quinta-feira, 1 de março de 2007

Um artigo de D. António Marcelino


MISTICISMO,
UMA MODA OU UM GRITO
DE SOBREVIVÊNCIA?


O tempo é de contrastes. Por uma lado, violência, barulho, atordoamento e o navegar no vazio ou no superficial que diverte e não exige nem pede nada. Por outro lado, grupos de jovens e de adultos, de todos os lugares e continentes, deslocam-se e encontram-se, ciclicamente, em lugares convidativos para rezar, para experimentar a eloquência do silêncio e olhar, serenamente, para dentro, já que por fora não há qualquer novidade que prenda ou interesse.
Num clima de modernidade empobrecida em que tudo se apresenta como passageiro e descartável, não falta gente a denunciar o vazio reinante e a procurar o essencial, o permanente, o que dá segurança e sentido.
Não interessa dizer qual o grupo mais numeroso. No compulsar do coração e no caminho de procura exigente da verdade e do bem, o número não é a melhor medida da realidade, nem o melhor critério para aquilatar do seu valor. Nas democracias o número é decisivo, mas, também, por isso, se sente a fraqueza de um sistema que, apesar de tudo, ainda é, no reconhecimento dos direitos e na possibilidade de participação, o menos mau. Mas, no restante da vida, o número pode marcar apenas o mundo dos interesses para aqueles que com ele sossegam, se contentam e beneficiam.
O misticismo, como forma de interiorização e de procura profunda da vida que circula nas raízes do nosso ser, tem a expressão da total gratuidade quanto ao tempo, às relações mútuas e aos trabalhos realizados.
Achei curioso, e não me escandalizei nem estranhei, ao ler palavras do realizador do filme “ O grande silêncio”. Contava ele que ao pedir autorização para filmar dentro do grande Convento da Cartuxa de Grenoble, o abade lhe disse que teria de esperar quinze anos para que tal lhe fosse permitido… Fora do clima da vida dos monges, esta resposta parece ridícula e pouco respeitadora. Assim não o entendeu o cineasta e a sua paciente e compreensível espera fez que o tempo lhe fosse encurtado…
Estou cada vez mais convicto de que o misticismo, ou seja, o regresso ao espiritual e ao sagrado nos tempos que correm não é uma moda, mas, antes, um grito profundo que muitos já não conseguem calar e para o qual procuram resposta que os situe numa vida consequente, com progressivo sentido e novos horizontes.
O deserto também é fértil, como o silêncio é eloquente. Depende da atitude de quem, livremente, se mete pelo deserto, ou de quem se entrega, voluntariamente, ao silêncio.
Em tempos idos, eram os padres e os religiosos que faziam dias de retiro espiritual em silêncio, deixando os trabalhos do dia a dia, para depois regressarem com mais coragem a enfrentar as exigências que os mesmos não dispensam. Hoje, são jovens e adultos, homens e mulheres, casais e idosos, doentes e sãos, intelectuais e rurais os que cortam com a vida normal por uns dias, para mergulharem da oração e na reflexão. Nenhuma alienação. Essa poderá acontecer na assistência ao jogo desportivo, não na procura livre de um espaço de respiração e alimento do espírito.
A nostalgia de Deus, bem como a necessidade de confronto de uma vida desgastante com um ideal que a supera, são mais frequentes do que se pode imaginar. Quem acordou para que, a tempo, o possa verificar e agir em consequência, já exorcizou, por si, os tão frequentes esgotamentos de que muitos se queixam. O esgotamento é a nova epidemia de quem restringe a vida a quadros fechados e restritivos e não deixou de olhar horizontes mais largos. Assim, tudo fica reduzido aos limites de uma vida empobrecida por dentro.
Ninguém procura o enriquecimento espiritual porque é moda. Muitos o procuram para poderem, de novo, ser os condutores lúcidos de si próprios.

quarta-feira, 28 de fevereiro de 2007

Sorri sempre

Sorri!
Sorri sempre
Ainda que o teu sorriso
Seja triste…
Porque mais triste
Que o teu sorriso triste
É a tristeza
De não saber sorrir!...


