domingo, 18 de dezembro de 2005

COMENTÁRIOS

Há tempos, vi-me obrigado a bloquear os comentários, tantos eram os que vinham carregados de publicidade, sem qualquer interesse.
Retomo agora a recepção dos comentários, na esperança de que os meus leitores participem. É que na partilha de opiniões todos lucramos.
F.M.

NATAL: Um conto de Eça de Queiroz

Posted by Picasa Notre Dame: presépio
O SUAVE MILAGRE
Nesse tempo, Jesus ainda se não afastara da Galiléia e das doces, luminosas margens do Lago de Tiberíade: - mas a nova dos seus milagres penetrara já até Enganim, cidade rica, de muralhas fortes, entre olivais e vinhedos, no país de Issacar.
Uma tarde, um homem de olhos ardentes e deslumbrados passou no fresco vale, e anunciou que um novo Profeta, um Rabi formoso, percorria os campos e aldeias da Galiléia, predizendo a chegada do reino de Deus, curando todos os males humanos. E enquanto descansava, sentado à beira da Fonte dos Vergéis, contou ainda que esse Rabi, na estrada de Magdala, sarara da lepra o servo de um decurião romano, só com estender sobre ele a sombra das suas mãos; e que noutra manhã, atravessando numa barca para a terra dos Gerassênios, onde começava a colheita de bálsamos, ressuscitara a filha de Jairo, homem considerável e douto que comentava sobre livros na sinagoga. E como em redor , assombrados, seareiros, pastores, e as mulheres trigueiras com a bilha no ombro, lhe perguntassem se esse era, em verdade, o messias da Judéia, e se diante dele refulgia a espada de fogo, e se o ladeavam, caminhando como as sombras de duas torres, as sombras de Gogue e de Magogue.
O homem, sem mesmo beber daquela água tão fria de que bebera Josué, apanhou o cajado, sacudiu os cabelos, e meteu pensativamente por sobre o Aqueduto, logo sumido na espessura das amendoeiras em flor. Mas uma esperança, deliciosa como o orvalho nos meses em que canta a cigarra, refrescou as almas simples; logo, por toda a campina que verdeja até Áscalon, o arado pareceu mais brando de enterrar, mais leve de mover a pedra do lagar; as crianças, colhendo ramos de anêmonas, espreitavam pelos caminhos se além da esquina do muro, ou de sob o sicômoro, não surgiria uma claridade; e nos bancos de pedra, às portas da cidade, os velhos, correndo os dedos pelos fios das barbas, já não desenrolavam, com tão sapiente certeza, os ditames antigos.
Ora, então, vivia em Enganim um velho, por nome Obede, de uma família pontificial de Samaria, que sacrificara nas aras do Monte Ebal, senhor de fartos rebanhos e de fartas vinhas - e com o coração tão cheio de orgulho como o seu celeiro de trigo. Mas um vento árido e abrasado, esse vento de desolação que ao mando do Senhor sopra das torvas terras de Assur, matara as reses mais gordas das suas manadas, e pelas encostas, onde as suas vinhas se enroscavam ao olmo, e se estiravam na latada airosa, só deixara, em torno dos olmos, e pilares despidos, sarmentos, cepas mirradas, e a parra roída de crespa ferrugem. E Obede, agachado à soleira da sua porta, com a ponta do manto sobre a face, palpava a poeira, lamentava a velhice, ruminava queixumes contra o Deus cruel.
Eça de Queirz
(Para ler todo o conto clique aqui)

