terça-feira, 31 de dezembro de 2019

Santa Maria, Mãe de Deus, Rogai por Nós

Reflexão de Georgino Rocha


“Que o Deus da paz nos abençoe e venha em nossa ajuda. Que Maria, Mãe do Príncipe da paz e Mãe de todos os povos da terra, nos acompanhe e apoie, passo a passo, no caminho da reconciliação. E que toda a pessoa que vem a este mundo possa conhecer uma existência de paz e desenvolver plenamente a promessa de amor e vida que traz em si”.

Papa Francisco 

A Igreja coloca o Novo Ano sob as bênçãos de Maria e destaca a sua maternidade divina como fundamento da sua especial relação com Jesus Cristo e da sua função cooperante no projecto de salvação. Também o Papa Francisco, seguindo uma tradição que vem de Paulo VI, dedica neste dia uma mensagem de Paz aos Responsáveis das Nações e a todos os homens de boa vontade. A nossa reflexão anda à-volta destes factos que procuramos meditar.
A invocação à Santa Mãe de Deus abre a segunda parte da Avé Maria, oração decorrente do diálogo do Anjo Gabriel com ela aquando da anunciação. Nasce e flui como resposta do povo cristão perante a contemplação das maravilhas enunciadas na primeira parte: Maria, a cheia de graça, convidada a alegrar-se, que fica surpreendida e preocupada com a mensagem recebida, que é escolhida para ser a Mãe de Jesus, o filho do Altíssimo, que quer saber o como de tudo isso que contrasta com a sua opção de noivado com José, que confia na verdade narrada, que se disponibiliza para ser a obediente serva e assumir tão grandioso projecto. Maria, a reconhecida por Isabel como a Mãe do Senhor, a bendita entre as mulheres que gera no seu ventre um fruto precioso, Jesus.
“Rogai por nós, Santa Mãe de Deus” reza, na Salve Rainha, a fé do povo cristão em súplica confiante ao sentir as aflições da vida e os males do mundo, ao fazer a experiência da fragilidade humana e das provocações adversas, ao dar largas às aspirações do coração que quer ser fiel à Palavra do Senhor e à Igreja que a proclama, e participar da sua missão na terra e gozar da sua recompensa no Céu.
Maria é Mãe de Deus por ser a Mãe de Jesus, seu filho carnal. No seu seio, Deus adquire forma humana, faz-se um de nós, humaniza-se. Faz-se célula germinal e vive as fases marcantes da concepção à idade adulta, da criança adolescente ao jovem amadurecido. Nada do que é genuinamente humano lhe é estranho. Até a experiência da morte, berço da vida nova, a feliz ressurreição. Querer encontrar Deus é procurar em Jesus a verdade do ser humano, o espírito filial, a relação fraterna, o cuidado solícito por toda a criação e pelo ambiente, nossa casa comum. Corremos o risco de dirigir o nosso olhar para onde Deus não está. Enquanto o tempo é tempo e a história tiver a marca da finitude, é na humanidade de cada pessoa e na relação de todas entre si que Ele se esconde para nos dar a alegria da surpresa do encontro amigo e da aliança de amor.

domingo, 29 de dezembro de 2019

Sem balanço de 2019 e votos para 2020

Frei Bento Domingues

"Neste ano, cresceu muito o número dos amigos e familiares, o meu irmão Bernardo, com quem já não posso falar nem aguardar notícias"

1. Estamos a chegar ao fim do ano e continuamos dentro do mistério do tempo e dos seus enigmáticos sinais. Como não fui reler as crónicas de 2019, fico sem saber o que apontei, o que realcei o que me passou despercebido ou mal avaliado, assim como as esperanças e os receios que não se confirmaram.
Neste ano, cresceu muito o número dos amigos e familiares, o meu irmão Bernardo, com quem já não posso falar nem aguardar notícias. Continuarei a falar deles e, intimamente, a manter uma relação viva com aqueles que Deus não pode esquecer. É também com eles que rezo e, quando celebro a Eucaristia, convoco-os sempre a todos. Preciso desse mundo para continuar a viver. Já há muitos anos, uma jornalista perguntou-me o que desejava escrever como epitáfio sobre a sepultura. Respondi que, se alguém tiver essa triste ideia, escreva: não estou aqui.
Contaram-me que, numa aldeia do Norte, muito católica, morreu uma criança e todas as crianças foram ao funeral. De regresso a casa, uma perguntou à mãe: se eu morrer o que é que me acontece? O teu corpinho vai num pequeno caixão para o cemitério e a tua alminha vai direitinha ao céu, respondeu a mãe. E eu? Interrogou a criança!
Quando tenho de participar num funeral, lembro-me sempre de uma observação de Jesus perante a euforia dos discípulos ao regressarem entusiasmados de uma missão que tinha sido um êxito e que o Mestre confirmou. Acrescentou, no entanto, algo inesperado: alegrai-vos antes porque os vossos nomes, a vossa vida, está inscrita nos céus, no coração de Deus [1].
Conta o texto de S. Lucas que Jesus, naquele momento, estremeceu de alegria sob a acção do Espírito Santo. Havia um motivo para aquela comoção: durante séculos e séculos, os que se julgavam sábios e entendidos nas Escrituras tinham ocultado o essencial ao povo simples, “aos pequeninos”: bem-aventurados os olhos que vêem o que vós estais a ver. Pois eu digo-vos que muitos profetas e reis quiseram ver o que vedes e não viram, ouvir o que ouvis e não ouviram. Ocultaram-nos que somos misteriosamente amados de Deus, mesmo quando nos sentimos abandonados, como o próprio Jesus se sentiu na cruz. É este o cume da revelação cristã.