Num placard de uma clínica

Ao sabor da maré

Ainda a questão do aborto DEMOCRACIA INFANTIL
Os Partidos políticos dividem muito os portugueses. É lógico. Diferentes maneiras de ver e viver a coisa pública, variadas concepções do mundo, diversas posições face à justiça social. Apesar de tudo isto, que é indiscutível, penso que há situações político-sociais que merecem ou deviam merecer algum consenso. Mas não foi o que aconteceu, perante os resultados do referendo sobre o aborto. Os Partidos da esquerda parlamentar marginalizaram ou ignoraram os do centro e direita, apesar das sugestões do Presidente da República, no sentido de haver o entendimento possível, para se evitarem divisões entre os portugueses, na hora da preparação das leis adequadas. E até marginalizaram os deputados do centro-direita, que apoiaram o "SIM". Os portugueses que somos são assim, numa demonstração clara de infantilidade democrática, onde o diálogo é quase impossível, quando devia ser sempre possível. Isto não quer dizer que tenha de haver consenso em todas as circunstâncias. Não sou utópico. Mas acredito que é a conversar que os homens e mulheres do nosso tempo se têm de entender. Só ganham se souberem e quiserem dialogar sobre o que a todos diz respeito, como é o caso do aborto.
É óbvio que é legítimo fazer coligações ou estabeler acordos com quem nos apetece, por ser esse um direito individual ou de grupos. Mas não me parece certo fazê-lo tão ostensivamente como nesta situação foi feito. Claro que o “SIM” ganhou e que a legislação que se segue tem de respeitar essa opção dos portugueses, a grande maioria dos quais nada terá a ver com a doutrina da Igreja Católica a esse respeito. Mas será que os do “SIM” terão mesmo que ignorar todos os outros? Penso que não. Mas também penso que muitos das actuais gerações no poder não têm espírito de diálogo, de partilha de opiniões, de capacidade de lutar por consensos. Vieram de tempos em que o diálogo era muito complicado ou inexistente e estão marcados por esse clima. Vejam a maneira como falam ou discursam no Parlamento. Parece que estão permanentemente zangados com tudo e com todos. Fernando Martins

terça-feira, 27 de fevereiro de 2007

Túmulo de Jesus?

Alegada «descoberta» da sepultura de Cristo retoma polémicas sobre Madalena e a ressurreição

“O TÚMULO DE JESUS”

Depois da grande "revelação" sobre a vida de Jesus, trazida por Dan Brown no seu "Código da Vinci", é agora a vez dos realizadores James Cameron e Simcha Jacobovici apresentarem um documentário com novas "revelações": Jesus não ressuscitou, mas está sepultado em Jerusalém, com a família, incluindo o filho que teve com Maria Madalena.
A produção aproveita a onda mediática produzida pelo sucesso de Dan Brown - embora as novas teorias entrem em contradição com várias das suas teses. O documentário produzido pelo realizador de Titanic, James Cameron e realizado pelo judeu canadiano Simcha Jacobovici, estreia esta semana no Discovery Channel.
"O Túmulo Perdido de Jesus" parte da análises de dez ossários encontrados em 1980, no Bairro de Talpiot, em Jerusalém, e que presentemente estão entregues à Autoridade de Antiguidades de Israel e guardados num armazém em Bet Shemesh.
Os arqueólogos que estudaram as peças chegaram à conclusão, em 2003, de que o sarcófago data do século I d.C. No entanto, conteúdo, caligrafia e revestimento da inscrição tornam a sua autenticidade duvidosa. Além disso, salientam que os nomes nas inscrições eram muito comuns na altura.
"A afirmação de que o túmulo (de Jesus) foi encontrado não está apoiada em nenhuma prova e é somente uma manobra publicitária”, afirma o professor Amos Kloner, da Universidade Bar-Ilan e arqueólogo oficial do Distrito de Jerusalém, que fiscalizou as escavações do mesmo local em 1980.
"É muito pouco provável que Jesus e seus parentes tivessem um túmulo familiar ", explicou Kloner. "Eles eram uma família da Galileia sem vínculos em Jerusalém. O túmulo de Talpiot pertenceu a uma família de classe média do primeiro século de nossa era", defende.
"É uma óptima história para um filme, mas é impossível. É um disparate»", disse ao jornal Jerusalem Post.
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Um artigo de Alexandre Cruz


