A CIMEIRA UNIÃO EUROPEIA-ÁFRICA
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A África, com a sua magia, a sua floresta exuberante e a savana a perder de vista, o seu dia luminoso e colorido e a noite enfeitiçada, exerce fascínio sobre aqueles que por lá passam. E é sempre com um frémito que se aterra no aeroporto de Nairobi: por ali perto terá tido início a vida humana, por ali perto terá acontecido o salto milagroso do animal para o Homem, das vozes para a palavra, da oclusão do mundo para a emergência da luz da consciência.
Mas a África tem o condão dos extremos, como se estivesse ligada simultaneamente à inocência do Éden e ao terror do Apocalipse. A África subsariana transformou-se num campo de ruínas: fome, doença, analfabetismo, corrupção, colapso social, tiranias, sida, guerra, deslocados.
O drama da África é ter perdido a alma e a identidade. Foi lá que ouvi coisas temíveis. Disse-me um negro: "Com esta pele negra não se vai a lado nenhum." Outro atirou-me: "O vosso deus é mais forte do que os nossos - o vosso dá-vos tudo, os nossos deixam-nos na miséria."
Essa falta de confiança enraíza-se no tempo, essencialmente por causa da escravatura. O "tráfico dos negros", durante mais de três séculos, é uma das maiores vergonhas da Humanidade. No total, pensa-se que viveram escravizados pelo menos 20 milhões de africanos, pois no processo de escravização terão estado envolvidos uns 50 milhões, o que, como faz notar J. Moltmann, constituiu um dos maiores negócios de todos os tempos: os barcos circulavam permanentemente cheios, segundo este triângulo: armas e produtos da Europa para a África - escravos da África para a América - ouro, prata, açúcar, algodão, tabaco da América para a Europa.
Hegel, na sua filosofia da identidade, que absorve a diferença, não encontra lugar para a África. A História, que é a auto-realização de Deus, da Razão, caminha do Oriente para o Ocidente, pois a Europa é absolutamente o fim da História universal. A Ásia é o seu começo, mas a África "não é uma parte do mundo histórico": "O negro representa o homem natural, com tudo o que tem de indómito e selvagem."
Precisamente em Berlim, onde Hegel alcançou o cume da glória como filósofo, realizou-se em 1884 a famosa conferência que dividiu a África, não em função das realidades étnico-nacionais africanas, mas dos interesses coloniais.
Se, após a Segunda Guerra Mundial, os países africanos foram alcançando a independência política, isso não significou necessariamente melhoria das condições de vida das populações. Frequentemente, tudo piorou. Por exemplo, na década de 1990-1999, na África subsariana, o PIB por habitante caiu em média 0,2% ao ano e mais de 40% são pobres. Também porque, muitas vezes, dirigentes brutais esmagaram o povo e tornaram-se correias de transmissão de interesses de neocolonialismos.
Como acentuou o africano Kofi Annan, ex-secretário-geral da ONU, os dirigentes dos países em desenvolvimento têm de defender o primado do Direito, aderir ao mercado, combater a corrupção, garantir a estabilidade da economia, seguir políticas responsáveis, cobrar impostos de forma equitativa e transparente, responder às questões pelo combate democrático e não mediante guerras intermináveis, proteger o direito de propriedade.
Por sua vez, os países ricos terão de apoiar, retirando apoio aos tiranos e apoiando um comércio justo, que alivie as taxas de importação aos produtos desses países pobres, de tal modo que não tenham de enfrentar tarifas e quotas incomportáveis nem competir com produtos subsidiados dos países desenvolvidos. Precisa-se de mais investimento e ajuda ao desenvolvimento, mas terão de ser esses próprios países a auto-ajudar-se, com projectos simples e eficazes, que parecem milagrosos, como mostraram, por exemplo, Amartya Sen e Muhammad Yunus, "o banqueiro dos pobres", ambos galardoados com o Prémio Nobel.
A Europa tem responsabilidades especiais para com a África, sendo legítimo esperar que a próxima cimeira UE-África durante a presidência portuguesa da União seja bem preparada e obtenha resultados eficazes e duradouros.