Andava há muito com vontade de ler “As Ilhas Desconhecidas — Notas e Paisagens”, um livro escrito por Raul Brandão na década de 20 do século passado, concretamente, entre junho e agosto de 1924. A primeira edição viu a luz do dia em 1926 e a presente, da QUETZAL, tem data de março de 2011. Dir-se-ia tratar-se de uma obra clássica, com lugar próprio nos estudos de especialistas da literatura de viagens. Afinal, pelo que tenho lido, de críticos e apreciadores deste género literário, a obra continua a valer por tudo quanto Raul Brandão disse e como disse.
As minhas leituras tinham-se circunscrito a simples passagens, mas este ano tive a sorte de poder comprar a mais recente edição de “As Ilhas Desconhecidas”, que tenho andado a ler com calma. E o prazer da leitura, que tenho sentido quando lhe dedico algum tempo, já que apostei em saborear este livro de viagens como quem se serve de um excelente petisco com a preocupação de o reter na boca o necessário para dele se usufruir tudo, mas mesmo tudo, quanto for possível, dá razão a quantos continuam a afirmar, quase um século depois de ter sido publicado pela primeira vez, que a obra “As Ilhas Desconhecidas” «permanece no nosso património literário como a mais completa das homenagens aos arquipélagos atlânticos».
O autor diz, “Em Três Linhas”, que «Este livro é feito com notas de viagens, quase sem retoques. Apenas ampliei um ou outro quadro, procurando sempre não tirar a frescura às primeiras impressões. Tinha ouvido a um oficial de marinha que a paisagem do arquipélago valia a do Japão. E talvez valha… não poder eu pintar com palavras alguns dos sítios mais pitorescos das ilhas, despertando nos leitores o desejo de os verem com os seus próprios olhos!...».
Excerto do livro
«Mas hoje acordo, subo ao convés e tenho uma alegria frenética. Tudo isto, todo este azul, toda esta frescura, me entra em jorros pelos olhos dentro e pela alma dentro. A tinta azul não só ondula — estremece em pequenos grãos vivos, duma acção extraordinária, e o mundo sempre novo que me rodeia penetra-me do seu bafo e comunica-me a sua vida.»
E a chegada a Cascais
«… A noite de 29 de Agosto passo-a no tombadilho, sempre à espera, numa sofreguidão de luz — e toda a noite é de trágica tempestade. No convés, só vejo negrume agitando-se num clamor. Mas de manhã a borrasca aplaca-se dentro da baía de Cascais — e a luz irrompe, uma luz alegre, uma luz que vibra toda, uma luz em que cada átomo tem asas e vem direito a mim como uma flecha de oiro. No céu imenso, azul e livre, o Sol bóia como num grande fluido. Portugal!»