Reflexão de Georgino Rocha
para o domingo XV do Tempo Comum
Esta exortação assertiva, clara e interpelante, surge na parábola do samaritano, narrada por Jesus, como resposta ao mestre de leis preocupado com o sentido da vida e com os meios a usar para alcançar a vida eterna; decorre, como consequência lógica e coerente, do amor a Deus e ao próximo, síntese de todos mandamentos, como bem acentua o jurista inquieto e desejoso de acertar na solução do futuro; comporta uma orientação fundada e constitui um guia seguro de atitudes e comportamentos para o relacionamento das pessoas em sociedade, sobretudo em situações de especial necessidade; destaca a importância da rede de cuidados e da cooperação entre os intervenientes; apresenta um dos traços mais fortes da identidade dos discípulos/cristãos e define a marca mais vigorosa do seu testemunho público. Lc 10, 25-37.
A parábola do bom samaritano é sem dúvida um dos textos mais surpreendentes e significativos no Novo Testamento, afirma Castillo, autor de La Religión de Jesús. Sobretudo trata-se de um texto capital para entender o conteúdo central do Evangelho de Jesus… Tudo se centra e se resume no mais patente que relata a parábola: num caminho solitário, um homem apedrejado quase a morrer, roubado por ladrões. Pelo mesmo caminho de dor, violência e ameaça mortal passam sucessivamente três caminhantes que vêem o que está acontecendo. Os três dão-se conta perfeitamente da situação e não querem saber. O terceiro acode imediatamente ao moribundo. É um samaritano, homem sacrílego. Esta é a história que Jesus conta para explicar quem é o próximo a quem temos que ajudar. J. M. Castillo, La Religión de Jesús, 2018.
Vai e faz o mesmo porque o amor de Deus envolve necessariamente aqueles que Deus ama, sem distinção de género ou de raça; percorre os seus caminhos de aproximação e serviço; reveste os seus sentimentos de ternura e misericórdia.
Faz-te voluntário e envolve-te em todas as causas dignas da condição humana; doa-te, por inteiro, com os teus bens, o teu tempo, as tuas capacidades de relação e influência. Vai e faz o mesmo, sente-te em viagem, portador de outros sonhos e peregrino de outras “terras”, observa a realidade por onde passas, adverte nas rotinas da vida e nas surpresas das ocorrências, aproxima-te, sem medo nem inibição, do estranho inesperado, identifica-o não como uma coisa, mas como um ser humano desfeito pelos golpes dos assaltantes, maltratado. Presta-lhe os primeiros socorros até mesmo com aquilo que te pode fazer falta, não gastes tempo em lamentações estéreis e inoportunas.
Vai e faz o mesmo, levanta-o no corpo e no espírito, tem em conta o seu ritmo e doseia o teu passo, acompanha-o e faz-te seu fiador junto de quem vai continuar o tratamento e ajudar a fazer a recuperação da saúde. Não permaneças junto dele mais tempo do que o necessário, mas dá-lhe espaços de liberdade. Garante-lhe presença amiga e protectora enquanto precisar. Depois, é indispensável que volte a ganhar confiança em si mesmo, a estabelecer relações humanas solidárias, a situar-se na vida de forma responsável, a ajudar a remover as causas que provocam situações semelhantes à que o ia vitimando.
Jesus, ao narrar a parábola do samaritano, está a fazer, de algum modo, o seu auto-retrato. Ele é o amor de Deus pela humanidade e do homem para com o seu próximo. Ele percorre os caminhos da vida, expressos, de modo eloquente, na subida a Jerusalém. Ele é assaltado e trucidado pelos seus algozes. Ele morre e é ressuscitado, expressando a vida nova, eterna e feliz, que o mestre de leis procura e que já se vai saboreando em sentimentos e gestos como os do bom samaritano. Vai e faz o mesmo. Cuida com misericórdia os maltratados na vida.
Pe. Georgino Rocha