domingo, 31 de janeiro de 2016

Visita de Estudo — Casa de Camilo

Crónica de Maria Donzília Almeida


 A vida foi verdadeiramente madrasta para Camilo

O sol acordou pálido e assim permaneceu ao longo do dia, tímido, escondido atrás de nuvens cinzentas.
Apesar das condições meteorológicas pouco risonhas, isso não demoveu o grupo da US de empreender a viagem rumo a terras minhotas.
No âmbito da disciplina de História e Jornalismo, o nosso formador organizou uma visita de estudo à Casa de Camilo, em S. Miguel de Seide. Situada em Vila nova de Famalicão, fez-me evocar o triénio que lá vivi, entre 1979 e 1982. Gratas recordações, dum período áureo da minha vida, ali, em pleno coração do Minho, que tanto me fascina, pelas características de uma paisagem ímpar. Com a exuberância da sua vegetação, onde os regatos serpenteiam pelos campos verdes, a vinha de enforcado se ergue altaneira em esteios de pedra granítica, qualquer forasteiro se sente aconchegado nesta moldura natural.

A memória afectuosa de Deus

Crónica de Frei Bento Domingues no PÚBLICO

Frei Bento Domingues
«A verdadeira vida e a morte 
dependem dos afectos. 
Fora deles, há apenas estatística.»

1. A nós, os velhos, roubam-nos tudo: roubam-nos o passado e o futuro, a memória e a possibilidade de renovar o cartão de cidadão.
É breve e para poucos a sobrevivência na memória afectuosa dos familiares e amigos. Chegamos tarde em relação ao passado e demasiado cedo em relação às maravilhosas promessas da ciência e da técnica.
Por outro lado, a louca persistência das guerras e os absurdos que as provocam, impondo a lei de matar, ser morto ou fugir, geram cepticismo acerca da possibilidade global de humanização da história [1].
A verdadeira vida e a morte dependem dos afectos. Fora deles, há apenas estatística.
Os mais idosos vão sofrendo a desertificação das relações de familiares e amigos. Mário Brochado Coelho, a propósito da morte de Nuno Teotónio Pereira e do desaparecimento de outros companheiros, manifestou aos amigos, de modo comovente, que embora tudo seja natural, ficamos com o sentimento de uma grande orfandade.
Há outras pessoas que alimentam o desejo de um Deus de memória afectuosa, transfiguradora e universal, para si e para os outros, um coração que as acolha.

sábado, 30 de janeiro de 2016

Novas indústrias eólicas no Porto de Aveiro



«A Administração do Porto de Aveiro (APA) está a negociar a instalação de novas empresas do sector eólico. Depois da PT wind, existem outras propostas ´em cima da mesa´. A confirmarem-se estes novos investimentos, a atual zona ocupada pelo depósito de areia será disponibilizada para expansão industrial e de logística.»


Nota: Com a instalação de novas empresas do setor eólico na zona ocupada pelas areias, é natural admitir que uma grande dor de cabeça desapareça da vida dos gafanhões residentes junto ou mais ao largo do Porto de Aveiro. Ficamos a aguardar as negociações em curso, segundo informa a APA.

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O grande enigma (1)

Crónica de Anselmo Borges
no Diário de Notícias


Todo o ser humano
deseja e quer viver


É possível que Deus exista, mas também pode não existir. Ninguém pode dizer que sabe que Deus existe, mas também ninguém pode dizer que sabe que Deus não existe. Ninguém sabe se na morte encontramos a vida na sua plenitude em Deus ou se, pelo contrário, para cada pessoa tudo acaba na morte. Este é o grande enigma da vida de cada homem, de cada mulher. É o enigma da verdade metafísica última do universo: Deus como fundamento último ou um puro mundo sem Deus? Questão decisiva, no sentido pleno da palavra: que decide, em última análise, a existência de cada um. Questão essencial, porque, com Deus, dá-se a esperança da vida plena para lá da morte; num puro mundo sem Deus, a existência desemboca na aniquilação total enquanto pessoa. O ser humano é sempre confrontado com a eternidade: a eternidade da plenitude em Deus ou a eternidade do nada.
É com esta incerteza metafísica, num mundo enigmático, que se confronta, numa obra notável, acabada de publicar - El Gran Enigma: Ateos y Creyentes ante la Incertidumbre del más Allá ("O grande enigma. Ateus e crentes perante a incerteza do Além) -, o jesuíta Javier Monserrat, neurocientista, filósofo e teólogo.

