Manifesto
'Ética global para a economia'
Anselmo Borges
Embora o teólogo Hans Küng seja conhecido pelos media e pelo grande público, em primeiro lugar, por causa dos diferendos com o Vaticano, julgo que o seu nome ficará sobretudo ligado ao diálogo inter-religioso, ao Parlamento das Religiões Mundiais, à "Declaração para uma Ética Mundial", à Fundação Weltethos, a que preside.
Foi precisamente por iniciativa da Fundação Welthos e em ligação com a "Declaração para uma Ética Mundial", do Parlamento das Religiões Mundiais, em Chicago, em 1993, que, no quadro de uma economia ecológico-social de mercado, surgiu o Manifesto "Global Economic Ethic", assinado por figuras relevantes da Política, das Igrejas, das Universidades, da Banca, e tornado público em 2009, em Nova Iorque e em Basileia.
Há dois princípios que servem de base: o princípio de humanidade - "todo o ser humano, independentemente da idade, sexo, raça, cor da pele, capacidades físicas ou espirituais, língua, religião, concepção política, origem nacional ou social, tem dignidade inviolável e inalienável", de tal modo que "também na economia, na política, nos media, nas instituições de investigação e industriais, deve ser sempre sujeito de direitos e fim, sempre fim, nunca simples meio, nunca objecto de comercialização ou industrialização" - e o princípio da reciprocidade: "não faças aos outros o que não queres que te façam a ti"; esta regra de ouro "promove a responsabilidade mútua, a solidariedade, a justiça, a tolerância e o respeito por todas as pessoas envolvidas. Estas atitudes ou virtudes são os pilares fundamentais de um ethos global económico, uma visão fundamental comum do que é legítimo, justo e equitativo".
Os dois princípios expandem- -se em valores fundamentais: 1. não violência e respeito pela vida; 2. justiça e solidariedade; 3. honestidade e tolerância; 4. respeito mútuo e companheirismo. Estes valores têm consequências para a economia e os negócios, segundo os 13 artigos do Manifesto, que pode ler-se na recente obra de Küng, Anstäntig wirtschaften. Warum Ökonomie Moral braucht (Economia com decência. Porque é que a economia precisa de moral) e de que se apresenta uma breve síntese.
1. Para respeitar os valores da não violência e do respeito pela vida, devem ser abolidos o trabalho escravo, o trabalho forçado, o trabalho infantil, os castigos corporais e outras violações de normas do direito laboral internacionalmente reconhecidas. Deve-se acabar com as condições laborais e os produtos que danificam a saúde. A relação sustentável com o ambiente é um valor-norma fundamental da actividade económica.
2. Respeitando os valores da justiça e . da solidariedade, devem ser abolidas todas as práticas corruptas e desonestas. Finalidade maior de todo o sistema social e económico, que pretende igualdade de oportunidades, justiça distributiva e solidariedade, é pôr termo à fome e ignorância, à pobreza e desigualdade de oportunidades em todo o mundo. A subsidiariedade e a solidariedade, o empenho privado e público são as duas faces da medalha e concretizam--se, antes de mais, em investimentos privados e públicos no sector económico, mas também em iniciativas para a criação de instituições que sirvam a formação de todos os segmentos da população e a edificação de um sistema de segurança social, para que todos possam desenvolver-se humanamente e ter uma vida digna.
3. A verdade, a sinceridade e a honestidade são valores essenciais para as relações económicas e a promoção do bem-estar humano geral e pressupostos para criar confiança nas relações humanas e na concorrência económica. A cooperação mutuamente vantajosa pressupõe a aceitação de valores e normas comuns e a capacidade de aprender uns com os outros, acolhendo os outros na sua alteridade. São inadmissíveis aquelas acções que não respeitam ou violam os direitos humanos.
4. A estima mútua e o companheirismo entre todos os envolvidos, particularmente entre homens e mulheres, são pressuposto e resultado da cooperação económica. Baseiam-se no respeito, justiça e sinceridade com todos os parceiros: empresários, trabalhadores, consumidores ou outros interessados.