"Levanta-te e vai, ergue o teu coração
e a tua mente para o alto"
Jesus propõe a parábola para confrontar dois modos de nos relacionarmos com Deus, retratados nas atitudes do fariseu e do publicano, as duas “classes” mais expressivas para os ouvintes. O fariseu representa a ortodoxia legal, fiel cumpridor (até com requinte) dos seus deveres, auto-satisfeito na sua “burguesia espiritual”, displicente em relação aos demais porque não eram como ele. Apresenta-se cheio de méritos (pensa no íntimo do seu coração), relata tudo o que faz e espera ser reconhecido por Deus. Vive, confiante, no êxito da cobrança que a sua oração evidencia e o seu comportamento atesta. Por isso, mantém-se de pé, rosto erguido, em lugar destacado. Bom retrato, também, para o nosso tempo, ufano de si mesmo e dos seus êxitos, em que uma minoria se exibe face à crescente multidão dos empobrecidos e desconsiderados.
O publicano fica à distância, não ousa ultrapassar a entrada, bate no peito, prostra-se no chão, mantém o olhar de penitente e exclama: “Meu Deus, tende compaixão de mim que sou pecador”. É toda a sua oração. Não explicita mais nada, nem cede às aparências. A lista dos seus pecados fica no silêncio do coração humilhado e contrito. Nem sequer ergue os olhos ao Céu e menos ainda para quem possa estar a observar a sua prostração.
A atitude do publicano é elogiada por Jesus. Não se compara com ninguém. Apenas se revê no espelho de Deus e dá conta de quão desfigurada está a sua dignidade original. Toma consciência da gravidade do seu pecado. Mostra a intensidade do seu desejo de ser perdoado. Quer recuperar a sintonia com o ritmo do pulsar de Deus. Espera, confiante, no amor misericordioso que é sempre maior do que os seus/nossos pecados.
A parábola, ao confrontar estas duas atitudes, evidencia a quem cada um se referia: o deus legalista, severo, justiceiro, juiz de acções e omissões, parcial e vulnerável a méritos adquiridos ou mesmo cobrados; ou o Deus terno e misericordioso para com as pessoas que se reconhecem na sua dignidade ferida e lhe suplicam amor e perdão; o Deus atento e compassivo, pronto para a benevolência e lento para a recriminação face a toda a espécie de prevaricações, pois conhece bem o “barro” de que somos feitos e quer mostrar-se, até, nas nossas debilidades.
A segurança espiritual está neste Deus amor e não em nós mesmos e nas nossas acções. O perdão é para todos e não apenas para uma elite aristocrática que colecciona méritos. Ser pessoa de Deus não é falar do divino com eloquência, mas cuidar bem do humano, com dedicação abnegada. E há tanto que fazer, tal o clamor dos empobrecidos e vulneráveis, confiados, por Deus, à nossa solicitude diligente e ao nosso empenho constante por uma sociedade humanizada e por uma Igreja mais próxima e acolhedora.
Termina hoje, em Portugal, a Semana Nacional da Educação Cristã, semana que a Comissão Episcopal correspondente assinala com uma excelente mensagem de que destacamos dois parágrafos. A vida cristã tem realmente beleza e força, porque é encontro e adesão a uma pessoa, Jesus Cristo vivo, que nos convida a ser seus amigos e a segui-lo por um caminho novo que conduz a uma vida plena. «Levanta- -te e vai» constitui, além do mais, apelo à conversão a Jesus Cristo, guia e perfeição da nossa fé…
«Levanta-te e vai», ergue o teu coração e a tua mente para o alto, invoca e acolhe a vida nova do Espírito e vai ao encontro dos outros, para lhes levar a luz da fé e a alegria da esperança. Trabalhamos para Ele e com Ele.
Georgino Rocha