quarta-feira, 27 de janeiro de 2016

Efeméride: Evocando D. Júlio Tavares Rebimbas

1959 - 27 de janeiro 


«O Padre Júlio Tavares Rebimbas, então pároco de Ílhavo, foi nomeado, pela primeira vez, vigário-geral da Diocese de Aveiro; mais tarde viria a ser escolhido, sucessivamente, para bispo do Algarve, arcebispo de Mitilene e auxiliar do Cardeal-patriarca de Lisboa, arcebispo-bispo de Viana do Castelo e arcebispo-bispo do Porto (Correio do Vouga, 31-1-1959) – J.»

"Calendário Histórico de Aveiro"
de António Christo e João Gonçalves Gaspar


NOTA: Nas vésperas da sua nomeação para ser ordenado bispo, encontrei-o em Fátima, no café mais frequentado, o tal que fazia e faz  esquina com duas ruas. Era agosto de 1965 e eu andava por ali em lua de mel com minha esposa. Ele estava com o Padre João Paulo da Graça Ramos que viria a ser seu secretário, ao que julgo. 
O nosso conhecimento devia-se ao facto de eu ser da Ação Católica e gafanhão, e ele prior de Ílhavo. Nessa altura, Mons. Júlio Rebimbas era Vigário-geral da Diocese de Aveiro. 
Estávamos na conversa e nesse ínterim chega um indivíduo amigo do Padre João Paulo que fez as apresentações devidas, esclarecendo: 
— Mons. Júlio Rebimbas é o Vigário-geral da Diocese de Aveiro. 
De imediato, Mons. adianta: 
— Calma, sou o prior de Ílhavo.

Regressámos da lua de mel e dias depois, qual não foi o meu espanto, noticiava um diário que D. Júlio tinha sido nomeado Bispo do Algarve. É claro que antes da nomeação se refugiou, decerto para meditar, em Fátima, Não estaria ali para outra coisa, julgo eu.
Guardo dele o bom humor, a graça no falar, o jeito para criar  amizades e a proximidade que cultivava com todos, em especial com os mais simples.

Burnout

Crónica de Maria Donzília Almeida




«O nosso jovem Ministro da Educação 
será a luz ao fundo do túnel?»

A aposentação é um patamar na vida do cidadão trabalhador, muito desejada por muitos, uma miragem para tantos. É o corolário de toda uma vida de trabalho.
Agora, à distância, permito-me fazer a retrospetiva…
Durante o período de vida ativa, qualquer cidadão, seja homem ou mulher, vive assoberbado com compromissos profissionais e familiares que lhe saturam o tempo.
O desgaste, a fadiga crónica, o stress da profissão, levam até, ao síndrome do Burnout. Este ocorre em profissionais que lidam com pressão constante no seu dia-a-dia, por longo período de tempo. Estão nesse grupo, os profissionais de saúde, forças de segurança, agentes educativos, nomeadamente os professores.
Hoje, em dia, o professor desempenha muitos papéis, que transcendem as suas competências. Tem de ensinar jovens que não querem aprender e boicotam, sistematicamente, o trabalho da aula. A indisciplina grassa nas escolas.
Foram muitos anos a lecionar, a conviver diariamente com os problemas de alunos, pais e comunidade escolar. 

