Jesus declara felizes os discípulos que prestam atenção ao que ele diz e faz. Mateus narra a parábola da semente, do campo e do semeador em que, de forma sapiencial, apresenta as disposições de quem ouve a Palavra de Deus e as atitudes consequentes que toma. Faz uma espécie de retrato exemplar que serve de referência para todos os tempos. Especialmente para o nosso em que tantos “sons e tons” se repercutem nos ouvidos e invadem o coração. Realmente Deus corre um grande risco ao confiar a sorte da sua Palavra à liberdade humana, pronta para um generoso sim, mas capaz de dizer não: um não rotundo ou condicionado e mesmo adiado. Daí, a nossa responsabilidade pessoal e, tendo funções educativas, sociais e comunitárias.
Jesus está em missão na zona do Mar de Tiberríades. O seu estilo de vida e a sua linguagem tinham tal novidade que as multidões acorriam a ouvi-lo. Chegavam a “apertá-lo” tanto que teve de recorrer a novos espaços e a servir-se de meios diferentes, É o caso da barca que se distancia da margem como refere a leitura da liturgia de hoje (Mt 13, 1- 23). Olhando as pessoas de frente, senta-se e começa o seu ensinamento sobre o “sonho de Deus”, a novidade do Reino, o sentido do que está a acontecer e que diz respeito a todos e a cada um. E como bom comunicador, conta a parábola da semente e do que ela envolve. Usa uma linguagem acessível, assertiva, interpelante, respeitosa, passível de ser interpretada de vários modos, apesar da sua clareza. A narração deixa ver “em pano de fundo” o agir do próprio Jesus e da reacção dos seus ouvintes nas diversas atitudes bem espelhadas nas diferentes qualidades da terra onde cai a semente: O caminho árido e sem húmus, os sítios pedregosos sem recursos ou com espinhos sufocantes, a terra boa e produtiva. Retoma a tradição profética da metáfora de Isaías, hoje proclamada, em que a palavra é como a chuva e a neve que descem do céu e realizam a sua missão, fecundando a terra.
Jesus, ao ver a preocupação dos discípulos em captarem todo o alcance da parábola, exclama: “Felizes os vossos olhos porque vêem e os vossos ouvidos porque ouvem!” E dá-lhes uma explicação exemplar. Centra a atenção em quem acolhe a semente, a Palavra. Realça a importância de cultivar as disposições adequadas, deixando o elenco de outras menos indicadas. O caminho é metáfora do coração árido, indiferente ao que acontece, satisfeito com o seu mundo de acomodação aburguesada. Os sítios pedregosos não têm profundidade suficiente para garantir o vigor das raízes da semente; por isso espelham as pessoas inconstantes e exibicionistas, que reagem com entusiasmo e alegria, mas desistem “sem pena nem glória” à primeira contrariedade. Os espinhos do silvado deixam germinar e crescer a semente, mas acabam por a sufocar e secar, tais as feridas da vida, os cuidados do imediato, as seduções da riqueza, do consumo e do prestígio. E ficam “congeladas” as calorosas aspirações do coração humano em que “encaixa” bem o “sonho de Deus”. A terra boa é o símbolo de quem está disponível para acolher e pronto para corresponder à Palavra escutada. Como Maria de Nazaré, a mãe de Jesus, a mulher do diálogo esclarecedor que liberta de receios e abre espaço à cooperação responsável. Como nós, certamente.
O vigor da semente, a palavra, está condicionado pelo exercício da liberdade humana. “Estamos chamados a ser «terra boa». É urgente. O «sonho de Deus» pode diluir-se… É o preço que Deus paga pela liberdade humana… Escutar a Palavra do Reino e entendê-la é escutar a chamada interior que nos pergunta pela nossa responsabilidade no mundo que estamos a construir e sobre o nosso modo de nos realizarmos como pessoas”, afirma Gutierrez de la Serna, na revista “Homilética”. E, no desejo de ajudar o leitor a sintonizar cada vez mais com o ritmo indicado, deixa-nos pistas indicativas muito úteis. Mencionam-se algumas: “Cultivo-me como pessoa humana em toda a riqueza e dignidade? Preocupa-me o “sonho de Deus” para este mundo ou só penso em mim? Pensando no futuro dos nossos filhos (e netos)…, preocupa-me a educação em valores e para os valores? Preocupa-me o futuro do nosso planeta e da possibilidade futura da vida? Escuto a palavra de Deus, procuro entendê-la e pô-la em prática? Sou realmente “terra boa”?
A novidade de Jesus passa pela nossa felicidade, pela nossa liberdade, pela cooperação solidária, pela coerência de atitudes. Que alegria e responsabilidade!