Europa,
onde estás?
1. Mais parece virtual que real a realidade europeia no seu posi-cionamento diante de cada dia de vida global. São inúmeros os esforços e os desafios, mas são do mesmo modo as inquietações da insignificância real da União Europeia que é incapaz de ter vez e voz no cenário incerto do tempo presente. Mas talvez, à luz dos pais fundadores, do-mal-o-menos, já se conseguiu muito nesta aprendizagem comum, num esforço em aprender a “viver juntos”, pelo menos evitando guerras e batalhas de campo entre os históricos e rivais países europeus.
Por vezes dá-nos a sensação que a Europa não existe; ou então que ser europeu será mesmo assim! Lá que exista projecto em realização de “espaço único de educação europeia” a par de uma união monetária de quase todos os países isso é verdade; mas união monetária (de moeda e moedas) sem união económico-social, o que também fragiliza toda a vontade de Europa Social, esta que de forma aberta e inclusiva deveria vir antes, como alicerce, de tudo o mais, até pelo histórico de “dignidade da pessoa humana” encontrado neste lindo continente azul que dos tempos da cultura grega até os nossos dias sempre se procurou reger por sentidos de humanismo. Este é o “sonho”!
2. Talvez mais que “Europa” existem países individualizados do velho continente que, apesar de quase tudo se decidir em Bruxelas, vão procurando todos os pretextos e contextos para se firmarem e afirmarem nesta conjuntura de “dúvidas” em que está mergulhado o mundo e o próprio “lugar europeu” no mundo. Neste tempo que vivemos, de incertezas que acabam por justificar inseguranças e consequente busca de “algo a que se agarrar”, temos vindo a assistir, na ausência de projecto europeu capaz, ao salve-se quem puder de cada país, nomeadamente no posicionamento face à guerra e forças de paz no Líbano e agora, nestes dias mais próximos, a posição de defesa diante dos milhares de pessoas humanas imigrantes africanos que fogem de África (sugada) rumo à Europa.
Afinal, como se entrelaçam e interagem nesta aldeia mundial, e para nós europeia, todos os projectos políticos, humanitários, educativos, sociais? Andarão, por falta de “alma unitária” uns para cada lado? Que faltará para, num espírito pluralista por isso de identidade e unidade da diversidade, ser possível unir mais forças naquilo que é preocupação e esperança comum? Esquecemo-nos de que se hoje fechamos a porta da casa europeia amanhã a casa é arrombada por outro lado? É o que vimos assistindo em muitas situações (como está agora a acontecer nas lhas Canárias): o dito mundo rico explora o continente africano com intenções de subjugação económico-cultural travando a autonomia e o desenvolvimento (isto para além de todas as complexas condicionantes sócio-culturais e políticas), esquecendo que a pobreza que se “fabrica” lá longe mais cedo ou mais tarde vem bater à nossa porta. As voltas que o mundo dá! Em estudos da ONU, há breves anos dizia-se que o mundo “produz” 47 novos pobres por minuto. É chegada a hora do reencontro com a verdade histórica que realizamos no mundo; não é possível fugir, e na Europa sem filhos, o futuro estará mesmo nas mãos de quem chega.
3. É certo que, com realismo, não é possível acolher e integrar todos os milhares de imigrantes clandestinos que chegam à Europa; mas é verdade bem maior que a resposta de solução não pode ser o fechar-se em si mesmo fazendo conta de que não é nada connosco. A nós portugueses que “somos” país de emigração (e sabemos que milhares e milhares de emigrantes nossos andaram pelo mundo de forma ilegal em bairros de lata desumanos a “fazer caminho” para a legalidade e “ganhar a vida”) parece um pouco estranho e frio quando se diz que “governo prepara plano para travar entrada de imigrantes ilegais por mar” (Público de 22 Agosto). É verdade absoluta que ilegalidade é ilegalidade, sempre a combater e nunca permitir. Mas, diante deste cenário cada vez mais o futuro, será esta a melhor resposta? Será solução europeia fechar as portas? Que pensa (?) a Comissão Europeia sobre a matéria?
Não existam dúvidas que a porta virá abaixo! Para bem ou para mal, isso será outra questão. Mas o facto está aí, a construir-se todos os dias no mundo das desigualdades que crescem, numa abertura de mundo sem fronteiras nem barreiras onde a luta pela sobrevivência humana derruba tudo o que nós, comodamente instalados, chamamos de legalidade. É que acima da legalidade dos nossos papéis diplomáticos está a própria sobrevivência de quem corre quilómetros por um pedaço de pão. E se nós fôssemos “os outros”?! (É que somos mesmo!)
4. Mais ainda, e bem preocupante: em todo este enredo está criado o terreno para o fechar nacionalista nos países europeus; está criada a conjuntura propícia para o emergir de populismos nacionalistas anti-europeus, como forma de fugir a toda esta nova (des)ordem mundial. Sendo certo que a democracia é a melhor forma de governo a verdade é que muitas vezes ela é perdedora em si mesma, quando a maioria quer “fechar as portas” ao outro que quer sobreviver.
Torna-se urgente, primeiro: sem esquecer a realidade local e nacional, levar a mensagem de “comunidade” naquele sentido mais amplo que nos entra pela internet (mundial e europeia) para as escolas e sistemas de educação para os “valores fundamentas”, dizendo que “afinal” somos todos cidadãos do mundo e “pertencemos” a espaços muito para além da própria “concha” individualista (cada vez mais, só neste pressuposto o voto em eleições será um acto consciente e cívico); segundo, com qualquer um dos nomes que se lhe queira chamar, será essencial neste vazio de referenciais retomar e envolver pedagogicamente todos num “documento” (“tratado constitucional”?...) europeu que nos faça entender neste novo mundo a nossa identidade na pluralidade. Caso assim consigamos então tudo quanto é “bom para todos” entra na vida comum; caso não, até o que é bom e importante acaba por ficar perdido no meio do joio. Haverá que postar mais na “qualidade humana” que cria mais laços comuns!