domingo, 24 de janeiro de 2016

Uma honra jamais esperada


XVII Capítulo da Confraria 
Gastronómica do Bacalhau

Se há surpresas na vida, o convite para participar no XVII Capítulo da Confraria Gastronómica do Bacalhau de Ílhavo, ontem, sábado,  foi uma delas. E a surpresa maior, inimaginável para mim, modesto cidadão que assim me considero neste mundo de confrarias e equivalentes, reside no facto de ter sido entronizado como Confrade de Honra. Tanta gentileza de amigos confrades sensibilizou-me, e lá fui para a festa, que o foi realmente a vários níveis. Um discurso do Grão-mestre bem concebido a abrir com arte, graça e realismo, que só lamento não o ter gravado, o convívio fraterno de diversas confrarias, todas apostadas em defender algo de típico das suas gastronomias, a Patanisca de Honra para estimular os apetites, a investidura de três Confrades de Honra, a D. Ana Maria Lopes, o Senhor João Nunes Cavaz e eu próprio, no belíssimo cenário da Faina Maior do Museu Marítimo de Ílhavo, a visita ao Aquário dos Bacalhaus, a serenata cheia de sentimento, decerto de quem alimentou saudades nos bancos de pesca ou no mar revolto, e a saída para o almoço no Hotel de Ílhavo ficaram como retrato colorido para memória futura. 

Grão-mestre, João Nunes, Ana Maria Lopes e Fernando Martins
A mesa do XVII Capítulo respeitou rigorosamente a tradição, tanto quanto sei, com entradas diversas, tudo com o fiel amigo a dar sabor e realismo que dignificaram a nossa confraria, não faltando as carinhas fritas, línguas fritas com açorda, feijoada de samos, bolos de bacalhau, ovas, pataniscas, chora (porquê chora? Qual a origem ou razão deste nome para designar uma sopa pobre?) e o já famoso bacalhau à confraria do saudoso cozinheiro Silva, que bem conhecemos da televisão.
Vinhos a condizer, que ali marcaram presença entendidos no assunto, prova de azeite, e sobremesas tão variadas e desafiantes que me obrigaram a fugir. A consciência diabética avisou-me para não tentar. 
Contemplei serenamente a alegria esfusiante de uns, as palavras certas e estimulantes de muitos amigos e conhecidos, o saber receber e estar com os convidados, a partilha de saberes e de vivências em capítulos semelhantes nas mais variegadas regiões do país e de estrangeiro. Percebi facilmente quanto pesam estas experiências na formação das pessoas com gosto pelas tradições gastronómicas das nossas terras que urge preservar, não vá dar-se o caso do fast food invadir e adulterar os gostos das nossas matrizes.

Olhei para os ilhavenses e gafanhões 

Olhei para os ilhavenses e gafanhões ali bem representados e de repente ocorreu-me um texto do saudoso D. João Evangelista de Lima Vidal, um insigne aveirense e primeiro bispo da restaurada Diocese de Aveiro, que aconteceu em 11 de dezembro de 1938. Um texto poético escrito em 8 de novembro de 1952.

Diz D. João:

«Eu nasci em Aveiro, ao que suponho na proa de alguma bateira. Fui batizado à mesma hora nas águas da nossa Ria. Abriram-se-me os ouvidos ao som cadencioso dos remos no mar, ao pio estrídulo das famintas gaivotas, ao praguedo inocente dos pescadores.
(…) 
Nós, os de Aveiro, somos feitos, dos pés à cabeça, de Ria, de barcos, de remos, de redes, de velas, de montinhos de sal e areia, até de naufrágios. Se nos abrissem o peito, encontrariam lá dentro um barquinho à vela, ou então uma boia ou uma fateixa, ou então a Senhora dos Navegantes.»

Eu, porém, ao fixar os confrades da CGB, para tentar entrar na alma de cada um, divisei  claramente, dentro do peito de todos, não já os montinhos de sal, mas, garantidamente, um lugre à vela, um bote e um bacalhauzinho a tentar livra-se do anzol.
Obrigado a todos os que me proporcionaram este encontro.

Fernando Martins

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