Migrações, o nosso ADN
1. Sendo a condição humana migrante por natureza, todos nascemos migran-tes, num tempo e espaço concretos. A viagem de cada história de vida e da grande história humana que nos prece-de, inscreve na árvore genealógica de cada pessoa um comum (ancestral) cha-mamento à unidade. 18 de Dezembro é o Dia Mundial do Imigrante. Estima-se que bem mais de 200 milhões de pessoas são esta comunidade migrante hoje, que, porventura, deixarão de o ser amanhã, pois os seus descendentes, se assim as condições forem dessa normalidade, farão a sua casa onde nascem e onde criam as suas raízes. As migrações que têm atravessado os séculos, conduziram-nos até ao presente, num gratificante (embora muitas vezes exigente, ou mesmo chocante) encontro de mentalidades e culturas.
2. Quando, por exemplo, no século passado, o cego orgulho dos nacionalismos trouxe à ribalta a ilusão da “raça pura”, as desumanas e grotescas consequências não se fizeram esperar…facto que também nos demonstra cabalmente que, vão as ideias dos homens onde forem, habita o nosso comum ADN essa condição migrante que se reveste de “uno” desígnio apreciador da diversidade. Vai crescendo esta mesma consciência da pluralidade de expressões de ser e de ver a outra cultura como parte de um todo que nos une. É neste sentido que surge a Declaração Universal sobre a Diversidade Cultural (2002) que considera a cultura (a viver em encontro de culturas) como «o conjunto dos traços distintivos espirituais e materiais, intelectuais e afectivos que caracterizam uma sociedade ou um grupo social e que abrange, além das artes e das letras, os modos de vida, as maneiras de viver juntos, os sistemas de valores, as tradições e as crenças».
3. São as viagens dos séculos que herdamos, de que somos fruto em todos os 1001 cruzamentos de encontros e desencontros, migrações de que, afinal, provimos. Nesta razão, consequentemente, também ao Portugal viajante mestiço que fomos e somos, só pode haver um olhar sensibilizado e acolhedor, sendo todas as formas de exploração a diminuição de si próprio na limitação forçada do outro. Diga-se que se há grito contra a nossa própria identidade humana, numa comunidade portuguesa que continua a ter cerca de 5 milhões de concidadãos por esse mundo fora, é quando se verificam situações de exploração. Também aqui, o sentido itinerante, migrante, da própria origem natalícia, propõe-nos o inadiável convite existencial criador de proximidades. Afinal, (re)conhecendo o nosso ADN da condição humana, nascemos à mesma lareira.
Alexandre Cruz