Hoje voltámos ao tempo chuvoso e desagradável. O Verão perde-se nos horizontes, deixando-nos à espera do próximo, se lá chegarmos. Realmente, por aqui vamos percebendo que somos uma região com um mês de Verão, nem sempre completo, com Inverno durante os restantes meses. E neste ambiente temos vivido uma vida longa, graças a Deus. Apesar de tudo, com otimismo a alimentar-nos o sentido de espera por outro Agosto, imaginado com sol brilhante e calor quanto baste. E com este viver eu sou dado a evocar cenas agradáveis do quotidiano, que nos remetem para tempos idos. Hoje veio até mim um encontro que me proporcionou rever um amigo de há décadas. Jurámos que havíamos de nos encontrar, o que nunca mais aconteceu. E já lá vão três anos.
...
Olhou para mim e perguntou:
— Não me conheces?
— Não! — respondi.
Olhei melhor e a sua expressão dizia-me qualquer coisa. Nem assim consegui reconhecê-lo.
Foi então que ele me disse de quem era filho. E de imediato tudo se tornou claro. Era o João.
Aí começou a animar-se a minha memória. Que me visitava frequentemente quando na juventude estive doente dos pulmões e acamado. Que gostava de conversar comigo e dos truques que eu fazia para entreter os amigos que vinham saber da minha saúde. Só não conseguiu perceber como é que eu fazia desaparecer a moeda que caía no copo de água.
— Ainda hoje me lembro desse truque e nunca descobri como é que fazias aquilo.
— São truques… — adiantei eu.
Falou-me dos pais, dos filhos e da reforma que está a viver.
Disse-me que muitas vezes se tem cruzado comigo sem nunca ter tido a coragem de me interpelar.
Ralhei com ele e disse-lhe que nunca mais fizesse isso. Gosto que me falem ajudando-me a recordar o passado. Não faz sentido passar por alguém que conhecemos sem uma saudação, por mais simples que seja.
Fernando Martins