Um artigo de Alexandre Cruz

Globalização
com Direitos Humanos? 1. Dezembro é mês de efemérides especiais, das quais se destaca o dia 10 de Dezembro, Dia da Declaração Universal dos Direitos Humanos. Um documento precioso de ideais a serem atingidos por todos os povos, um elo de coordenadas comuns dignificantes da vida e da construção social. Depois da II Guerra Mundial, diante de um impossível que foi real, as atrocidades clamorosas contra a dignidade humana espelhadas até ao limite do extermínio racial em campos de concentração, eis que por escrito, da Assembleia Geral das Nações Unidas de 10 de Dezembro de 1948, brotava um impulso de esperança, 30 Artigos da Declaração que contemplam múltiplas áreas da vida pessoal, familiar e social. Lembrar e revitalizar o espírito dos DIREITOS HUMANOS, como muitas instâncias, quer do ensino ao mundo associativo e humanitário fazem, significa colocar no mapa essencial das nossas preocupações o próprio mundo. Hoje, para todos, cidadãos do mundo global, preocupam, necessariamente, todas as notícias que chegam até nós que contêm atentados contra a proclamada dignidade humana. Quer do mundo oriental, na cruel e fugidia gigante comercial China, onde além da perseguição tudo é negócio para o Ocidente (da escravatura até aos órgãos dos mortos nas prisões chinesas), ao mundo ocidental, onde os recentes casos de pena de morte aplicada nos EUA espelham bem o quanto estamos longe de uma maturidade humana desejada. 2. Embora todo o sentido de esperança persistente, de representações e embaixadas e acordos entre as nações, de um século XX passado com o melhor (de evolução e noção do ideal) e o pior (de guerras e atrocidades desumanas), diante da aceleração da própria história e do encontro inevitável cada vez mais forte com formas diferentes de pensar, sentir, viver,… parecerá que a “incerteza” quanto ao futuro será hoje a grande palavra de ordem. Chamam-lhe tempo do crepúsculo, fim de uma era e princípio de outra; para uns pós-modernidade, outros era global, da comunicação, ou mesmo já inter-planetária…o certo é que cada vez mais é importante descer à terra, à nossa terra, pois não nos faltam missões e este será o tempo e o espaço da nossa vida e realização possíveis, que aproximem a realidade do sonho universal, os Direitos Humanos assumidos por todos. Mas como aproximar das crianças do Afeganistão ou Iraque a proclamação das Nações Unidas que nos diria ser possível “já” um futuro diferente? Como, acima de tantos maus hábitos culturais a compreender mas a mudar drasticamente (por exemplo em notícia de há dias, o hábito terrível de na Guiné procederem à mutilação genital às meninas, facto que leva muitas delas à própria morte), como mudar as mentalidades? Em termos universais, além de estarmos na Década das Nações Unidas para o Desenvolvimento Sustentável (2005-2015), estamos também em plena Década para a Alfabetização (2003-2012); e, sem dúvida, nesta área educativa reside toda a esperança possível. Os Direitos Humanos (direitos e deveres) que querem ser levados a todas as pessoas das cidades, vilas e aldeias, só chegarão mesmo pela própria instrução, em regimes que assim se vão abrindo à liberdade e democracia. E se nos países ditos em desenvolvimento seria importante sentar na sala de aulas todos a aprender (para viver) os 30 artigos da Declaração, no chamado mundo ocidental que somos talvez fosse oportuno a liberdade obrigatória de estudar a sério a Declaração e todas as instâncias da ONU com suas coordenadas e Cartas de Princípios, nem que fosse, como vozes pertinentes sugerem, na existência de cadeiras de Ética Pessoal e Social, Cidadania, não facultativa (pois todo o ser humano é chamado a ser cidadão!), para gerar no próprio processo educativo mais o sentido do Outro, das noções do dever e promovendo o crescimento de vidas com sensibilidade… Ajudar os futuros pais de família, políticos, empresários, trabalhadores, a tomar mais consciência dos valores, sentido de Vida, direitos e deveres, algo que nunca foi nem será um acto mecânico, exige percepção justa, educada, da própria liberdade. Um caminho de “dúvida” no sentir da inquietação do como perceber neste mundo que “todo o ser humano tem direito à vida” (artigo III) e que “todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotados de razão e consciência e devem agir em relação uns aos outros com espírito de fraternidade”(artigo I)? 3. A globalização aí está, no seu crescer de consciência de aldeia mundial mas que não se pode desfocar do sentido de humanidade, deitando-se a perder unicamente em estratégias economicistas indignificantes onde vale tudo. Não está fácil o proporcionar um crescimento justo, equilibrado, gerador de “espírito de fraternidade”, antes pelo contrário. A 9 de Dezembro, a Organização Internacional do Trabalho (OIT) apresentou relatório. A par da desigualdade crescente que conhecemos, claramente, com números, se prova que o crescimento económico mundial não está a gerar emprego, capaz de contribuir para a redução da pobreza. Mesmo na Ásia da expansão económica, apesar de algumas melhoras de condição de vida o panorama é desesperante. Dizendo-se que “todo o ser humano tem direito ao trabalho” (artigo XXIII), e promovendo as noções de responsabilidade de todos os actores em jogo, o certo é que, como observamos na própria União Europeia (na dificuldade de Orçamento da UE), há qualquer coisa de especial que falta para tornar possível um sentido de rumo e de esperança. Há dificuldades? Então e como estávamos há longas décadas, no tempo do Pais da Europa?! Irão os efeitos perversos da globalização cegando o sentido do horizonte? Assim não seja...para que seja Natal!
Alexandre Cruz

