Proposta indecente!
Creio que muitas poucas pessoas já terão dúvidas, presentemente, que vivemos numa sociedade de sedução e de ilusão, em que se procura passar a ideia de que tudo é fácil de alcançar e satisfazer e onde as responsabilidades e os compromissos pelas opções individuais de cada um não passam de meros circunstancialismos passageiros que, com o passar do tempo, se vão diluindo, até desaparecer, como por magia, sem que tragam quaisquer encargos para quem os assumiu.
A publicidade vai-se encarregando de passar esta mensagem de felicidade gratuíta e de criar a envolvente psicológica e social propícia para que os mais desprevenidos e imprudentes acreditem que vivemos num mundo de maravilhas, onde tudo são facilidades e, se não for bem assim, no futuro, alguma coisa se há-de arranjar.
Comprar um carro, ir de férias a um qualquer lugar do mundo, ter um crédito imediato, sem perguntas ou justificações, adquirir um electrodoméstico não utilitário, ter a casa dos seus sonhos e muito mais do que se queira e possa imaginar, são algumas das tentações que nos entram, das mais variadas formas, pela casa dentro e que influenciam o íntimo de muitos.
Para minha surpresa, também os mais jovens já são seduzidos neste sentido. Ainda há dias, estava com um sobrinho meu, com 16 anos de idade, que, recentemente, passou para o 12º ano, a quem, há coisa de três meses, os pais abriram uma conta bancária, por questões de ordem prática, a nível familiar. Pois, recentemente, este jovem recebe uma carta da instituição bancária, onde a referida conta foi aberta, na qual era tratado por “jovem empreendedor”, com uma proposta de crédito, em seu nome, “até dez mil euros, para utilizar onde, como e quando quiser”!
Mas onde é que está a sensatez de tudo isto? Será que não há ninguém, neste país, que ponha um travão neste tipo de loucura alienante, que nem sequer tem em conta estarem a fazerem uma proposta de crédito a um jovem adolescente e de menor idade? Ou será que tudo isto faz parte de uma estratégia mais ampla e malévola que pretende começar a abrir as primeiras brechas e confusão na consciência deste e de outros jovens para que, no futuro, o assalto seja mais fácil à sua pessoa?
Isto para não falar nos possíveis conflitos pessoais e incompreensões que podem surgir entre estes jovens de menor idade e os seus familiares.
Acabei por ir ao banco e depois de alguma insistência informara-me que tais contactos fazem parte da política geral da empresa e não comprometem ninguém. Até aí também eu sei, mas não basta esta resposta. Estes contactos deviam ser proibidos, no caso de se tratarem de jovens menores e, para este grande pormenor, não houve resposta.
Tenho pena que estes bancos não façam uma publicidade pedagógica, também ela capaz de angarias novos Clientes para estes, mesmo que seja (como deveria ser) na base da verdade e não de vendilhões de ilusões, como seja: incentivá-los ao trabalho, a poupar (quando possível), gerir o seu pecúlio e orientá-los nas suas aplicações ou empréstimos.
Quer se queira quer não, os bancos não são umas empresas quaisquer e a sua influência no tecido social e económico de um país é enorme, para o bem e para o mal, pelo que só o Estado pode, se quiser e tiver coragem, regulamentar este sector dos seus excessos e abusos, caso este não o queira fazer por sua própria e livre iniciativa.
Seja por publicidade enganosa ou parcial, ou pela imprudência e irresponsabilidade de quem assume os empréstimos, sem ter condições para os cumprir (ainda que os bancos devessem ter o dever e a obrigação de verificar das condições dos cumprimentos assumidos), é que eles vão engordando os seus fabulosos lucros, à custa da necessidade de uns e da miséria de outros.
Não quero diabolizar as instituições bancárias, até porque muitos portugueses já recorreram aos seus (caros) serviços e conseguiram não só cumprir o acordado com elas como adquiriram bens que, de outro, nunca teriam conseguido para a sua vida.
Agora que estas instituições devem ter mais rigor e seriedade no seu funcionamento com os seus Clientes, lá isso devem. É inquestionável, para bem dos cidadãos e do país!
Vítor Amorim