nas férias ou nas folgas das labutas diárias. E gostei, apesar de nem sempre haver os distanciamentos aconselhados e de alguns não estarem protegidos pelas máscaras, só desculpável por terem de tomar o café ao ar livre.
Face aos números do Covid-19, julgo que já podemos respirar fundo e olhar o futuro com mais confiança, também com a garantia das vacinas que a ciência nos ofereceu. Depois hão de vir uns comprimidos que, ao mais pequeno sinal, matam o vírus mais renitente.
Em casa abri o meu computador para retomar os meus hábitos de consultar os jornais e sites noticiosos de várias fontes. Ao abrir, deliciei-me com a paisagem que diariamente me espera e que vai variando conforme os meus apetites e épocas. E com ela fico mais sereno e mais aberto às belezas do mundo.

FM