sábado, 13 de dezembro de 2008

O FÓRUM CATÓLICO-MUÇULMANO

Após a tragédia da Índia, em Bombaim, ganha urgência maior o princípio de Hans Küng: não haverá paz entre as nações, sem paz entre as religiões; não haverá paz entre as religiões, sem diálogo entre elas e sem um novo ethos - uma nova atitude ética - global. Lembro, pois, pela sua importância, o encontro inédito e histórico entre 29 muçulmanos, representando várias correntes do islão, e igual número de católicos, que teve lugar no Vaticano entre 4 e 6 de Novembro passado. Quem não se lembra do célebre discurso de Bento XVI em Ratisbona, em Setembro de 2006, e da indignação por ele causada no mundo islâmico por alegadamente associar islão e violência? Foi assim que, em Outubro de 2007, um ano depois, 138 académicos, clérigos e intelectuais islâmicos do mundo inteiro, numa Carta a Bento XVI, com o título Uma Palavra Comum entre Nós e Vós, declararam que, apesar das suas diferenças, o islão e o cristianismo - as duas maiores religiões: juntas, representam mais de 55% da população mundial -, partilham a mesma Origem Divina, a mesma herança abraâmica e os mesmos mandamentos essenciais: o amor a Deus e o amor ao próximo. Também afirmavam que, se não houver paz entre os cristãos e os muçulmanos, não haverá paz no mundo. A esta mensagem respondeu o Secretário de Estado do Vaticano, Cardeal T. Bertone, em Novembro de 2007: "Sem ignorar nem diminuir as nossas diferenças, podemos e portanto deveremos olhar para o que nos une." Os contactos entre as autoridades católicas e muçulmanas conduziram, em Março deste ano, à instituição do Fórum Católico-Muçulmano e à organização do referido encontro no Vaticano. No fim do Seminário, houve uma Declaração comum, em 15 pontos. Logo no primeiro, mostra-se como a concepção de um Deus, fonte de amor, é partilhada pelas duas religiões. Afirma-se depois que "a vida humana é o dom mais precioso de Deus a cada pessoa. Portanto, deveria ser conservado e honrado em todas as suas etapas". A pessoa requer "o respeito pela sua dignidade original e a sua vocação humana". Defende-se, por isso, uma legislação civil que assegure "a igualdade de direitos e a plena cidadania" de todos, e há o compromisso conjunto de "assegurar que a dignidade humana e o respeito se estendam a uma igualdade de base entre homens e mulheres". O respeito da pessoa e suas opções em assuntos de consciência e religião "inclui o direito de indivíduos e comunidades praticarem a sua religião em privado e em público". Também "as minorias religiosas têm direito a ser respeitadas nas suas convicções e práticas religiosas". "Nenhuma religião nem os seus seguidores deveriam ser excluídos da sociedade." A criação de Deus na sua pluralidade de culturas, civilizações, línguas e povos é "uma fonte de riqueza e portanto não deveria nunca converter-se em causa de tensão e conflito". É necessário promover uma informação exacta sobre as religiões e proporcionar uma "sã educação em valores humanos, cívicos, religiosos e morais aos seus respectivos membros". Católicos e muçulmanos estão chamados a ser "instrumentos de amor e harmonia entre crentes e para a humanidade em geral, renunciando a qualquer tipo de opressão, violência agressiva e terrorismo, sobretudo quando se cometem em nome da religião". Sem justiça para todos, não haverá paz. Por isso, a Declaração apela aos crentes para que trabalhem em ordem a criar "um sistema financeiro ético no qual os mecanismos reguladores tenham em conta a situação dos pobres e deserdados, tanto indivíduos como nações endividadas". No termo do Seminário, Bento XVI recebeu os participantes, apelando veementemente a que as religiões se tornem artífices da paz e a liberdade religiosa seja respeitada "por todos e em todos os lados". Certamente, pensava também nas minorias cristãs perseguidas em países de maioria muçulmana. A Declaração conclui com o compromisso de realização de um segundo Seminário do Fórum dentro de dois anos "num país de maioria muçulmana". Oxalá! Anselmo Borges

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