segunda-feira, 26 de setembro de 2022

Um poema de Tolentino Mendonça



SETEMBRO 

Nesses dias distantes eu vagueava pelas matas
enchia a espingarda de chumbo e disparava
contra o silêncio das árvores altas
só para assistir ao espectáculo dos pássaros 
em debandada

experimentava uma exaltação — de que tenho hoje pudor
perante imagens que partem:
fragmentos rápidos, passagens, segredos que se apagam
nesses dias distantes nem suspeitava
a vida pode ser interminável

o que deixaste abandonado regressa — aprende-se depois
quando, por exemplo, a esquecida infância se parece
com certos cães deixados de propósito a muitos quilómetros
que ladram não se percebe como
à porta da velha casa


In "A NOITE ABRE MEUS OLHOS"  

Nota: Humilde homenagem ao poeta que tive o prazer de ouvir e ver em diversas circunstância da minha vida. Mas também pela admiração que por ele nutro e pela sua recente nomeação pelo Papa Francisco para as responsabilidades de primeiro prefeito do Dicastério para a Cultura e Educação, da Santa Sé.

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