Reflexão de Georgino Rocha
para este fim de semana
O encontro de Jesus com a samaritana contém uma riqueza admirável de ensinamentos. Pelo que mostra e pelo que simboliza. Para todos os tempos. Centrado nas sedes humanas, envolve outras dimensões pessoais e colectivas, conjugais e familiares, étnicas e religiosas, espirituais e transcendentes. Centrado em dois protagonistas – o judeu Jesus e a anónima samaritana – decorre em ambiente de diálogo pedagógico esclarecedor. Quem necessita passa a dar ajuda e quem dispõe de meios acolhe os que lhe são oferecidos. João, o evangelista encenador e narrador do episódio do poço de Jacob, em Sicar da Samaria, elabora uma excelente catequese que a Igreja integra na preparação dos candidatos ao baptismo, início da vida cristã. (Jn 4, 5-42).
Era cerca do meio dia, hora avançada para quem madruga. Jesus anda em missão pelas terras áridas da Samaria. Sente-se cansado e aproxima-se de Sícar. Senta-se à beira do poço de Jacob. Fica só, pois os discípulos vão à procura de alimento à povoação. A paixão do anúncio da novidade de Deus “assalta-lhe” o coração. Ergue o olhar e vê uma mulher que vem com um cântaro vazio. O encontro pressentido e desejado vai acontecer, embora seja preciso cautela prudencial. “Dá-me de beber” é a saudação inicial que soa muito estranha ao ouvido daquela mulher. E a réplica tem algo de censura: Tu, judeu, atreves-te a fazer pedidos a uma samaritana? Jesus avança com uma proposta de sentido diferente e garante-lhe: “Se conhecesses o dom de Deus e quem é Aquele que que te diz: “Dá-me de beber, tu é que lhe pedirias e Ele te daria água viva”.
O diálogo prossegue e, de passo em passo, chega às sedes profundas da mulher samaritana, sedes de felicidade típicas de todo o ser humano. Sedes que vinham a ser saciadas em experiências várias. Aliciantes, mas passageiras e geradoras de um vazio amargo. A contra-luz, são denunciadas a superioridade do homem sobre a mulher, o apreço pela pureza étnica, a localização do culto religioso, a vida sexual instável, apesar de procurada com insistência. O diálogo faz-nos ver os cinco maridos, o monte de Garizim e o templo de Jerusalám, a rivalidade dos povos, as pautas sociais de comportamento de judeus e samaritsanos. Tudo para visualizar uma mensagem com sentido mais profundo e horizontes mas amplos.
“O que em primeiro lugar fica claro neste relato, afirma J. M. Castillo, é o respeito, a aceitação e o acolhimento humano de Jesus a qualquer pessoa. Jesus encontra-se com uma estranha que, além disso, era desprezada por três razões: os homens desdenhavam como mulher; os judeus por ser samaritana; as outras mulheres pelo seu comportamento pouco exemplar. Pois bem, a esta mulher tão desconsiderada, Jesus garante que lhe vai dar uma água que sacia todas as suas carências e seus anelos”.
A relação com Jesus progride de forma clara, indiciada nos títulos com que ela o trata: judeu, senhor, profeta, messias. E faz ver que o cântaro vazio se converte em coração cheio; o cântaro abandonado junto ao velho poço dá lugar ao coração apaixonado e exultante de alegria que parte em “saída missionária”. De esmorecida e rotineira, a samaritana transforma-se em mensageira da novidade encontrada, em testemunha qualificada e eficiente de Jesus junto dos seus conterrâneos. E destes recebe o maior elogio que o discípulo pode ouvir: “Sabemos que Ele é o Salvador do mundo”, não por causa das tuas palavras, mas “porque nós ouvimos”. A sede de Jesus ia-se saciando. A eficácia do encontro estava à vista. A água pedida transforma-se em oferta e quem a recebe converte-se em manancial de água viva que jorra abundantemente. Como em Sícar. Com a samaritana. Junto dos seus conterrâneos. E em tantas partes do mundo ao longo dos tempos, como, felizmente, a história honesta documenta
Jesus é, agora, o novo templo onde se realiza o culto agradável a Deus, é a água viva que inunda e vitaliza todo o coração ressequido e esterilizado, é a palavra eficaz que desvenda a cada um/a a grandeza da sua dignidade, é o pão saboroso que alimenta e sacia as fomes de sentido e de esperança para o nosso peregrinar no tempo, rumo a um futuro feliz, definitivo, eterno.
Pe. Georgino Rocha