sexta-feira, 7 de abril de 2023

Um poema de Senos da Fonseca para refletir




CHORO...


Choro este País
Do «Grande Afonso» a mais querer que um País.
Partindo em gloriosa cruzada, gladiou com o mouro infiel
Para fazer do seu Condado, um Portugal de raiz,
Numa mão a espada, a cruz na outra mão empunhada.
A mim! A mim! gritou Afonso,
E logo foge o infiel, em debandada.

Choro este País,
Onde a arraia-miúda se exaltou e se fez graúda
Parecendo já um povo por inteiro em que se tornou
Ao expulsar o intruso e pérfido castelhano,
Atirando do cimo da torre, à turba, o castelhano Andeiro:
Aqui há um povo a sonhar com Portugal nas suas mãos.

Choro este País,
Do grande el-rei João Segundo
Que os mares assombrosos, terríveis e solitários
Mandou serem navegados, e desvendados,
E logo as trevas e os medos passaram a estórias
A mostrar a grandeza de Portugal ao Mundo.

Choro este País
De onde saíram cabrais
albuquerques e outros tantos gamas,
Heróis a quem o mundo ouviu contar os mistérios,
Tão grandes como ditosas e louváveis foram, suas famas,
Ao fazer de um País, um vasto e grandioso Império.

Choro este País
Do imortal vate que nossa epopeia descreveu.
Em versos vertidos da sua pena prodigiosa
Dando ao mundo a conhecer ínclitos Varões.
E os feitos da gesta brava lusitana, grandiosa (!)
Para sempre ficaram gravados
No lirismo épico do imortal Camões.

Choro este País
Que teve de Vieira a palavra eloquente
Para defender os fracos dos abusos dos fortes.
Falando aos peixes por mor do Homem ausente,
E aos homens por mor de Deus sempre presente,
Espalhando a sublime palavra
Botão florido do mais fino recorte.

Choro este País
De Pessoa, o Mensageiro,
Poeta desassossegado cuja genialidade por louca,
ó em si não cabia,
Dispersando-se por outros «eus» que não era o seu.
E por não o ser, foi sempre obra inacabada,
De laborioso mestre a extrair beleza, onde beleza não havia.]

Mas porque choro, então, País tão grandioso?
Choro este País, não pelo que prometeu ser, mas pelo que é!
Choro o dia em que anunciou não querer,
Nunca mais! ser escravo.
País onde mais do que mandar, era preciso saber obedecer
A si, e não aos outros. A ser livre.
Não “Senhor” de nenhuma guerra
Aqui era o Povo que mandava
Aqui era o povo que reinava

Choro pois, este País, pelo que prometeu ser
E por, afinal, hoje ser
Aquilo que não queria ser.
País este, o meu,
Onde afinal foi mais fácil “explorar” que colher,
Onde cuidámos mais do vício «de ter»,
Do que do «ser»
Em que alimentámos por demais, as ambições dos novos corifeus.

E assim o País que parecia voltar a querer nascer
Não nasceu – Morreu!......

Senos da Fonseca
- Maio 2023

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