Um acordo histórico foi obtido na comissão teológica mista entre a Igreja Católica e as Igrejas Ortodoxas. No documento reconhece-se pela primeira vez o "primado" do Papa, uma questão que divide católicos e ortodoxos desde 1054, quando se consumou a ruptura entre o cristianismo ocidental e oriental.
O documento foi aprovado pela comissão numa reunião em Ravena (cidade italiana que foi sede do Império Romano do Ocidente), entre 8 e 14 de Outubro, e divulgado quinta-feira. Ao falar sobre o "primado" do bispo de Roma (o Papa), o texto diz que acontece no quadro da "conciliaridade" ou "sinodalidade", noções que remetem para a noção de colegialidade de todos os bispos, católicos ou ortodoxos. "O papel do bispo de Roma na comunhão de todas as igrejas deve ser estudado de modo mais aprofundado", diz o documento. O próprio Papa João Paulo II tinha já escrito, na encíclica Ut Unum Sint (Que todos sejam um), sobre o ecumenismo, que o tema devia ser discutido entre as igrejas cristãs. Apesar da dimensão de colegialidade ter sido assumida pelo Concílio Vaticano II, a Igreja Católica continua a ter um governo hierárquico.
Com o título Consequências eclesiológicas e canónicas da natureza sacramental da Igreja - Conciliaridade e sinodalidade na Igreja, o texto não foi assinado pelo Patriarcado (ortodoxo) de Moscovo, que saiu do encontro em conflito com o patriarcado de Constantinopla (primaz espiritual para os ortodoxos). Os russos, metade dos 250 milhões de cristãos ortodoxos, vão pronunciar-se em breve.
Walter Kasper, o cardeal que preside ao Conselho Pontifício para a Unidade dos Cristãos, comentou que o documento não fica posto em causa pela ausência russa. Mas acrescentou à Reuters que, sendo um "modesto primeiro passo para a unidade", o caminho "será longo e difícil".
Também entre o Vaticano e o patriarcado russo as relações são mais próximas. A possibilidade de um encontro entre o Papa e o patriarca de Moscovo, sempre adiada com João Paulo II, é evocada com frequência.
Publicado ao mesmo tempo em Roma, Atenas, Chipre e Istambul, o texto diz que as "prerrogativas" do bispo de Roma devem ser agora discutidas, tendo em conta as "diferenças na compreensão" sobre o tema. A próxima reunião da comissão está prevista para daqui a dois anos.
[O documento está disponível em
vatican.va/roman_curia/pontifical_councils/chrstuni/ch_orthodox_docs/rc_pc_chrstuni_doc_20071013_documento-ravenna_en.html]
Um artigo de António Marujo no PÚBLICO de Domingo