sexta-feira, 8 de janeiro de 2021

Baptizados em Jesus para sermos como Ele

Reflexão de Georgino Rocha 
para o Baptismo do Senhor



A festa do baptismo de Jesus que, hoje, celebramos, vem mostrar-nos Jesus como predileto Filho de Deus Pai sobre o qual desce o Espírito Santo. Narrada por São Marcos é colocada como “festa ponte” entre o Natal e a vida quotidiana de Nazaré, e pretende dar relevo à manifestação de Jesus no nosso dia-a-dia. Vamos contemplar alguns passos dessa narração e deixar-nos interpelar por interrogações que ela suscita. 
Sozinho, deixa Nazaré e dirige-se ao rio Jordão onde João está a baptizar. Encontra uma multidão vinda de várias partes por querer responder ao apelo de conversão e mudar o estilo de vida que a pregação de João suscitava. Também lá estavam fariseus  e saduceus,  mas por fingimento hipócrita, a ver o que acontecia. A estes, João lança invetivas tremendas: raça de víboras, sois como árvores a abater. Mc 1, 7-11. 
Chega também Jesus vindo de Nazaré da Galileia. O narrador não apresenta mais dados sobre a sua procedência. É ele e só ele. Interessa-lhe não tanto o passado, mas o presente que se abre ao futuro: mostrar que Jesus é o Filho de Deus que vem salvar-nos. E de facto, o seu evangelho vai dando sinais claros desta verdade e, quase a terminar, apresenta a profissão de fé explícita do oficial do exército romano: “Verdadeiramente, este homem era mesmo o Filho de Deus”. 
Mas de Nazaré, pode sair coisa boa? – pergunta de Natanael deixando perceber a baixa “cotação” social da terra de residência de Jesus ou o forte pendor político reivindicativo dos seus habitantes. Seja como for, Jesus traz consigo a experiência sofrida do povo “periférico” e as esperanças de transformação social e religiosa. Traz consigo algo muito superior que vai revelar-se após o batismo e culminar no Calvário e na Páscoa da ressurreição. É urgente mudar! 
No olhar que lança sobre o ano 2020, o caderno «Cristianismo e Justiça» publicação dos Jesuítas, de Barcelona, afirma a certa altura: “Deve ficar claro que sem interrupção da velha normalidade não pode haver nova normalidade com sabor a fraternidade e a promessa cumprida, e que acelerar a sua chegada nos compete aos seres humanos, singularmente aos que compartem o sonho de Jesus de Nazaré. De nós depende, em definitivo, que o caminho da pós-pandemia seja um caminho de fraternidade” 
Chegado ao Jordão, põe-se na fila dos pecadores e aguarda a sua vez. Realizado o rito baptismal, ocorre a grande revelação: Jesus vê os céus abertos e o Espírito descer sobre ele, enquanto surge a declaração solene: “Tu és o Meu Filho amado; em Ti encontro o Meu agrado”. A realidade profunda e o sentido da experiência vivida no dia-a-dia de Nazaré tornam-se agora manifestos: uma situação nova está em curso por intervenção de Deus Pai e Jesus, assistido pelo Espírito Santo, é o protagonista do seu anúncio e da sua realização. Marcos condensa em breves linhas o núcleo de todo o seu Evangelho. 
Jesus, o amado de Deus, é assim “empossado” na missão que lhe é confiada e na qual o Pai se compraz. O baptismo constitui “o acto” oficial do seu início e o Espírito a força impulsionadora da sua realização. Agora, as “periferias” têm voz, os excluídos são integrados, os injustiçados recuperam a dignidade. A fraternidade reduzida aos laços de sangue alarga-se a toda a humanidade, a posse e o uso dos bens – como dons recebidos e confiados ao homem/mulher para que os cuidem e trabalhem – são pertença de todos, sendo necessário que cheguem à casa de cada um na medida adequada. 
Os nossos Bispos publicaram com data de um de Janeiro de 2021 um documento sobre «desafios pastorais da pandemia à Igreja em Portugal» e convidam-nos a ver a realidade com novos olhos. “O fecho das igrejas às celebrações comunitárias nos inícios da pandemia deverá ter-nos aberto os olhos para descortinar um outro modo de ser Igreja, feito não só de liturgia e de oração, mas de vida quotidiana, até que toda a vida se torne oração e a oração vida“ (nº15). 
E prosseguem: “É bom haver catequese na paróquia, mas o seu fecho forçado disse-nos que talvez a primeira catequese seja a que é feita em casa, pelos pais, avós, tios, irmãos. Temos a oração da Eucaristia, mas há também a oração da manhã, da noite, antes das refeições e o terço, entre outras. É um desafio redescobrir a oração doméstica, promover uma autêntica espiritualidade familiar e levar a sério a liturgia da Palavra no lar. São João Crisóstomo, dirigindo-se aos pais de família, dizia: «Voltem a casa e preparem duas mesas, uma com os pratos para a comida, a outra com os pratos da Escritura (…), façam da vossa casa uma igreja» (nº 16). É a Igreja doméstica. 
Baptizados em Cristo, formamos o povo de Deus. Cantemos, vivamos, valorizemos a beleza nobre e exigente do nosso baptismo.

Pe. Georgino Rocha

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