sábado, 17 de dezembro de 2005

NATAL: Árvore natalícia no Vaticano

Posted by Picasa Árvore de Natal gigante inaugurada no Vaticano
Vai ser inaugurada esta tarde a árvore de Natal que ornamentará a Praça de São Pedro durante o tempo do Natal. O abeto de quase 30 metros de altura e 7 toneladas de peso, proveniente de Eferding, na Alta Áustria, foi hoje oficialmente entregue ao Papa, no Vaticano.
Bento XVI lembrou que “este majestoso abeto permanecerá junto do Presépio, até ao fim das festividades natalícias, e será admirado por numerosos peregrinos que, de todas as partes do mundo, vêm ao Vaticano”. Outras árvores mais pequenas irão adornar o Palácio Apostólico e vários locais do Vaticano.
Aproveitando o facto de a árvore da Praça de São Pedro se iluminar hoje pela primeira vez, o Papa aludiu ao significado espiritual do Natal, referindo que, “com a sua presença luminosa, Cristo dissipou as trevas do erro e do pecado, trazendo à humanidade a alegria da fulgurante luz divina, da qual a árvore de Natal é um sinal e uma recordação”.“Acreditar em Cristo significa deixar-se envolver pela luz da sua verdade que dá pleno significado, valor e sentido à nossa existência”, acrescentou.
Perante os peregrinos austríacos, Bento XVI referiu-se ainda às “nobres tradições cristãs que fecundaram, com os seus valores espirituais, a cultura, a literatura e a arte do vosso país e de toda a Europa”.
Fonte: Ecclesia

NATAL: Um poema de Francisco Joaquim Bingre


Presépio de um "site" brasileiro


  EM DIA DE NATAL DE 1845 

Ó Dia mais feliz, mais Santo Dia, 
Que em todo o Orbe Cristão 
venera a Igreja! 
Que dá glória ao Céu,
que a Paz adeja 
Sobre as trevas da Terra, 
que alumia! 
Tu nasceste da aurora de Maria, 
Que ao tisnado Satã enche de inveja. 

Luz que na gruta de Belém lampeja, 
Que nos mostra, da Glória, 
aberta a via. 
Precursora de ti 
foi a flamante Estrela 
anunciadora do Oriente 
Que precedeu a teu fulgor brilhante. 
Tu viste o Filho Deus Omnipotente, 
O Rei dos Reis, do mundo dominante, 
Nascido num presépio, 
pobremente. 