Alma (d)e património
que se perdem


1. Das reflexões decisivas que estarão em futuro próximo no mapa nacional, será, precisamente, a discussão sobre o que fazemos com as terras, aldeias, freguesias, tradições e patrimónios do interior de Portugal. Com a concentração nas grandes cidades de tendência litoralizante, e a impressionante desertificação do interior do país (numa desatenção continuada de políticas insensíveis a esta realidade específica), com o fechar múltiplos serviços, será caso para dizer que não há interior que resista.
Abandonámos essas nossas terras carregadas de alma, de história, de identidade plural que constituiu a nossa própria nacionalidade; foram muitos os grandes portugueses (agora em voga, daqui a uns meses esquecidos) que nos enchem de orgulho e que ergueram, fruto de vida dinâmica em horizonte rasgado, símbolos de uma comunidade vida, com alma e sentido, espelhados em castelos, muralhas, catedrais, jardrins, espaços públicos, escolas e hospitais, tudo acompanhado com uma beleza natural única da floresta que possuímos neste lindo país de sol.
2. Quem percorre, com atenção, alguns caminhos do interior verifica que o panorama é desolador. Há longas semanas fizemos essa viagem por algumas terras mais interiores, e a sensação do abandono impressiona. E é tanto mais assustador quando sabemos que ao abandono “natural” das populações (pela busca legítima de melhoria de vida), pela falta de política de projecto/visão e pelos números económicos que comandam a vida, corresponderá o fechar e refechar de tudo o que não compensa. Estranho, quase não queremos povoar na totalidade o país que outrora foi conquistado às custas de tantas vidas… (Quando o nosso Parlamento reflecte a sério nisto mesmo?)
Os serviços que se fecham, especialmente nos lados do interior e os critérios que presidem a esse “fechar” acabam por matar, por completo, o resto da esperança nas populações que lá residem. Que lá nasce (os poucos que nascem pois as novas famílias já lá não querem habitar – ou não lhes é permitido construir casa devido aos PDM’s - na terra em que correram e saltaram, tudo dificulta esse resto de saudade em se viver a vida onde se nasceu), os que nascem, nesta correria de modas citadinas, até correm o perigo de receber o estigma de ser da “aldeia”…, esquecendo-se, entre tantas vantagens, que a qualidade do ar lá é incomparavelmente melhor que na corrida da cidade.
3. Não teria merecido o interior de Portugal uma aposta estratégica diferenciadora – a realidade é diferente – das vivências litorais? Não terá havido oportunidade para uma concertação geral de energias na promoção do país como um todo – não só o puxar da brasa para a própria sardinha - numa dinâmica mobilizadora do interior? Não…? Como a capital política – Lisboa – vê Portugal como um todo? (Ou o país será só Lisboa?!). O que está feito, está feito! E pelo andar da carruagem nada há mesmo a fazer! Não conseguimos apostar na visão estratégica das causas, então acolhamos – já dizemos a médio prazo - as consequências da nossa demissão.
Que sentirão as populações e os governos quando, daqui a 15 anos, as freguesias e concelhos do Portugal interior forem “comprados” pelos turistas nórdicos ou inteiramente habitados por comunidades imigrantes entre nós?! Nada de especial, preparemo-nos para esta realidade, pois é por ela que continuamos a optar.
4. O perceber-se que cada serviço público que fecha arrasta outro e traz consigo a fuga total das populações (de meia idade, pois as populações mais idosas já não podem sequer fugir) para as grandes cidades de tendência litoral, comoverá profundamente (e eternamente) todos os que deram a vida para Portugal ter a fronteira lá em cima, junto a Vilar Formoso. Esses, onde quer que estejam, vêem o país interior padecer, não vislumbrando qualquer centelha visível, explícita, de preocupação política e estratégica decisivas. Cada vez faz mais sentido perguntar-se: ainda queremos o interior do país ou entregamo-lo? Ou menos que a visão turística transfigure em turismo o país que “não queremos” (não venham os outros inventar, criar, para depois nos explorarem na nossa própria terra…como as laranjas do Alqueva daqui a breves anos.).
E ainda, talvez mesmo o mais importante: nesse futuro, daqui a 15 anos, os nomes das ruas mudarão, serão outras as gentes a habitar o interior, a alma e o património português perder-se-á para sempre no tempo... Terra não habitada é terra esquecida. É admirável o esforço de tantos projectos e apostas, concretizados mesmo em Roteiros do Património; mas não chega. Será essencial repovoar o interior do país e definir itinerários claros para lá chegar. Quando não, quanta “alma” de história, memórias e património de Portugal, receberá uma implusão cultural (e depois queixamo-nos de sermos um povo com falta de auto-estima, dos mais tristes da Europa). Abramos as portas e dêmos alegria e vida(s) ao interior do País! Ou queremos este país sombrio e estranho, nada formoso?

