Lago Tiberíades
NÃO TENHAIS MEDO. SOU EU. TENDE CONFIANÇA
Georgino Rocha
Exortação revigorante dirigida a pessoas amedrontadas.
Exortação firme e determinada num contexto de perigo iminente. Exortação
clarificadora de fantasmas possíveis e identificadora de rostos perdidos na
noite.
A cena ocorre no mar de Tiberíades. Os intervenientes
principais são Jesus de Nazaré e os discípulos que se deslocam numa barca e já
estão longe da terra. A ocasião surge no percurso da travessia. A circunstância
é a da tempestade ameaçadora. E os gestos e as palavras que se percebem são de
gritaria e de pânico. E não era para menos!
Ter medo é humano. Demonstra-o a reacção dos discípulos que
fica como metáfora plástica de tantas outras situações em que a vida ou algum
bem apreciável está em perigo. Sirva de ilustração a precariedade laboral e o
risco de desemprego, a incerteza face ao futuro, as catástrofes naturais, a
doença prolongada e a aproximação da morte, o abandono e a solidão, a perda de
sentido para a vida, o silêncio aparente de Deus, o fracasso final da existência.
Há razões sérias para fazer experiências de medo. Importa assumir o facto e
saber tirar os possíveis ensinamentos.
O medo proporciona oportunidades para o ser humano se
conhecer melhor, medir as próprias forças, saber até onde pode ir nas suas aventuras
e conter-se nos seus impulsos e desejos; avaliar o ambiente que o rodeia, suas
energias positivas e seus elementos destruidores; adquirir mais consciência do
valor do outro e procurar formas adequadas de relacionamento.
No entanto, o medo pode ser extremamente perigoso ao tomar
conta da pessoa, ao instalar-se no coração, ao apoderar-se da razão, ao invadir
a consciência, ao condicionar a liberdade. O caso de Pedro que se vai afundando
é paradigmático. A pessoa amedrontada pensa só em si, esquece a sorte dos
demais, perde a noção das circunstâncias e não adverte nas suas causas.
Curiosamente, fica impossibilitada de sair da situação. Então clama angustiada
e confiante.
A terapia do medo bloqueador surge clara no episódio da
barca assolada pelos ventos, prestes a afundar-se, e na atitude dos discípulos,
sobretudo de Pedro: aceita a mão de Jesus que o segura, caminha ao seu ritmo,
regressa ao grupo. Então, uma voz se ergue em tom exortativo: Tende confiança.
Sou Eu. E amainam os ventos, desfaz-se a fúria das ondas. Experimentar a força
desta presença amiga é a melhor terapia do medo. Ninguém está só nas suas
tribulações. Exemplos luminosos desta certeza confiante ficam na história nos
testemunhos de doentes crónicos, de condenados em campos de concentração, de
mártires da consciência e da fé.
Também os discípulos de todos os tempos escutam em tons
diversos a ressonância à palavra de Jesus: Ânimo, coragem, sou eu! Serenai o
vosso espírito, recuperai o controle das emoções, saboreai a bonança que vem
depois da tempestade, apreciai a brisa suave, rumai a terra firme onde nos
espera a multidão desejosa de ouvir o relato da nossa experiência tormentosa
que dá consistência à adesão filial de cada um ao amor de Deus Pai.
A valentia do cristão nasce desta experiência e alimenta-se
desta certeza. São João da Cruz, num dos seus poemas místicos mais notáveis,
atesta-o maravilhosamente: “Se me colhe a tempestade e Jesus vai a dormir na
minha barca, nada temo porque a Paz está comigo”.