As nossas paisagens - Ria na Torreira



A Ria está cheia de paisagens circundantes que se refletem na tranquila laguna que sustenta tanta gente, direta ou indiretamente. O viajante queda-se com olhos atentos e alma aberta à serenidade que as águas salinas sabem oferecer-lhe. 

sábado, 28 de dezembro de 2019

O Futuro Absoluto

Crónica de Anselmo Borges 
no Diário de Notícias de hoje, 
dia da celebração dos 155 anos do jornal 
Anselmo Borges 

1. Face ao futuro, é essencial pensar. A palavra escola vem do grego scholê, que significa ócio, com o sentido de tempo livre para homens livres pensarem e governarem a polis. 
Hoje, falta esse ócio, tudo se torna negócio (do latim nec-otium). A própria política tornou-se sobretudo negócio. Assim, sob o império da técnica e do negócio, não se pensa, calcula-se. A técnica não pensa, calcula (Heidegger), o mesmo valendo para os negócios. 

2. O futuro vem grávido de esperanças, mas também com perigos: a guerra nuclear, as NBIC (nanotecnologias, biotecnologias, inteligência artificial, ciências cognitivas, neurociências), desembocando no transhumanismo e no pós-humanismo, a injustiça estrutural mundial, o meio ambiente, as drogas, a paz, os direitos humanos, o trabalho... Vivemos num mundo global, estes problemas são globais e a questão é que a política é nacional, quando muito, regional. 
Olhando para o futuro, não se impõe pensar numa Governança Global? Não digo governo mundial, mas governança global, já que os problemas enunciados só com decisões ético-jurídico-políticas globais podem encontrar solução. 

3. Problema maior hoje: uma espécie de cansaço vital. Porque não há sentido último. Daí, nem é no desespero que se vive, mas na inesperança. 
Só com Deus, “Futuro Absoluto” (K. Rahner), se pode erguer um futuro autenticamente humano, com Sentido final, pois Ele é o Futuro de todos os passados, do presente e de todos os futuros. 

Anselmo Borges no DN

sexta-feira, 27 de dezembro de 2019

Águeda com os seus guarda-chuvas



 



(Clicar nas imagens para ampliar)


É sempre um prazer visitar a cidade de Águeda, mas se pudesse e tivesse tempo para passar pelas suas aldeias o prazer seria, porventura, redobrado. Conheci algumas, que calcorreei há anos em férias e trabalho, que deixaram na minha memória paisagens puras e gentes acolhedoras que jamais esquecerei.  
Ontem, depois de uma intervenção médica no hospital, fiquei livre e com o meu filho Pedro saboreámos a agitação humana no centro da cidade, sob o cenário já tão badalado dos guarda-chuvas, todos brancos, julgo que para não obscurecer o ambiente. Aqui ficam alguns registos do que sentimos e experimentámos. Vale a pena passar por lá. 

As nossas paisagens: Marina do Oudinot



As nossas paisagens fazem parte integrante dos quotidianos gafanhões. A Marina do Oudinot, com Guarita à vista, abre esta secção que pretendo frequente. Aceitam-se propostas. 
Nesta foto, os barcos ancorados e o espelho de água são um desafio à nossa contemplação. Não passe a correr. Pare uns instantes e aprecie. 

Levanta-te, toma o Menino e sua Mãe

Reflexão de Georgino Rocha 
para o Domingo da Sagrada Família

Georgino Rocha

Duas vezes, ouve José a voz do enviado de Deus que lhe diz: “Levanta-te, toma o Menino e sua Mãe”. Uma, para fugir para o Egipto. Outra, para regressar às terras de Israel. A primeira, porque o Menino corria perigo de vida. A segunda porque Herodes, o perseguidor, havia morrido. E José acolhe prontamente a ordem recebida e, com obediência confiante, dá-lhe seguimento. Mt 2, 13-15. 19-23.
Não hesita nem se queixa, apesar do nascimento ter sido há tão pouco tempo, da fragilidade do Menino, da debilidade de Maria. Não teme a noite, nem a incerteza e o cansaço da viagem. Dócil e ousado, faz-se ao caminho. Que belo exemplo nos deixa: prontidão em ouvir, generosidade em arriscar, disponibilidade para agir, fidelidade em obedecer, discernimento para acertar na opção a tomar, cuidado solícito em salvaguardar a sua família. José, movido pelo amor, realiza a missão recebida.
A fuga e o regresso, facto com algum fundo histórico, mas sobretudo simbólico e teológico, são aproveitados por Mateus para fazer uma excelente catequese sobre Jesus e a sua família. José, o esposo de Maria; Maria, a Mãe do Menino; Jesus, o filho de Deus, todos unidos pelo mais fiel amor, pela mais profunda comunhão, pelo maior desejo de fazer o que o enviado de Deus havia anunciado como promessa e, agora, se realiza neles e por eles. Hoje, celebramos a Festa da Sagrada Família de Nazaré, referência insubstituível para “todo o que faz a vontade de Meu Pai que está no céu”, dirá Jesus mais tarde - Mt 12, 50, acrescentando: “Esse é Meu irmão, Minha irmã, minha Mãe”. Referia-se aos discípulos, a nós, à Igreja que somos a Sua nova família.