quinta-feira, 13 de outubro de 2005

Um artigo de Helena Garrido no DN

A pobreza racional
Uma em cada três mulheres será, durante a sua vida, espancada, coagida a manter relações sexuais ou maltratada, em geral por um membro da família ou um conhecido. No Egipto, 94% das mulheres conseguem encontrar pelo menos uma justificação para o marido lhes bater. Catorze milhões de adolescentes, com idades entre os 15 e os 19 anos, dão à luz todos os anos. Um número que corresponde a quase uma vez e meia a população portuguesa. Não se conhece a dimensão do problema das que têm filhos ainda mais jovens. As raparigas que pertencem a grupos mais pobres têm três vezes mais hipóteses de ser mães adolescentes do que as de estratos económicos superiores. E as adolescentes têm o dobro da probabilidade de morrer de parto.
São verdadeiras imagens de terror. Inimagináveis por serem desumanas, inacreditáveis pela sua irracionalidade. Estão no relatório sobre Igualdade das Nações Unidas.
O outro lado do espelho deste mundo está na educação. O número de mulheres analfabetas é o dobro do registado entre os homens. E nas regiões mais pobres há mais raparigas que não frequentam a escola do que rapazes.
É conhecimento adquirido pela prática que a educação das mulheres tem um efeito multiplicador de desenvolvimento muito significativo. São as mulheres que acompanham em geral os filhos. Se tiverem ido à escola, sabem valorizar a sua importância orientando os filhos para a escolarização e conhecem os cuidados de saúde e alimentação que devem ter com as crianças. Em linguagem económica, contribuem para a subida do capital humano, aumentando o potencial de crescimento da economia.
Educação e mais educação, a par de iniciativas como as dos microcréditos, são as soluções conhecidas. O Nobel Amartya Sen é uma referência neste assunto.
A razão por que o mundo permite que se continue a assistir à degradação das condições de vida dos países pobres, com as mulheres em posição ainda mais grave, é inadmissível. Todos sabem que há políticas eficazes de combate à pobreza e os seus custos seriam muitíssimo inferiores aos proveitos do desenvolvimento. A diferença é que alguns perderiam as rendas que exploram com a pobreza das mulheres e da população em geral. É por esses que vamos lendo o que acontece no mundo. E vemos o horror que se vai passando em Ceuta.

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