para o Domingo IV do Tempo Comum
O diálogo de Jesus com os presentes na sinagoga de Nazaré põe em evidência uma coerência ousada que provoca reacções extremas. Não deixa ninguém indiferente. Dois campos se distinguem claramente. Os nazarenos passam da admiração à desconfiança, à contestação, à rejeição, ao propósito de eliminação física. Jesus, sereno, proclama a mensagem do profeta que aplica a si, e, de forma cáustica, interpela fortemente os seus contestatários. “Nenhum profeta é bem recebido na sua terra” – diz-lhes, ilustrando o alcance desta afirmação com o que aconteceu a Elias e a Eliseu. Um e outro “atendem” e são ajudados por pessoas estranhas a Israel, coisa legalmente impensável pelo contacto de “impureza” que provocava. Jesus anuncia que Deus é de todos e para todos. Lc 4, 21-30.
Profundamente desconsiderados – assim pensam – tentam desfazer-se de Jesus e silenciar, definitivamente, a ousadia do recém chegado de uma viagem por terras de Cafarnaum. Por isso, armam a estratégia de morte, atirando-o do cimo da colina da cidade. Mas, Jesus atreve-se a controlar os sentimentos e os acontecimentos e “passando pelo meio deles, seguiu o seu caminho”. Manifesta a coerência de atitudes com as convicções, de comportamentos com as opções, de formas de proceder com a mensagem anunciada. Vive o que diz. Sem hesitações. É igual a si mesmo. E mostra-nos o alcance da ousadia da coragem, deixando-nos o convite/apelo: Atreve-te a ser coerente. Sê tu mesmo. Pensa e age por ti, ainda que vás contra-a-corrente. Vê em que alicerças as tuas certezas.
O padre Possano Solá, colaborador na preparação do Sínodo sobre os Jovens, 2018, afirma que “os jovens pedem sobretudo à Igreja, hoje, coerência, regresso ao Evangelho, àquele que era o original de Jesus Cristo. E quando existem testemunhos autênticos, verdadeiros e coerentes sentem-se atraídos por eles”.
Realmente “nenhuma pessoa pode transmitir coerência a outra se não tem coerência consigo mesma. As pessoas coerentes são firmes em seus princípios e valores. transmitem sinceridade, apresentam paz interior porque são honestas consigo mesmas, ou seja, são fiéis a seus pensamentos. A coerência entre pensamento, sentimento e ação mostra um grau de maturidade profundo em uma pessoa, desenvolve um sentido interior de honestidade profunda, um sentimento que brilha com força”.
O convite/apelo que se deduz da atitude de Jesus constitui uma boa notícia para a humanidade. Só com mulheres e homens íntegros e coerentes recuperamos a nossa comum dignidade, assumimos a verdade da nossa originalidade, estabelecemos laços de fraterna solidariedade em prol do bem de todos, damos solidez à organização humanizada da sociedade e vamos lançando as sementes sadias de um futuro auspicioso em que todos se reconhecem irmãos porque filhos do mesmo Deus Pai.
O Papa Francisco na exortação apostólica «A Alegria do Evangelho» afirma: “Não se pode perseverar numa evangelização cheia de ardor, se não se estiver convencido, por experiência própria, de que não é a mesma coisa ter conhecido Jesus ou não o conhecer; não é a mesma coisa caminhar com Ele ou caminhar tateando; não é a mesma coisa poder escutá-lo ou ignorar a sua Palavra; não é a mesma coisa poder contemplá-lo, adorá-lo, descansar nele, ou não o poder fazer. Não é a mesma coisa procurar construir o mundo com o seu Evangelho, em vez de o fazer unicamente com a própria razão. Sabemos bem que a vida com Jesus se torna muito mais plena, e, com Ele, é mais fácil encontrar sentido para cada coisa » EG 266.
Pe. Georgino Rocha