Reflexão de Georgino Rocha
para o Domingo da Sagrada Família
Georgino Rocha |
Duas vezes, ouve José a voz do enviado de Deus que lhe diz: “Levanta-te, toma o Menino e sua Mãe”. Uma, para fugir para o Egipto. Outra, para regressar às terras de Israel. A primeira, porque o Menino corria perigo de vida. A segunda porque Herodes, o perseguidor, havia morrido. E José acolhe prontamente a ordem recebida e, com obediência confiante, dá-lhe seguimento. Mt 2, 13-15. 19-23.
Não hesita nem se queixa, apesar do nascimento ter sido há tão pouco tempo, da fragilidade do Menino, da debilidade de Maria. Não teme a noite, nem a incerteza e o cansaço da viagem. Dócil e ousado, faz-se ao caminho. Que belo exemplo nos deixa: prontidão em ouvir, generosidade em arriscar, disponibilidade para agir, fidelidade em obedecer, discernimento para acertar na opção a tomar, cuidado solícito em salvaguardar a sua família. José, movido pelo amor, realiza a missão recebida.
A fuga e o regresso, facto com algum fundo histórico, mas sobretudo simbólico e teológico, são aproveitados por Mateus para fazer uma excelente catequese sobre Jesus e a sua família. José, o esposo de Maria; Maria, a Mãe do Menino; Jesus, o filho de Deus, todos unidos pelo mais fiel amor, pela mais profunda comunhão, pelo maior desejo de fazer o que o enviado de Deus havia anunciado como promessa e, agora, se realiza neles e por eles. Hoje, celebramos a Festa da Sagrada Família de Nazaré, referência insubstituível para “todo o que faz a vontade de Meu Pai que está no céu”, dirá Jesus mais tarde - Mt 12, 50, acrescentando: “Esse é Meu irmão, Minha irmã, minha Mãe”. Referia-se aos discípulos, a nós, à Igreja que somos a Sua nova família.
Para Jesus tudo converge e dele tudo dimana: a plenitude dos tempos da comunicação de Deus aos homens, os cuidados de Maria e de José, a exuberância dos cantares dos anjos, a visita apressada dos pastores, a longa peregrinação dos reis sábios. Ele é verdadeiramente o centro das atenções de todos e de tudo. Até as estrelas brilham com novo fulgor e as ofertas com simbolismo mais rico. Realmente a manjedoura do curral dos animais faz-se a primeira casa de Jesus. No nascimento do Menino, é envolvido o próprio universo e redimensionado o curso da história.
A noite surge como o tempo privilegiado para o agir de Deus: Acontece o Natal, dá-se a fuga de José com a sua família para o Egipto, donde regressa após ter sido avisado em sonhos. Estranho modo de proceder. Para nos alertar e interpelar. Ao longo da vida de Jesus, a noite brilha com novo fulgor. As trevas são dissipadas pela luz de Cristo. A escuridão dos espíritos é iluminada pela verdade que liberta e pelo amor que humaniza, a vida é dignificada, a família protegida, a paz alicerçada na justiça. A noite contém encantos que urge decifrar e apreciar. Até a noite mística, a dos sentidos espirituais.
José toma o Menino e sua Mãe. Bela realidade que nos deixa encantados. Toda a criança tem pais conhecidos, sobretudo tem mãe, a sua mãe. A sua e não outra. A experiência de relação e de pertença é estruturante do ser humano. Sem esta, por melhores que sejam as substituições, fica empobrecida a natureza filial e definhada a ternura materna. Feliz a família que sabe acolher os filhos, criar-lhes relações de apoio estabilizador, acompanhá-los no desabrochar da verdade e dar-lhes alento às “asas” da liberdade para voarem, mantendo acessível e encorajante o rumo da vida digna.
Com o Papa Francisco rezemos cheios de confiança: Sagrada Família de Nazaré, desperta na nossa sociedade a consciência do caráter sagrado e inviolável da família, bem inestimável e insubstituível. Cada família seja morada acolhedora de bondade e de paz para as crianças e para os idosos, para quem está doente e sozinho, para quem é pobre e necessitado. Jesus, Maria e José a vós com confiança rezamos, a vós com alegria nos confiamos.
Pe. Georgino Rocha