Natália Faria (Texto) e Adriano Miranda (Fotografia) no Público
terça-feira, 21 de novembro de 2017
“Deus trocou o tempo para não sabermos mais do que ele”
Natália Faria (Texto) e Adriano Miranda (Fotografia) no Público
Festa de Nossa Senhora da Nazaré em 2018
Não sendo muito festeiro, não deixo de apreciar e valorizar as tradições que vêm dos nossos ancestrais. Quero sublinhar o verbo valorizar pela simples razão de que os tempos mudam, tal como mudam os gostos e as apetências das pessoas. Por isso, compreendo e aceito mudanças que possam enriquecer as tradições.
Tive pena, mesmo muita pena, quando na Gafanha da Nazaré deixou de se fazer a festa em honra de Nossas Senhora da Conceição, Padroeira de Portugal, no seu dia próprio, 8 de dezembro, ou no fim de semana mais próximo. Era a festa dos bacalhoeiros que nessa quadra já tinham regressado da faina maior.
Voltando à festa de Nossa Senhora da Nazaré, entristeceu-me a falta de mordomos que se empenhassem na organização dos festejos, nomeadamente, na componente profana, como aconteceu este ano. Contudo, no próximo ano já haverá festa, porque se organizou um grupo de homens e mulheres da nossa terra com coragem para avançar. Desejo que consigam não só levar por diante o seu projeto, mas também lhes peço que saibam estimular outros conterrâneos que aceitem seguir o seu exemplo no futuro.
segunda-feira, 20 de novembro de 2017
domingo, 19 de novembro de 2017
Um poema de Manuel António Pina — O nome do cão
O cão tinha um nome
por que o chamávamos
e por que respondia,
mas qual seria
o seu nome
só o cão obscuramente sabia.
Olhava-nos com uns olhos que havia
nos seus olhos
mas não se via o que ele via,
nem se nos via e nos reconhecia
de algum modo essencial
que nos escapava
ou se via o que de nós passava
e não o que permanecia,
o mistério que nos esclarecia.
Onde nós não alcançávamos
dentro de nós
o cão ia.
E aí adormecia
dum sono sem remorsos
e sem melancolia.
Então sonhava
o sonho sólido que existia.
E não compreendia.
Um dia chamámos pelo cão e ele não estava
onde sempre estivera:
na sua exclusiva vida.
Alguém o chamara por outro nome,
um absoluto nome,
de muito longe.
E o cão partira
ao encontro desse nome
como chegara: só.
E a mãe enterrou-o
sob a buganvília
dizendo: " É a vida..."
Manuel António Pina
primeiros poemas
todas as palavras
poesia reunida
assírio & alvim
2012
Nota: Por sugestão do caderno Economia do EXPRESSO
Eu gostava de envelhecer assim!
Uma crónica de David Marçal
— Quanto pagaria para ter mais tempo de vida saudável?
Bento Domingues — Teologia da libertação ou libertação da teologia? (2)
«Hoje, não posso esquecer que o Papa Francisco, o praticante e resistente da teologia da libertação e da libertação da teologia, instituiu o Dia Mundial do Pobre. Acontece neste Domingo. Se os pobres não estiverem na missa, é porque lha roubaram.»
1. Recebi, recentemente, três obras de três consagrados autores portugueses. Uma é de António Lobo Antunes, outra de Frederico Lourenço e a terceira de António Damásio. Uma pertence à criação literária, outra ao alargamento do nosso mundo bíblico e a terceira à investigação científica. Ninguém escreve como Lobo Antunes, ninguém pode ousar o que Frederico Lourenço consegue, a antropologia científica, filosófica e sapiencial de António Damásio é o guião e o mapa que nos faltavam para a fascinante viagem às raízes da vida, dos sentimentos e das culturas humanas. Mostra-nos como e porquê “os seres humanos acabam sempre por depender da maquinaria dos afectos e das suas ligações com a razão. Não há maneira de fugir a tal condição”.
Conhecer essa maquinaria ajuda a não sermos cegos a conduzir outros cegos para o desastre pessoal e colectivo. As investigações destinadas a saber quem somos, como somos, quem podemos e devemos ser, requerem a cooperação de todas as ciências e sabedorias. A cultura da cooperação é um caminho luminoso para nos irmos libertando do egoísmo, o inimigo público e privado do presente e do futuro da humanidade.
Repete-se que a ciência e a tecnologia podem ser usadas para melhorar o nosso futuro — o seu potencial continua a ser extraordinário — ou podem representar a nossa perdição. Pode-se continuar, por outro lado, a desenvolver a ideia de que o ser humano é uma paixão inútil que importa substituir por outra coisa mais limpa, mais inteligente e mais rentável. Essa coisa pós-humana já está configurada, mas continuo a não saber para quem.
