quinta-feira, 2 de junho de 2022

RIA DE AVEIRO vista por Ribeiro Couto


RIA DE AVEIRO

Na ria de Aveiro
Quero um pequenino
Barco moliceiro.
Também sou menino.

Na ria de Aveiro
Podeis vir comigo,
Barco moliceiro
Nunca tem perigo.

Nunca se naufraga
Na ria inocente:
Da crista da vaga
Vêm braços à gente.

Quer vão ao moliço,
Quer soltem as redes,
O mar é submisso
Aos barcos que vedes.

Brancas, amarelas,
Na ria de Aveiro
Se espalham as velas:
Brinquedo ligeiro.

Também sou menino,
Ó moças de Aveiro!
Dai-me um pequenino
Barco moliceiro.


RIBEIRO COUTO
1944


Ribeiro Couto (1898-1963) 
terá passado por Aveiro em 1944 
- pelo menos é essa a data do seu poema -, 
onde se deixou cativar pela graça 
quase alada dos barcos moliceiros. 
Caso Curioso, 
na mesma época estabeleceria 
relações de índole literária 
com Mário Sacramento.

"Aveiro e o seu Distrito", 
n.º 20, Dezembro de 1975



quarta-feira, 1 de junho de 2022

Dia Mundial da Criança - Vamos celebrá-lo todos os dias?

O dia 1 de junho começa bem com o Dia Mundial da Criança. Vão cantar-se loas ao futuro do mundo de que serão protagonistas os meninos e meninas dos nossos dias, e até, talvez por momentos, se esqueça a guerra que tantos órfãos vai deixar para o futuro. Guerra ou guerras, que o mundo está cheio de lutas fratricidas.
Os meninos e meninas da minha geração ajudaram a construir o presente. Olhando para trás, jamais esquecerei amigos e colegas que saltaram dos bancos da escola para o mundo do trabalho, onde aprenderam profissões, sem tempo para brincar. No fundo, fizemos as caminhadas possíveis, de sucessos e fracassos, de que nos orgulhamos, nuns casos, e arrependemos, noutros.
Neste Dia Mundial da Criança, celebrado em Portugal desde 1950, não faltarão eventos para os mais novos e para todos os gostos: Festas, visitas a museus, jogos, brinquedos, espetáculos, prendas, leituras, desportos e muito carinho.
As crianças sentir-se-ão muito felizes porque estarão a ser os reis e rainhas do dia, centro de todas as atenções, aplaudidas e acarinhada, enaltecidas entre risos abertos e promessas generosas. Contudo, no dia seguinte, já amanhã, cairão na realidade dos dias iguais, na monotonia da luta para vencer obstáculos, nem sempre ultrapassados. E não seria muito bom que soubéssemos criar, dia a dia, hora a hora, condições para que o Dia Mundial da Criança passe a ser celebrado todos os dias do ano?

RIA DE AVEIRO vista por Raul Brandão

Ria na Murtosa


"A ria é um enorme pólipo com braços estendidos pelo interior desde Ovar até Mira. Todas as águas do Vouga, do Águeda e dos veios que nestes sítios correm para o mar encharcam nas terras baixas, retidas pelas dunas de quarenta e tantos quilómetros de comprido, formando uma série de poças, de canais, de lagos e uma vasta bacia salgada. De um lado o mar bate e levanta constantemente a duna, impedindo a água de escoar; do outro é o homem que junta a terra movediça e a regulariza. Vem depois a raiz e ajuda-o a fixar o movimento incessante das areias, transformando o charco numa magnífica estrada que lhe dá o estrume e o pão, o peixe e a água de rega. Abre canais e valas. Semeia o milho na ria. Povoa a terra alagadiça, e à custa de esforços persistentes, obriga a areia inútil a renovar constantemente a vida. Edifica sobre a água, conquistando-a, como na Gafanha, onde alastra pela ria, aduba-a com o fundo que lhe dá o junco, a alga e o escasso, detritos de pequenos peixes…"

Raul Brandão
“Os Pescadores”

Vitorino Nemésio - Pomba Te vejo...


Pomba Te vejo...

Pomba Te vejo...
E vão, de Ti coroadas,
Espírito impassível,
Promover as aradas
Sobre a terra possível.

Paráclito no terno,
Nem terceiro nem primo,
Nem segundo no eterno,
Mas triádico ao cimo.