Europeus felizes

COM EMPREGOS EXIGENTES E STRESSANTES
Os europeus consideram-se em geral relativamente felizes. Em Portugal, a percentagem dos que afirmam isso mesmo é de 86% - idêntica à média da União Europeia (UE). Está satisfeito com o seu nível de vida? Com a casa que tem? Estas foram algumas das perguntas feitas. Respostas: 75% dos portugueses e 83% dos cidadãos da UE dos 25 (a sondagem foi feita antes do alargamento a 27) estão satisfeitos com o seu nível de vida; 89% e 92%, respectivamente, estão contentes com as suas condições de habitabilidade. Já o trabalho é, para uma "significativa minoria" de trabalhadores da UE, uma fonte de mal-estar: dois quintos dizem que têm um emprego demasiado exigente e stressante. Em Portugal, são ainda mais: 55%. O país é o quinto com pior avaliação neste capítulo.
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Fonte: PÚBLICO

Um artigo de António Rego




A IGREJA E O PODER

Triunfo e desencanto ocupam algumas das análises ao momento que vivemos. Triunfo de analistas que não escondem o júbilo pelo facto de, com o referendo ao aborto, a Igreja ter sido derrotada, e ao mesmo tempo essa derrota significar o fim do ciclo de domínio na sociedade portuguesa. É um grito de vitória por, finalmente, a sociedade se ter libertado do osbcurantismo e do domínio clerical.
Alguns sectores políticos e religiosos não escondem o desencanto. E pedem à Igreja que recupere o lugar que ocupou na vida social portuguesa. Como que a exigir uma restauração da fé como império, do altar como trono, da hierarquia como poder, da sociedade como redil. Nenhuma destas perspectivas enquadra a Igreja na sua missão essencial e no lugar que deve ocupar na cidade dos homens.
A primeira afirmação da Igreja tem de caracterizar-se pelo serviço a todas as grandes causas do homem, sendo que a primeira é o anúncio da salvação em Jesus Cristo. Da afirmação da fé e das suas incidências, decorrerão todos os planos de presença da Igreja no mundo e do seu lugar na história. Este projecto, como se sabe, não é unívoco e procura em cada tempo interrogar-se sobre os sinais e as respostas mais eficazes e inteligíveis do Evangelho.
Hoje, perante o mundo real, a Igreja posiciona-se com maior liberdade porque independente dos poderes políticos e económicos. Com humildade, por reconhecer que existem outras opções religiosas e outras linhas de procura para os grandes problemas do homem e da história. Mas trabalha no seu terreno específico, proclama com maior vigor os caminhos do Evangelho, dialoga com todos os homens de boa vontade na procura das melhores respostas para as questões mais inquietantes que o mundo de hoje coloca. E lança perguntas sobre temáticas que parecem esclarecidas e arrumadas.
Não vale a pena alimentar a amargura de poderes perdidos em tronos duvidosos e em paradas que pertencem ao universo profano. Nem esboçar o mais pequeno gesto de saudade pelos velhos impérios. O lugar primeiro e privilegiado da Igreja é o da liberdade. E que deixe o resto para César. Não lhe faz falta.