Destaquei o novo livro deste investigador português, radicado nos EUA, porque, em primeiro lugar, preciso dele — talvez não seja o único — para perceber “a estranha ordem das coisas” na evidente desordem do mundo. Ao chegar ao fim, exprime uma atitude que é essencial à libertação da teologia. Permito-me transcrever: “Em primeiro lugar, e tendo em conta as imensas novas e poderosas descobertas científicas, é fácil ceder à tentação de acreditar em certezas e interpretações prematuras que o tempo se encarregará de rejeitar impiedosamente. Estou preparado para defender a minha actual visão sobre a biologia dos sentimentos, da consciência e das raízes da mente cultural, mas não tenho ilusões sobre a durabilidade dessa visão. Em segundo lugar, embora seja possível falar com alguma confiança das características e das operações dos organismos vivos e da sua evolução, e embora seja possível situar o início do respectivo universo há cerca de 13 mil milhões de anos, não temos qualquer relato científico satisfatório quanto à origem e ao significado do Universo, ou seja, não temos uma teoria de tudo que nos diga respeito. Serve isto para recordar que os nossos esforços são modestos e hesitantes, e que devemos estar a abertos e atentos quando decidimos abordar o desconhecido.” [1]
2. Se as lideranças da Igreja, os teólogos, os padres e os catequistas tivessem estes cuidados de puro bom senso teriam evitado, às comunidades cristãs, muitos falsos problemas no campo da criação cultural, das ciências, da acção pastoral e da ética. Não tomariam atitudes e decisões que pudessem impedir uma virtuosa abertura ao futuro, ao imprevisto e imprevisível.
Nota-se isto em muitos âmbitos, mas tornou-se uma tragédia que se aprofunda e alarga, dia a dia, em relação aos “ministérios ordenados” de solteiros e casados, sobretudo à declaração de que as mulheres nunca poderão receber o sacramento da Ordem. Poder-se-ia perguntar como é que se sabe tanto acerca do futuro e tão pouco acerca do presente?
Configuraram-se as instituições funcionais da Igreja para determinados contextos sociais e culturais que não podem ter garantias de eternidade. Não tendo isso em conta, acabam por deixar a vida pastoral em becos sem saída, paralisada. Abandonaram-se os avisos de Cristo: “para vinho novo, odres novos”; “o sábado é para o ser humano e não o ser humano para o sábado.” S. Paulo não se esqueceu: foi para a liberdade que Cristo vos libertou.
É muito importante a questão e a história da teologia da libertação, mas volto a dizer que é ainda mais decisivo libertar a teologia da ideologia, da visão distorcida da fidelidade confundida com a repetição do pré-definido, do pré-sabido e do sempre rezado, assim como era no princípio agora e sempre pelos séculos dos séculos [2].
Um dos modelos medievais da prática teológica, que sempre me deliciaram, estava ligado à interrogação sistemática, isto é, às questões disputadas (quaestiones disputatae). Tomás de Aquino, além disso, estava profundamente marcado pela teologia negativa, que nada tinha de niilista. Qualquer afirmação tinha de ser acompanhada de negação. Depois de descrever a sua teoria do conhecimento teológico e de mostrar a razoabilidade da afirmação da existência de Deus, diz que seria normal que se procurasse saber como é Deus, mas não podia ir por aí, pois só podemos saber como Ele não é. Esta é uma teologia da libertação da idolatria dos nossos conceitos da divindade [3].
Era o tempo da combinação do atrevimento, na teologia, com a virtude da modéstia na sua prática. Tomás de Aquino sabia unir o que outros separavam: procurar entender para crer e crer para entender.
3. Quando me perguntam qual foi o papel da teologia da libertação em Portugal, tenho de ter em conta vários aspectos para poder responder. A teologia académica, entre 1911 e 1968, esteve em perfeito jejum, como já referi. Não é uma interpretação. É um facto. Na maioria dos casos, a teologia dos seminários era de importação, de justificação do que estava mandado crer e pensar, preparava párocos. O padre Joaquim Alves Correia era um teólogo por conta própria. Testemunhava a Largueza do Reino de Deus, que lhe saiu caro, dada a estreiteza da ideologia dominante.
Existe uma produção histórica abundante sobre a relação da Igreja com o Estado Novo e o mundo dos católicos que a questionavam. Nessa produção não se fala de teologia da libertação nem da libertação da teologia, mas existiram ambas com os limites que as circunstâncias eclesiais e políticas impunham, mas o conhecimento dos seus percursos tem de ficar para outra crónica.
Hoje, não posso esquecer que o Papa Francisco, o praticante e resistente da teologia da libertação e da libertação da teologia, instituiu o Dia Mundial do Pobre. Acontece neste Domingo. Se os pobres não estiverem na missa, é porque lha roubaram.
Frei Bento Domingues no PÚBLICO
[1] António Damásio, A Estranha Ordem das Coisas, Círculo de Leitores, 2017, pp. 331-332.
[2] Quem desejar conhecer o que era a prisão da teologia nos anos 50 do séc. passado, leia o impressionante Journal d’un théologien (1946-1956), de Yves Congar, Cerf, 2000
[3] Summa Theologiae, q. III, Prólogo
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