Vem, Espírito Santo,
Por nome amor e asa,
Como a áscua de espanto
Acende a mente e a casa.

Os corações repletos
Serão de Ti, que amplias,
Como os grãos são completos
Já nas vagens esguias.

Das quais Uma, à luz núncia,
Para mais que anjos feita,
Abre a cruz da renúnica

Sobre a Terra imperfeita.
Vem na consolação,
Indene a gáudio e a pranto,
Tu, Padre, e à dextra mão
O Filho, Espírito Santo.

Vitorino Nemésio

NOTA: Li hoje no Correio do Vouga

terça-feira, 31 de maio de 2022

Dia dos Irmãos - O meu irmão Armando Grilo

Celebra-se hoje, 31 de Maio, o Dia dos Irmãos. Dia adequado para os irmãos conviverem, recordarem vivência partilhadas em comum e sentirem-se mais próximos, já que a vida apressada muitas vezes os afastam. Eu só tive um irmão, o Armando, que já partiu para o seio maternal de Deus, apesar de ser mais novo do que eu. A vida tem destas coisas.
Apesar disso, não esqueço o meu irmão, que me tratava por mano. Não me recordo de alguma vez me chamar Fernando. E ele, para mim, era o Menino e nunca o Armando. A sua partida para Deus, não o afastou dos meus quotidianos. A sua imagem, o som da sua voz, o seu sorriso franco e o espírito alegre que com todos partilhava continuam a ocupar um espaço indelével na minha alma.
Há tempos,  estive no cemitério da Gafanha da Nazaré, onde fui para conversar com ele e com outros familiares e amigos. Não vim de lá deprimido, mas feliz. As conversas fazem-nos sempre muito bem, quando bem intencionadas. A minha intenção de os visitar foi alimento para as saudades. E com o meu irmão, naquele dia, saquei do saco das memórias as brincadeiras à volta do meu pai, quando ele, regressado de uma viagem à Terra Nova, se sentou numa cadeira para nos ver brincar no terraço.
Até um dia, Menino!

Fernando Martins

GDG — Primeiros corpos gerentes

A Gafanha da Nazaré foi sempre uma terra de desportistas de diversas modalidades. Nunca faltaram razões nem pessoas para levarem à prática o desporto, de forma amadora, mas com paixão. E tivemos atletas que chegaram longe, mas disso falaremos numa primeira oportunidade.
Para abrir o apetite, lembramos apenas que no dia 31 de Maio de 1968 foram eleitos os primeiros corpos gerentes do Grupo Desportivo da Gafanha, cujos cargos ficaram assim distribuídos:
Assembleia Geral: Presidente, Pe. Domingos José Rebelo dos Santos; Vogal, Manuel Vergas Caspão. Direção: Presidente, José Henrique dos Santos Sardo; Secretário, José Alberto Ramos Loureiro; Tesoureiro, João Gandarinho Fidalgo; Vice-presidente, Carlos António da Silva Loureiro; Vogal, Hortênsio Marques Ramos. Conselho Fiscal: Presidente, Carlos Sarabando Bola, Vogais, Nelson Mónica Modesto e José Casqueira da Rocha Fernandes

segunda-feira, 30 de maio de 2022

Há desigualdades que matam

Crónica de Bento Domingues
no PÚBLICO

Há muito que o Papa Francisco alertou as igrejas, as religiões e a sociedade para uma realidade em que não se queria pensar: estamos a viver a III Guerra Mundial aos bocados. A guerra, pela invasão da Ucrânia, veio ter com um Ocidente distraído

1. Vivemos, como humanos, na e através das experiências da linguagem ou, melhor, das linguagens. A significação das nossas concepções, afirmações e negações depende do seu uso. O uso profano e religioso não são da mesma ordem, embora se possam servir das mesmas palavras. A diferença da linguagem do sagrado nota-se, sobretudo, no culto [1]. Quando, no Credo, dizemos que Jesus Cristo desceu dos céus, foi por nós crucificado sob Pôncio Pilatos, ressuscitou ao terceiro dia, conforme as Escrituras, e subiu aos céus onde está sentado à direita do Pai, só tem sentido no âmbito das confissões de fé. Fora desse contexto, presta-se ao ridículo. Por outro lado, essas expressões nasceram num contexto cultural que já está muito longe das nossas experiências actuais de relação entre o sagrado e o profano.

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