EPIFANIA DO SENHOR, A GRANDEZA DO HOMEM
Georgino Rocha
Fica perturbado o estado de ânimo de Herodes ao ouvir a notícia. E com ele os habitantes da cidade de Jerusalém. Nem é para menos! Um cometa a deslocar-se nos céus em direcção ao Ocidente era sinal de catástrofe iminente, de calamidades públicas, de desordem política. Este modo de pensar, de que se faz porta-voz Plínio, o Velho, na sua História Natural, não podia deixar de gerar consternação e pânico. O facto de os magos buscarem o “rei dos judeus” deixa perceber que os desacatos serão grandes e o tempo de Herodes está a expirar. Sobressalto é o mínimo que pode experimentar e a origem da força emocional da acção que vai empreender: aconselhar-se, chamar os mensageiros, dar-lhes indicações precisas, pedir-lhes informações e propor-se seguir os seus passos, logo que possível. Disfarça secretamente o móbil da sua vontade – o de evitar veleidades, matando o potencial candidato a rei – declarando querer ir adorá-lo.
Quando não se é capaz de ver a estrela fulgurante de novos caminhos e se vive deslumbrado com a luz do seu “eu”, com a reverência dos apaniguados e com a subserviência religiosa dos sacerdotes e mestres da lei, de quanto é capaz o engenho humano?! Quando o coração pressente a ameaça pendente, a que subterfúgios recorre tentando anular o perigo e impedir a alteração da situação instalada! Ontem como hoje. E a novidade vem do Oriente!
A narração de Mateus, feita em estilo popular, tem suporte histórico e alcance simbólico. Apresenta o itinerário da fé cristã, compondo o texto com citações conhecidas e alusões a personagens bíblicas. Na pessoa dos magos, destaca a importância da atenção à novidade dos sinais, a ousadia confiante de se pôr a caminho em busca do que o coração pressente, a coragem de suportar a dureza do percurso e de aguentar o peso das provações, a tenacidade de persistir pacientemente na viagem, apesar de não haver certezas do rumo tomado por falta da estrela-guia, o entusiasmo discreto e alegre da chegada e do encontro.
A narração “lança mão” a uma série de verbos para realçar o mundo de emoções e de convicções surgidas nos cansados visitantes. A simplicidade e a pobreza não os desiludem. A sua atenção fixa-se no Menino e na sua Mãe. Por isso, entram, vêem, prostram-se e adoram, abrem os alforges e oferecem presentes, contemplam em silêncio e retiram-se discretamente, saboreando a serenidade e a alegria vivenciadas.
A fé cristã realiza em nós esta maravilha: faz-nos ir ao encontro de Deus na realidade da vida, penetrar na espessura dos factos e no sentido de que são portadores, levantar os olhos e ver horizontes rasgados, descobrir a beleza e a bondade da relação solidária, apreciar a gratuidade da entrega no gesto da doação.
As prendas oferecidas revelam o melhor do ser humano perante o Menino-Deus que se manifesta. O ouro simboliza a vocação a que estamos chamados e já se realizou exemplarmente em Jesus: a grandeza do serviço humilde, o cultivo do amor gratuito e benevolente, o brilho irradiante de uma fé confiante. O incenso desvenda o sentido dos nossos passos, a elevação do coração em sintonia com o projecto de Deus, a vida sofrida e purificada no caudilho do sofrimento e da cruz. A mirra indica a fragilidade humana, os seus limites sempre “asfixiantes”, o risco constante de fazer o melhor e o pior e manifesta que levamos “em vasos de barro“ o tesouro que nos foi confiado.
Na epifania do Senhor, brilha a grandeza do homem. O modelo foi-nos dado para nos servir de medida.