Um dia destes, quando menos esperava, dei um longo e saudoso salto até ao Gerês, onde passei férias e cuidei do corpo e do espírito. Do corpo, porque as suas águas medicinais limpam o fígado de excessos, e do espírito, porque as paisagens e ambiências nos libertam do stresse dos afazeres quotidianos e das preocupações profissionais e outras. Tenho a bailar na minha memória, a toma da água por conta peso e medida, as refeições controladas (vitela ao meio-dia e pescada de Vigo à noite) e sem bebidas alcoólicas, apenas água cristalina. Mas também ainda vejo aquistas com rostos pálidos a indiciarem doenças hepáticas e outras que ali estagiaram para refazer energias para a vida dura dos seus quotidianos.
Fui levado pela amizade de um amigo que por lá andou estas férias para descansar, dando-me conta de encontros que despertaram evocações de amizades que há décadas cultivámos, eu e a Lita. “Indicar a cidade das minhas origens — diz o meu amigo — bastou para que a D. Perpétua lembrasse relações para consigo e restante família”. Como o mundo é pequeno e como as sadias amizades perduram no tempo, alimentando marcas indeléveis na alma das pessoas...
Realmente, seguindo os passos e hábitos da tia Lurdes, uma das “mães” da Lita, que recorria às águas do Gerês para escapar às cólicas hepáticas, de que padecia, também quisemos experimentar o milagre das águas medicinais, apoiadas devidamente por dietas adequadas servidas nos hotéis, pensões e casas particulares de Terras do Bouro. Alimentação cuidada, descanso tranquilizador, ares puros, paisagens deslumbrantes, regatos cantantes e purificadores marcaram-nos profundamente.
José Eiras, que faleceu, precocemente, em 1 de agosto, há 15 anos, e esposa Perpétua, quase da nossa idade, entraram nas nossas vidas e amizades, e sempre que lá íamos, mesmo de passagem, reforçávamos a proximidade, mas o tempo, a distância e a vida ditam leis ditatoriais a que nem sempre conseguimos fugir.
O meu amigo, que este ano esteve no Gerês, abriu janelas para evocarmos, com que saudades!, a “grandeza daquelas serranias, onde os ares são mais puros e as pessoas mais genuínas, à medida dos espaços onde habitam”.
“Falámos do País, das lidas e das nossas famílias. E foi no momento de lhe falar [à Perpétua] das minhas origens é que ela logo associou dois nomes de pessoas muito estimadas, porque o que lhe deixaram para sempre é impossível de apagar. O problema são as deslocações, como reconhece, porque a distância faz-se obstáculo gigante, quando pensamos revisitar pessoas e a saúde não permite”— sublinhou o Hélder no relato que nos enviou e nos comoveu.
As fotos que o Hélder me cedeu transportam-me até à janela da casa do José Eiras e da Perpétua ou de um outro qualquer ângulo do lugar das termas. E com elas sentimos a beleza das paisagens, o cantar dos regatos, a verdura do arvoredo e o silêncio tranquilizador da serra do Gerês.
Fernando Martins