sábado, 19 de setembro de 2015

Refugiados: que solução?

Crónica de Anselmo Borges 


«Os entendidos prognosticam 
uma terceira onda migratória, 
devida à mudança climática 
que afectará sobretudo os países do Sul»

1. Ninguém pode ignorar. As imagens são trágicas, de horror: homens, mulheres, crianças, a correr ou encurralados, fugindo da morte e em busca de um sítio para a esperança. E sabe-se que não se pode ficar indiferente e que é preciso agir. Em nome de quê? Em nome da humanidade que a todos une, independentemente de culturas, línguas, religiões diferentes. Em nome de valores fundamentais que definem a Europa: a dignidade, a solidariedade, os direitos humanos. Em nome das raízes cristãs. Merkel disse bem: também porque somos cristãos. E há um investimento demográfico.
A afirmação mais revolucionária da história pertence a Jesus: "O homem não foi feito para o sábado, mas o sábado para o homem." A salvaguarda do sábado era um preceito que se dizia divino. Mas Jesus, transgredindo a lei, curava ao sábado, dizendo assim que o critério da sua interpretação deve ser a defesa da vida e a realização do ser humano, de todo o ser humano. E, em consequência, lá está o capítulo 25 do Evangelho segundo São Mateus com o chamado "Juízo Final", no sentido da verdade que deve percorrer a existência humana e a história: "Vinde, benditos de meu Pai, porque tive fome e destes--me de comer, tive sede e destes-me de beber, estava nu e vestistes-me, na cadeia ou no hospital e fostes ver-me." Nada se pergunta de directamente religioso ou confessional.

2. O homem é rácio-emocional: afectivo, movido por emoções, mas, ao mesmo tempo, racional, devendo conduzir-se pela razão. A razão sozinha pode ser cruel, mas a simples bondade emotiva, sem inteligência, pode levar a problemas maiores e a becos sem saída.
Naquilo que nos ocupa, isto significa que não basta o sentimento. Assim, é uma lástima que a Europa seja incapaz de unir-se para encontrar solução para este problema gigantesco dos refugiados e dos fluxos migratórios, que só pode ser minorado dentro de uma política comum e na colaboração dos Estados, da sociedade civil, de organizações religiosas, como pediu Francisco. Exige-se generosidade e competência e eficiência, mas acompanhadas da necessária lucidez, como manda também o Evangelho: "Simples como as pombas, prudentes como as serpentes." A política de acolhimento de refugiados e outros não pode dar azo ao incremento da extrema-direita política, com incitamentos racistas e xenófobos. Aí está a necessidade de atacar os traficantes de pessoas e a atenção a possíveis infiltrações jihadistas. Como já aqui tenho escrito, será preciso atacar e destruir com a força das armas, no terreno, o bárbaro e intolerável autoproclamado Estado Islâmico.

3. Somos inocentes em relação a esta tragédia? Claro que não. E não é preciso estarmos constantemente a massacrar-nos com a história, verdadeira, da exploração: os impérios coloniais, o ouro da América, o tráfico de escravos, a divisão da África no século XIX, a divisão do Médio Oriente na sequência da I Guerra Mundial... Lembro apenas o que sucedeu mais recentemente com a insensatez das guerras no Iraque e na Líbia, levadas a cabo pelos Estados Unidos e a Europa. Como escreve o filósofo Bernardo P. Andreo, estas são as causas próximas da tragédia. A Guerra do Iraque "desestabilizou a precária situação de paz da zona conseguida ao longo de décadas. Tratava-se de uma paz imposta e mortal para muitas pessoas. Um rosário de regimes ditatoriais impunham-se na zona, mas garantiam que a barbárie não se estendesse. Assim, Afeganistão, Paquistão, Irão, Iraque, Síria e Jordânia eram regimes estabilizados que exerciam um nível de violência contido. A intrusão dos Estados Unidos fez voar pelos ares aquele equilíbrio instável e abriu a caixa das abominações." A guerra contra a Líbia foi "outra conta deste rosário de barbárie. Kadhafi passou de o amigo do Ocidente, que todos acolhiam, ao diabo em pessoa", seguindo-se a atomização da zona em grupúsculos apoiados nas armas que o Ocidente entregou aos grupos hostis ao regime. E há a Síria.
Mas também é preciso dizer que a Europa e o Ocidente não são os responsáveis por todos os males do mundo. Assim, por exemplo, há quem pergunte, com razão, porque é que os refugiados, na sua maioria muçulmanos, não procuram para refúgio também países islâmicos ricos da região, como a Arábia Saudita, os Emiratos Árabes Unidos, o Koweit... E porque é que o KAICIID não tem a sua sede em Riade, por exemplo.

4. Como escreveu o teólogo José Ignacio González Faus, a pensar nos fluxos migratórios, trata-se de um "problema insolúvel": "Porque nem nós podemos acolher ao mesmo tempo milhões de imigrantes nem eles podem deixar de emigrar, dadas as suas condições de vida e as nossas." Mais uma razão para agir segundo a razão na próxima Cimeira Ambiental da ONU, em Paris, "porque os entendidos prognosticam uma terceira onda migratória, devida à mudança climática que afectará sobretudo os países do Sul".

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