  In "Natal... Natais", antologia de poesia sobre o Natal, de Vasco Graça Moura NB: Francisco Joaquim Bingre, poeta de Canelas, Estarreja, 1763-1856

sexta-feira, 16 de dezembro de 2005

Um artigo de Carlos Borrego, no JN

Futuro hipotecado Quem for capaz de produzir o mesmo, fazendo uso de tecnologias mais limpas, vencerá
Decorreu em Montreal (Canadá), a XI Conferência das Nações Unidas sobre as Alterações Climáticas, onde se juntaram os países que ratificaram o Protocolo de Quioto (a chamada COP/MOP) e os que não ratificaram, como os EUA (a chamada convenção das partes). O debate foi marcado pela confirmação do aumento das emissões de gases com efeito de estufa (GEE) desde 1990, continuando a Administração Bush a opor-se ao cumprimento de limites de emissão para o seu país.
É interessante verificar que já em 1896, Svante Arrhenius, prémio Nobel da Química, foi o primeiro a alertar para o facto de que a revolução industrial, ao "lançar minas de carvão para o ar" iria alterar o clima da Terra. A sua perspectiva era optimista, porque considerava que isso iria providenciar, no futuro, um melhor clima para a Humanidade, "especialmente nas partes frias da Terra". Estava-se muito longe de equacionar a problemática ambiental e ter capacidade para fazer cenários sobre as consequências das mudanças globais, mas percebia-se que estávamos perante mais um exemplo que ilustra o íntimo ciclo de desenvolvimento humano e os sistemas naturais.
Estas emissões de GEE decorrem de uma economia maioritariamente baseada no carbono fóssil (de que o carvão e o petróleo são exemplos proeminentes), tendo, por isso, dado lugar ao que hoje se designa de Economia do Carbono. A reunião de Montreal teve três pequenos pecados e três grandes virtudes
1) Perdemos 13 anos em negociações e conversações. E nestes anos perdidos, entre a Conferência do Rio de Janeiro (1992) onde se lançou a ideia de uma política planetária para resolver o efeito de estufa e esta Conferência de Montreal que pretende projectar o Protocolo de Quioto para além de 2012 (o dito Quioto II), o problema agravou-se.
2) A não participação em Quioto II dos EUA, responsáveis por mais de 25% de todas as emissões, torna-o menos abrangente do que o desejável.
3) Quioto II é menos ambicioso do que o inicialmente desenhado (à custa de tanto querer garantir um compromisso, a UE teve de ir flexibilizando a sua posição).
(Para ler todo o artigo, clique aqui)

Um artigo de Pedro Lomba, no DN

RELIGIÃO E ESTADO
Não quero ser aborrecido, mas há algumas evidências que ficaram por dizer sobre a laicidade do Estado. Primeiro, o Estado não pode coagir ninguém a ser religioso, nem impedir ninguém de ser religioso. Segundo, o Estado não deve subsidiar a religião. Terceiro, o Estado deve proteger a liberdade religiosa. Quarto, o Estado deve garantir a laicidade do ensino público. Quinto, cabe ao Estado proteger os bens religiosos e a segurança dos locais de culto. Sexto, o Estado deve respeitar a Igreja como instituição, os seus membros e os leigos. Sétimo, embora obviamente separado da Igreja, o Estado tem que ser colaborante na sua relação com as religiões e com a presença da religião no espaço público. E, nono, o Estado deve ter bom senso.
Isto tem consequências quem adere a uma igreja ou a um credo religioso fá-lo por opção livre e voluntária. As escolas devem ser neutras em matéria religiosa, mas não devem ser culturalmente assépticas e historicamente ignorantes: o estudo da Bíblia e da História das religiões devem figurar nos programas curriculares. As religiões devem ter direitos iguais, sem que isso crie um igualitarismo radical entre confissões, tendo em conta as suas diferenças de representatividade. Os crimes contra a propriedade da Igreja ou a devassa de locais de culto devem ter condições de punibilidade específicas e qualificadas. O Estado deve ser solene com as autoridades eclesiásticas. A exibição de símbolos religiosos com um sentido predominantemente secular deve ser admitida. E, finalmente, a religião não é só um assunto privado. O respeito pela presença da religião no espaço público implica que as pessoas devem poder exprimir a sua fé como entenderem, o que inclui a liberdade de culto nos feriados religiosos, o direito a manifestações públicas de fé como as procissões e até mesmo, se quiserem, o direito de um político expressar livremente as suas convicções religiosas. Assim é tudo mais equilibrado.

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