Reflexão de Georgino Rocha
para o Domingo VI da Páscoa
Somos a morada de Deus que vem viver na nossa consciência, no mundo interior de todos os que são fiéis à Sua palavra
Jesus está na hora das grandes confidências, pois vive o tempo da despedida, de dizer aos discípulos o que lhe vai no coração e quer deixar como distintivo da sua identidade: a alegria, fruto da palavra. “Se me amásseis, ficaríeis contentes por Eu ir para o Pai”. Jo 14, 23-29.
Em diálogo franco, Jesus faz declarações que suscitam perguntas. Judas, não o Iscariotes, não entende como é que Jesus se vai manifestar, nem porque escolhe a quem o irá fazer. E formula a correspondente pergunta: “Porque vais manifestar-te a nós e não ao mundo?”; pergunta a que Jesus responde: “Se alguém me ama, guarda a Minha palavra e Meu Pai o amará. Eu e Meu Pai viremos e faremos nele a Nossa morada”.
Abre assim horizontes surpreendentes e interpelantes. Os contemplados são aqueles que acolhem o seu amor e guardam a sua palavra; a estes, Jesus dá a garantia de serem morada de Deus e de receberem o Espírito Santo. Assim, terão companhia em todas as circunstâncias da vida e nada os poderá perturbar. Assim, a saudade da despedida é compensada pela nova forma de presença. E Jesus destaca a alegria como testemunho da fé dos que compreendem o alcance destes factos, da Sua palavra.
Somos a morada de Deus que vem viver na nossa consciência, no mundo interior de todos os que são fiéis à Sua palavra. Esta opção de Deus evidencia a direcção correcta da realização humana. É a partir de dentro, da interioridade, que se faz a humanização, se alimenta a relação, se aprende a amar, a servir, a crescer na grandeza de ser pessoa, a viver em comunidade. É a partir da consciência iluminada e esclarecida por Deus, mediante os ensinamentos de Jesus e a sabedoria das culturas humanizadas, que têm consistência as opções e os critérios condicionantes das nossas atitudes pessoais e colectivas. É a partir das atitudes que a sociedade manifesta os valores predominantes e a qualidade do sentido da convivência entre os seus membros. Que contraste com a situação actual do nosso mundo?!
“A comunidade que segue Jesus não caminha para o fracasso, pois a meta é a vida… Jesus convida a percorrer um caminho historicamente concreto. Inspirada nos sinais que Jesus realizou, a comunidade cristã criará novos sinais dentro do mundo, abrindo espaços de esperança e vida fraterna”. Manicardi.
A afirmação é clara e o convite interpelante. Procura dentro de ti e encontrarás o teu melhor tesouro, aquele que te ajuda a ser mais humano, a saber conviver com maior satisfação, a sentir a realização progressiva da felicidade a que aspiras, a ser santo. Não te alienes nem deixes alienar ou anestesiar.
O Papa Francisco na canonização de dez novos santos, ocorrida no último domingo, dia 15, em Roma, destaca a santidade «ao pé da porta» e entre as panelas. Muitas vezes se fez da santidade “uma meta inacessível” e separada da vida de todos os dias, em vez de a procurar e abraçar na existência quotidiana, no pó da estrada, nas aflições da vida concreta e – como dizia Teresa de Ávila às suas irmãs – entre as panelas da cozinha.
Quem está desperto para esta presença dinâmica do Espírito aspira à santidade, vive na alegria e na confiança, aprecia e valoriza a rectidão da consciência e a sabedoria do coração, é cada vez mais humano no seu ser e no seu agir.
Pe. Georgino Rocha